É admirável. A política alimenta-se sobretudo de perceções, de sentimentos, de alegorias e, sobretudo, dos factos emocionais que estão adormecidos na consciência das pessoas, mas que explodem à mínima turbulência. Serve isto, em parte, para explicar a recente ascensão meteórica de Gabriel Attal. Bastou o percepto pela sociedade francesa da proibição do uso de abaya nas escolas para que o novo primeiro-ministro começasse a sua caminhada para o Hôtel Matignon.

Serve esta frágil e rudimentar análise para constatarmos que a política se alimenta, frequentemente, das emoções mais carnais que acabam por relegar para segundo lugar aquilo que é verdadeiramente estrutural e transformador para a sociedade. Attal sabia que a curto prazo não resolveria nenhum dos problemas do sistema educacional francês, porém estava consciente de que a proibição de tal indumentária, além de desviar as atenções da sua impotência, podia atrair os moderados que, entretanto, tinham migrado para a extrema-direita bem como satisfazer os saudosistas da nação pura.

Em Portugal o PSD tem seguido a mesma estratégia. Insiste numa narrativa suportada pelos casos e casinhos, e nos últimos acontecimentos, para convencer os portugueses de que os governos do PS apenas trouxeram o caos ao país. Mas sem sucesso evidente, parece-me. Apesar das adversidades, o PS continua unido e forte e nas sondagens Pedro Nuno Santos tem a maior vantagem para se tornar o próximo primeiro-ministro. Esta surpresa só é possível porque o PS fez até ao presente uma boa governação que se refletiu na vida das pessoas. Ao obter o primeiro superavit da história da democracia portuguesa, o PS conseguiu destruir o mito de que nenhum Governo de Esquerda seria capaz de ter contas certas.

António Costa empenhou-se muito na economia e no crescimento industrial. Preferiu sempre investir mais na criação de emprego e na criação de riqueza do que apostar na ação social. Bateram-se recordes na captação de investimento estrangeiro, nas exportações e na criação de postos de trabalho. Caminhou ao lado dos empresários sem esquecer a sua base de apoio social com o aumento de 315€ do salário mínimo. Sempre conciliou, e bem, a expansão económica com a justiça social, transformando o PS num partido prático e com reconhecimento internacional.

Em sete anos de Governo do PS, com exceção do ano de 2020, o país cresceu sempre acima da média da UE, num contexto internacional adverso dominado pela pandemia, pela guerra e pela inflação. Percebemos, assim, melhor porque é que a boa realidade escondida, nesta conjuntura, se sobrepõe às perceções de caos que o PSD procura passar. Mas convenhamos, Montenegro também não tem muito espaço para fazer diferente: o PS comeu a parte boa do programa do PSD. No fundo, o PSD está desprogramado e quando procura fazer restart o sistema operativo não consegue arrancar.

QOSHE - PSD está desprogramado - Vítor Paulo Pereira
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PSD está desprogramado

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17.01.2024

É admirável. A política alimenta-se sobretudo de perceções, de sentimentos, de alegorias e, sobretudo, dos factos emocionais que estão adormecidos na consciência das pessoas, mas que explodem à mínima turbulência. Serve isto, em parte, para explicar a recente ascensão meteórica de Gabriel Attal. Bastou o percepto pela sociedade francesa da proibição do uso de abaya nas escolas para que o novo primeiro-ministro começasse a sua caminhada para o Hôtel Matignon.

Serve esta frágil e rudimentar análise para constatarmos que a política se alimenta, frequentemente, das emoções mais carnais que acabam por relegar para segundo lugar aquilo que é verdadeiramente estrutural e transformador para a sociedade. Attal........

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