Nesta época festiva, a mesma azáfama, a mesma euforia de todos os anos. As ruas enfeitadas deixam ouvir belas composições natalícias, as pessoas apinham-se nos passeios, nas lojas, nos grandes espaços comerciais e, com um brilhinho nos olhos, compram comida e bebidas em excesso, oferendas para familiares e amigos, como se não houvesse um amanhã. Trocam-se mensagens de paz e amor, os nossos olhos reflectem o afecto daqueles que connosco partilham a noite da família. Por um momento mágico tudo parece estar bem neste cantinho do Mundo. Por uns segundos, deixamos o pensamento voar e esvair-se no esquecimento... Temos vontade de ficar assim, a voar livres, sem mágoas na alma e, por uns instantes, somos felizes. De repente, o momento de fantasia desvanece-se e pensamos nos outros, nas crianças que algures na Terra choram de fome, de sede, de dor pela ausência dos pais, mortos, como danos colaterais, numa guerra inumana. Todos os dias a OMS alerta um Mundo indiferente e ausente para o caos e tragédia humana que se vive em Gaza. Que homens são estes que, invocando o direito de defesa e da proporcionalidade, matam milhares de crianças, destroem hospitais, escolas e edifícios repletos de gente inocente que foge da destruição e apenas almejam viver? Oh, deuses, a maior parte são crianças que não sabem sorrir porque a morte vive ao lado delas. Não têm Natal, não têm um carinho, têm desgraça, tragédia e sangue. Aonde fica o limite do direito de defesa e o tal exercício da proporcionalidade entre a captura e morte de alguns terroristas e o assassínio bárbaro de milhares de crianças que já não têm sequer forças para chorar? A Declaração Universal dos Direitos Humanos, a Convenção Internacional dos Direitos da Criança e outros diplomas de igual significado emergiram e ficaram gravados nos areópagos internacionais que simbolizam a Justiça e a Democracia. Reafirmados sistematicamente os direitos da criança em múltiplos fóruns, a realidade contraria aquelas intenções, continua a haver milhões de crianças sem infância, a viver sem dignidade, sem bênçãos! Dirão que são normas programáticas... Não, já passaram os anos suficientes para adquirirem o estatuto de norma impositiva. A abstracção do deverá tem de convolar-se imediatamente em lei de carácter obrigatório. Todos os países democráticos têm de, cada um por si, inscrever com carácter de urgência nas suas agendas políticas o fim da tortura e da dor impostas às crianças que sofrem todos os dias os horrores do vazio e da ausência da felicidade mínima a elas devidas. Lê-se no preâmbulo da Declaração Universal que o reconhecimento da dignidade humana inerente a todos os membros da família humana e dos seus direitos iguais e inalienáveis constituem o fundamento da liberdade, da justiça e da paz no Mundo... É urgente e inadiável construir um Natal para todas as crianças do Planeta.

*A autora escreve segundo a antiga ortografia

QOSHE - O Natal e os direitos da criança - Cândida Almeida
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O Natal e os direitos da criança

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24.12.2023

Nesta época festiva, a mesma azáfama, a mesma euforia de todos os anos. As ruas enfeitadas deixam ouvir belas composições natalícias, as pessoas apinham-se nos passeios, nas lojas, nos grandes espaços comerciais e, com um brilhinho nos olhos, compram comida e bebidas em excesso, oferendas para familiares e amigos, como se não houvesse um amanhã. Trocam-se mensagens de paz e amor, os nossos olhos reflectem o afecto daqueles que connosco partilham a noite da família. Por um momento mágico tudo parece estar bem neste cantinho do Mundo. Por uns segundos, deixamos o pensamento voar e esvair-se no esquecimento... Temos vontade de ficar assim, a voar livres, sem mágoas na alma e, por uns instantes, somos felizes. De repente, o momento........

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