Todos ficamos fascinados quando um jovem talento, como uma cinderela, encontra um grande clube que o contrata. A transferência que tende a envolver milhões de euros deixa todos felizes - o clube que o formou, o clube que o dispensa e os adeptos do clube que o contrataram. Eu e a Jesyca Salgado (U. Santiago Compostela) quisemos confirmar se estas transferências não têm ainda um lado mais invisível - se, no fundo, não são a “mão invisível” que perpetua a existência dos grandes e dos pequenos nas ligas profissionais. O resultado da nossa investigação é desafiante, como podem ler, num artigo publicado na Plos One.

No mundo fascinante das transferências de desportistas profissionais, acontece algo que é um laboratório vivo de muitas dimensões da economia global. Agentes com recursos de grande liquidez (vulgarmente, dinheiro vivo) captam o desempenho profissional dos melhores desportistas a favor dos seus clubes. Os outros clubes, que “venderam” os jogadores, ganham liquidez para os seus objetivos - fabricarem mais jogadores rentáveis, mas também terem jogadores que marquem golos, que consigam vitórias e pontos, ainda que, em valor esperado, sejam menores os golos, as vitórias e os pontos quando comparados com os dos clubes maiores. No fundo, os clubes mais pequenos ganham dinheiro com os clubes maiores para manterem o sistema - em termos dinâmicos, para manterem a dinâmica do sistema oligopolista. E como qualquer princípio da termodinâmica, é importante o diferencial de energia, de eletrões ou de declive para um sistema dinâmico se manter dinâmico.

Isto tem muito a ver connosco. Aceitamos as histórias das cinderelas numa (sobre)valorização dos príncipes encantados. O jovem talentoso sai do clube pequeno, “da terrinha”, ou medíocre/anónimo (dependendo de quem avalia) para um grande, de projeção mundial, competitivo. Com isto ficamos todos felizes, porque gostamos sempre “da terrinha” para alguns objetivos, mas somos dos grandes para os propósitos maiores. No fundo, as transferências de jogadores explicam depois muito do que é a fuga de cérebros, a desertificação dos territórios, a desvalorização do que é e de quem é menos produtivo. E explicam porque as monarquias e os príncipes ainda têm muita saída.

QOSHE - As gatas borralheiras e os oligopólios - Paulo Reis Mourão
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As gatas borralheiras e os oligopólios

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17.04.2024

Todos ficamos fascinados quando um jovem talento, como uma cinderela, encontra um grande clube que o contrata. A transferência que tende a envolver milhões de euros deixa todos felizes - o clube que o formou, o clube que o dispensa e os adeptos do clube que o contrataram. Eu e a Jesyca Salgado (U. Santiago Compostela) quisemos confirmar se estas transferências não têm ainda um lado mais invisível - se, no fundo, não são a “mão invisível” que perpetua a existência dos grandes e dos pequenos nas ligas profissionais. O resultado da nossa investigação é........

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