Segundo dados deste mês do Banco de Portugal, nos últimos 9 anos o endividamento das pessoas quadruplicou, principalmente para assegurar despesas com saúde e educação. O endividamento para acesso à saúde chegou 8,4 mil milhões, o que representa quase 4% do PIB nacional. É tema de debate político? Não, as televisões e os jornais que parecem órgãos de propaganda do PS e do PSD entretêm-nos com a ficção “da direita extremista e populista” e jogos florais do diz que disse.

Por que não se fala do país real?

Mudamos significativamente em cinco décadas, como mudaram todos os países na Europa e no Mundo, mas continuamos com indicadores vergonhosos para um país da Europa Ocidental. As principais mudanças em território nacional devem-se principalmente a factores exteriores como a entrada na União Económica Europeia em 1986, a necessidade de obedecer a determinados parâmetros nas mais variadas áreas e aos fundos atribuídos para o desenvolvimento do país.

Portugal é em toda a U.E. o país que mais depende dos fundos comunitários. O país já recebeu mais de 150 mil milhões de euros em fundos europeus, mas, exceptuando Lisboa, nenhuma região do país conseguiu superar a média europeia. Por exemplo, entre 1986 e 2011 recebemos em média 9 milhões de euros por dia. Somemos ainda as verbas posteriores e as da célebre “Bazuca”. Muito do nosso crescimento económico é dinheiro que nos dão e emprestam. Um verdadeiro balanço sobre a aplicação dessas verbas está por fazer. Uma coisa é certa, apesar do novo Brasil que são esses fundos, a quase maioria dos políticos portugueses e o tipo de mentalidade vigente tem contribuído para resistirmos a verdadeiras mudanças de fundo.

O país tem falhado perante o que podia ser, e esse fracasso tem os seus rostos principais no PS e no PSD e na cumplicidade de todos nós. Não nos devia interessar o país da propaganda com a qual colaboram os comentadores que parecem megafones do poder político vigente, mas o país real. Portugal é um dos países mais pobres da Europa Ocidental e de todo o continente europeu e não consegue alterar esta condição. Atrás de nós e antes do final da década, só ficarão a Bulgária (até ver), a Albânia, Moldávia, Kosovo e o Montenegro. O actual PIB nacional por cabeça está abaixo do nível obtido no ano 2000, que era de 85% da média europeia.

Não há futuro para os mais velhos que morrem, pobres e abandonados, nem para os novos. A elevada taxa de mortalidade que bate recordes a cada inverno tem como uma das principais causas, o facto de os portugueses idosos, doentes e pobres, não terem dinheiro para se aquecerem e pela destruição do SNS.

Imigram mais portugueses hoje que nos anos 60 e trata-se até de um tipo de imigração bem diferente. No auge da emigração dos anos 60, em 1966, partiram 120.239 pessoas. Em 2012, emigraram 121.418 pessoas, em 2013, 128.108 e em 2014, 134.624, 2015, 101. 203, 2020, 68.209, em 2022, 71.717. Em 10 anos imigrou mais de um milhão de portugueses. A estes números acresce que 25% dos jovens que residem no país sonham partir. E diz-nos o Observatório da Imigração que quase um terço das mulheres em idade fértil está fora do país e 20% dos filhos de mãe portuguesa já nascem no estrangeiro.

Quem nos conduziu nas últimas décadas a esta condição, ou pelo menos a tem ajudado a manter, persiste em perpetuar-se no poder e impõe às pessoas a ideia que só podem escolher os de sempre, pois o contrário será antidemocrático. Não haverá alternativa. Somos livres de escolher uma única opção, a que nos tem governado sempre.

Portugal foi sucessivamente ultrapassado na produtividade e no PIB por cabeça por quase todos os países da Europa de Leste que ainda recentemente estavam em condições miseráveis após o jugo do comunismo, os últimos dos quais foram a Estónia, a Roménia e a Letónia. Mas obtivemos recentemente um primeiro lugar. O relatório anual da Procuradoria Europeia mostra-nos que Portugal está à frente de todos os 22 países relativamente a fraudes com dinheiro europeu. Para esse gabinete de investigação de crime fiscal e económico, Portugal soma quase 25% de todo o dinheiro desviado na U.E.. A riqueza dos portugueses em paraísos fiscais vale 22% do PIB… algo que só é possível num caldo de amoralidade e impunidade.

Os serviços públicos como a educação e a saúde, por sua vez, estão arruinados, somos dos piores em literacia financeira, há Estado a mais, carga fiscal excessiva para as capacidades das empresas e os vencimentos das pessoas.

Em 2023, quem recebesse 2000 euros brutos por mês fazia parte dos 10% mais ricos da nação. Eis o que é a riqueza para um país da U.E. no século XXI. Um bom salário em Portugal equivale ao ordenado mínimo de muitos países europeus, mas o preço de bens e serviços é idêntico ao desses países.

Em 2022 quase 42% dos portugueses viviam no limiar da pobreza, esse número diminuía para 22% com as transferências sociais. Os governos dos mesmos de sempre, para os quais o Estado se confunde com o partido, limitam-se a subsidiar a pobreza, não criando verdadeiras condições para que as pessoas dela saiam. Desse modo mantêm-se um eleitorado fiel, dependente, mas cristalizado na eterna desgraça e esmola. A comunicação social, os intelectuais possíveis, os artistas, acomodaram-se nessa dependência das boas graças do poder político para sobreviverem.

A pouca autonomia das pessoas significa que são eleitores seguros do PS, mas também do PSD. Portugal não é um país de verdadeiras oportunidades, que recompensa o esforço, o trabalho e a capacidade. Um cartão partidário, uns favores e umas cunhas sãos os grandes factores de mobilidade social.

Há uma atmosfera de podridão e mediocridade crescente e não se trata apenas de uma mera percepção subjectiva. A degradação da qualidade dos políticos, os casos de corrupção, as suspeitas, o afastamento dos políticos relativamente aos cidadãos atinge patamares inéditos.

QOSHE - Portugal, a realidade e a propaganda - João Maurício Brás
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Portugal, a realidade e a propaganda

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21.02.2024

Segundo dados deste mês do Banco de Portugal, nos últimos 9 anos o endividamento das pessoas quadruplicou, principalmente para assegurar despesas com saúde e educação. O endividamento para acesso à saúde chegou 8,4 mil milhões, o que representa quase 4% do PIB nacional. É tema de debate político? Não, as televisões e os jornais que parecem órgãos de propaganda do PS e do PSD entretêm-nos com a ficção “da direita extremista e populista” e jogos florais do diz que disse.

Por que não se fala do país real?

Mudamos significativamente em cinco décadas, como mudaram todos os países na Europa e no Mundo, mas continuamos com indicadores vergonhosos para um país da Europa Ocidental. As principais mudanças em território nacional devem-se principalmente a factores exteriores como a entrada na União Económica Europeia em 1986, a necessidade de obedecer a determinados parâmetros nas mais variadas áreas e aos fundos atribuídos para o desenvolvimento do país.

Portugal é em toda a U.E. o país que mais depende dos fundos comunitários. O país já recebeu mais de 150 mil milhões de euros em fundos europeus, mas, exceptuando Lisboa, nenhuma região do país conseguiu superar a média europeia. Por exemplo, entre 1986 e 2011 recebemos em média 9 milhões de euros por dia. Somemos ainda as verbas posteriores e as da célebre “Bazuca”. Muito do nosso crescimento económico é dinheiro que nos dão e emprestam. Um verdadeiro balanço sobre a aplicação dessas verbas está........

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