E chegou Pedro Passos Coelho, o que viria substituir Montenegro na liderança do PSD se o partido perdesse as europeias. A operação Influencer deu a volta ao texto, mas a entrada de Passos na campanha foi um bálsamo para todos os partidos. Confuso? Não.

O PSD pode sonhar que, com o discurso muito mais à direita do que Montenegro, a tocar o Chega sobre a política de imigração e igualdade de género, o eleitorado algarvio se convença a eleger mais um deputado do PSD em vez de mais um do Chega.

O discurso anti-imigração não é uma novidade que Ventura introduziu na direita portuguesa: Paulo Portas usou e abusou dele no seu mandato no CDS, Passos Coelho em 2017 já tinha condenado a nova lei da imigração por “deixar entrar toda a gente” e “pôr em risco a segurança dos portugueses”. Nada de novo. Na altura, também o PS o acusou de ser “xenófobo”. Passos não mudou, as pessoas é que se esqueceram.

As políticas de “igualdade de género” contra as quais Passos se insurgiu veladamente – “tem que haver liberdade para pensar nas escolas, os cidadãos têm que pensar com as suas próprias cabeças” - chamavam-se, no passado, descriminalização do aborto, casamento entre homossexuais, etc. A direita sempre foi contra (embora Passos Coelho fosse a favor da despenalização do aborto).

O que Passos Coelho foi explicar a Montenegro é que o discurso a que a esquerda chama “reaccionário” é do agrado de uma grande parte da direita e talvez possa diminuir a força do Chega. Mesmo que Montenegro não tenha gostado, e se preocupe com razão no impacto da entrada de Passos no voto dos pensionistas, alguns votos à direita Passos vai render-lhe.

A esquerda adorou a entrada de Passos na campanha porque acredita que a memória do governo da troika está viva e a imagem de Passos retira mais votos ao PSD e à direita do que dá. Ao recordar “o apoio que sempre sentiu” de Luís Montenegro quando era primeiro-ministro, Passos Coelho fez mais pela união do líder do PSD ao governo da troika do que muitos discursos de Pedro Nuno Santos, Mariana Mortágua, Paulo Raimundo ou Rui Tavares. Todos eles acabaram, mais directa ou indirectamente, por se congratular com o regresso da memória do governo que cortou salários e pensões.

Ventura, que Passos Coelho sempre apoiou, também gostou de ouvir Passos porque percebeu perfeitamente o sinal do antigo líder do PSD: “O Luís não deixará de procurar fazer um governo que tenha força”. Traduzido por miúdos, se houver maioria de direita com Chega, o Chega fará parte da solução. O “não é não” de Montenegro terá que passar a “nim” e depois a um inevitável “sim” do PSD, caso não haja maioria da AD e Iniciativa Liberal. O sinal para deixar cair a “linha vermelha” está dado. E também isto não é uma novidade: Passos Coelho sempre considerou o Chega “um partido igual aos outros”, o cabeça-de-lista pelo Algarve Miguel Pinto Luz sempre defendeu alianças com Ventura.

Era difícil um jackpot assim, dividido por todos. Passos conseguiu.

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Furacão Passos: um jackpot à esquerda e à direita

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27.02.2024

E chegou Pedro Passos Coelho, o que viria substituir Montenegro na liderança do PSD se o partido perdesse as europeias. A operação Influencer deu a volta ao texto, mas a entrada de Passos na campanha foi um bálsamo para todos os partidos. Confuso? Não.

O PSD pode sonhar que, com o discurso muito mais à direita do que Montenegro, a tocar o Chega sobre a política de imigração e igualdade de género, o eleitorado algarvio se convença a eleger mais um deputado do PSD em vez de mais um do Chega.

O discurso anti-imigração não é uma novidade que Ventura introduziu na direita portuguesa: Paulo Portas usou e abusou dele no seu mandato no CDS, Passos Coelho em 2017 já tinha condenado a nova lei da imigração por “deixar entrar toda a........

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