O Tribunal da Relação de Lisboa publicou, em 25-01-24, acórdão relativo ao despacho de não pronúncia, proferido pelo JIC Ivo Rosa, no âmbito dos autos conhecidos por Processo Marquês. É uma peça jurídica longa - e não podia deixar de o ser, tantas as questões suscitadas pelo recorrente MP -, bem estruturada e exaustiva. Analisa os argumentos expendidos pelo MP, os fundamentos que sustentaram a decisão do JIC e assume a decisão final, suportando-se em jurisprudência e doutrina que cita a propósito de cada item. Dá razão ao recorrente na maioria muito significativa das conclusões do recurso e mantém em alguns pontos o despacho recorrido. Em conclusão, revoga a decisão de não pronúncia e profere outra em que pronuncia todos os arguidos, à excepção de três deles, imputando-lhes os crimes de fraude fiscal qualificada, corrupção passiva e activa, branqueamento de capital.

Revogou a decisão na parte em que esta declarava nulidades de actos jurisdicionais praticados durante o inquérito, bem como nulidades de actos praticados pelo MP, julgou improcedente a invocação de proibição de prova obtida na sequência da quebra de sigilo fiscal. Fundamentalmente, declarou não estar prescrito o procedimento criminal pelos crimes de corrupção constantes da acusação. O acórdão em análise pronunciou os arguidos pelos factos constantes da acusação, para a qual remeteu, dando o seu teor como integralmente reproduzido. Declarou prescritos alguns crimes de fraude fiscal e os de falsificação de documento. O art.º 309.º, n.º 1, do CPP, diz ser nula a decisão instrutória na parte em que pronuncia o arguido por factos que não constem da acusação e os que arrastam uma alteração substancial dos factos. O art.º 310.º, n.º 1, determina a “não recorribilidade da decisão instrutória que pronunciar arguidos nos exactos termos da acusação, mesmo na parte em que apreciar nulidades e outras questões prévias ou incidentais” e, neste caso, determina a remessa imediata dos autos ao tribunal competente para o julgamento, logo que transitada a pronúncia. Já esta semana, a defesa de José Sócrates anunciou a intenção de interpor recurso por, além de outras nulidades invocadas, duas das três juízas que subscreveram aquela decisão carecerem de legitimidade e de jurisdição, porquanto não são magistradas em funções no Tribunal da Relação de Lisboa, mas sim de outras relações para as quais requereram transferência. Esta alegação carece de ser confirmada ou infirmada pelos órgãos superiores de magistratura judicial, desconhecendo-se, para já, a fiabilidade daquela informação, pelo que sobre o assunto é intempestiva uma opinião sustentada.

*A autora escreve segundo a antiga ortografia

QOSHE - Processo Marquês, o acórdão de pronúncia - Cândida Almeida
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Processo Marquês, o acórdão de pronúncia

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04.02.2024

O Tribunal da Relação de Lisboa publicou, em 25-01-24, acórdão relativo ao despacho de não pronúncia, proferido pelo JIC Ivo Rosa, no âmbito dos autos conhecidos por Processo Marquês. É uma peça jurídica longa - e não podia deixar de o ser, tantas as questões suscitadas pelo recorrente MP -, bem estruturada e exaustiva. Analisa os argumentos expendidos pelo MP, os fundamentos que sustentaram a decisão do JIC e assume a decisão final, suportando-se em jurisprudência e doutrina que cita a propósito de cada item. Dá razão ao recorrente na maioria muito significativa das conclusões do recurso e mantém em alguns pontos o despacho recorrido. Em conclusão, revoga a decisão de........

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