Quem já foi ao Dragão numa daquelas noites de casa cheia, naquelas épocas e naqueles jogos em que tudo corre de feição aos que equipam de azul e branco (e houve muitas dessas noites ao longo dos últimos anos), só pode ter ficado impressionado. Mesmo que não seja adepto do F. C. Porto, como é o caso. Impressionado pela beleza do estádio, tantas vezes pela qualidade do jogo jogado, quase sempre pela intensidade e entrega daqueles onze jogadores, pela moldura humana, pela paixão dos adeptos, e também pela energia que brota do topo sul, a bancada que é território quase exclusivo dos Super Dragões. Sim, quando tudo corre bem, as claques dão ainda mais emoção a esse grande espetáculo. Quando tudo corre bem e quando nos concentramos na coreografia, sem atenção ao detalhe, é uma festa.

Mas depois, já longe do estádio, num qualquer dia como o de ontem, chegam-nos os pormenores dos bastidores. Com mais uma operação policial contra uma claque de futebol, desta vez os Super Dragões - como noutras vezes o alvo foi a Juve Leo (Sporting) e outras ainda os No Name Boys (Benfica) -, já nada sobra do jogo, da comunhão ou dos cânticos dos adeptos. O que ressalta é o lado negro do futebol, o tribalismo que resvala frequentemente para a violência, e outras vezes para o crime organizado. E é nessa altura que recordamos que as claques se foram convertendo, sobretudo no caso dos chamados três grandes, em centros de tráfico de influências e bilhetes (entre outros tráficos), é nessa altura que recordamos a ligação sombria entre claques e dirigentes, em que as primeiras se transformam na guarda pretoriana dos segundos.

A operação do Ministério Público e da PSP contra os Super Dragões seria sempre um golpe na imagem dos líderes atuais do F. C. Porto. Que no rol de detenções haja funcionários do clube torna as coisas ainda piores. Que a investigação levante suspeitas sobre um dirigente de topo é trágico. Acontece numa altura em que, pela primeira vez em décadas, existe uma credível candidatura alternativa a Pinto da Costa. O antigo treinador dos dragões André Villas-Boas já tinha mostrado ambição e capacidade de mobilização. E vai seguramente usar o descontentamento a seu favor. Durante os próximos meses, mesmo em noite de jogo, a festa no Dragão já não será a mesma.

QOSHE - As duas faces do Dragão - Rafael Barbosa
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As duas faces do Dragão

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01.02.2024

Quem já foi ao Dragão numa daquelas noites de casa cheia, naquelas épocas e naqueles jogos em que tudo corre de feição aos que equipam de azul e branco (e houve muitas dessas noites ao longo dos últimos anos), só pode ter ficado impressionado. Mesmo que não seja adepto do F. C. Porto, como é o caso. Impressionado pela beleza do estádio, tantas vezes pela qualidade do jogo jogado, quase sempre pela intensidade e entrega daqueles onze jogadores, pela moldura humana, pela paixão dos adeptos, e também pela energia que brota do topo sul, a bancada que é território quase........

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