Ainda a propósito do processo designado de Influencer, no qual se investigam factos eventualmente criminosos praticados no âmbito da exploração de lítio, hidrogénio verde e de um centro de dados, foi tornada pública a decisão do JIC de não aplicar medida de detenção a nenhum dos cinco arguidos detidos. Na sequência, foram prestadas declarações públicas e dadas notícias confusas e até contraditórias entre si. Dado o grande impacto mediático e social do assunto, importa esclarecer: o processo penal tem duas fases obrigatórias, a investigação e o julgamento, e uma facultativa, a instrução, se o arguido ou o assistente a requererem.

No caso concreto, aliás como ocorre em todos os processos, o inquérito é titulado exclusivamente pelo MP. Se durante o decorrer deste se mostrar necessária a realização de diligências extremamente invasivas dos direitos fundamentais dos cidadãos, aquele magistrado, em despacho fundamentado, promove ao JIC o seu deferimento. Entre elas, estão, nomeadamente as escutas telefónicas, buscas domiciliárias e apreensões, recolha de imagens e som e o interrogatório dos arguidos detidos para aplicação de uma medida de coacção. Assim ocorreu no processo em questão. O MP entendeu ter recolhido indícios da prática de ilícitos pelos cinco arguidos detidos.

Em requerimento articulado, descreveu os factos ilícitos que imputava àqueles, nomeadamente os crimes de corrupção, peculato e tráfico de influência, entre outros. Não entendeu assim o JIC, que considerou indiciado apenas o crime de tráfico de influência, e, por isso, sendo menos grave a moldura penal deste ilícito face à dos restantes invocados pelo MP e atentas as declarações dos arguidos, estabeleceu várias medidas de coacção, que não a prisão preventiva. O MP irá recorrer desta decisão, sem prejuízo da continuação e desenvolvimento da investigação, que não sofrerá qualquer obstáculo na busca da verdade material; pode continuar a desenvolver a linha de investigação previamente estabelecida, alargá-la ou redireccioná-la; pode reinterrogar os arguidos, levar a cabo novas diligências que entenda necessárias à prossecução da acusação, sem prejuízo de, antes de a deduzir, confrontar de novo os arguidos com toda a factualidade e imputação criminal apuradas.

Esta tentativa de esclarecimento serve para que a comunidade entenda que a fase de investigação é um processo dinâmico, os factos apurados e a apurar podem ser mais alargados ou mais restritos do que a indiciação originária. Sempre em busca da verdade material que os magistrados são obrigados a prosseguir, sejam eles a favor ou contra os arguidos. Sopesados todos os elementos probatórios indiciários, suficientemente fortes para sustentar uma acusação, o MP deduzi-la-á. De contrário arquivará o processo. A decisão do JIC relativa à aplicação de medida de coacção não condiciona nem delimita o poder-dever investigatório do MP. É esta a ideia que nesta fase importa reter.

(A autora escreve segundo a antiga ortografia)

QOSHE - A investigação - Cândida Almeida
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A investigação

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19.11.2023

Ainda a propósito do processo designado de Influencer, no qual se investigam factos eventualmente criminosos praticados no âmbito da exploração de lítio, hidrogénio verde e de um centro de dados, foi tornada pública a decisão do JIC de não aplicar medida de detenção a nenhum dos cinco arguidos detidos. Na sequência, foram prestadas declarações públicas e dadas notícias confusas e até contraditórias entre si. Dado o grande impacto mediático e social do assunto, importa esclarecer: o processo penal tem duas fases obrigatórias, a investigação e o julgamento, e uma facultativa, a instrução, se o arguido ou o assistente a requererem.

No caso concreto, aliás como ocorre em todos os processos, o inquérito é titulado exclusivamente pelo MP. Se........

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