São muitos, e alguns de muito difícil superação, os trabalhos que a nova ministra da Saúde tem pela frente. Valha, no entanto, a verdade que, nos países como o nosso, que dispõem de sistemas de saúde estruturados, com uma forte componente dependente da gestão e da decisão públicas, esta será, porventura, uma das pastas mais desafiantes porque a equação que lhe está subjacente é, aparentemente, impossível.

Isto porque o que temos pela frente é uma desproporcionalidade, preocupantemente crescente, entre o que se está a pedir ao sistema - que decorre da combinação da pressão demográfica com a exigência, e bem, de cada vez mais e melhores cuidados - e os recursos que lhe conseguimos alocar, os quais, por sua vez, não vão poder, por muitos mais anos, continuar a crescer às atuais taxas.

E assim, a insustentabilidade não está afastada, o que, a acontecer, configuraria um inaceitável retrocesso civilizacional e mesmo uma desestruturação, de consequências imprevisíveis, do modelo e do equilíbrio social que tem suportado o bem-estar e a paz que conhecemos, há quase cem anos, na Europa.

A resposta, por demais evidente, passa pela articulação inteligente entre gestão e tecnologia: mais e melhor gestão em todo o complexo ecossistema da Saúde, muito particularmente na sua componente associada à prestação de cuidados, suportada na tecnologia state-of-the-art que, vá-se lá entender porquê, chega sempre atrasada e envergonhada a esta área.

Vamos mesmo ter de fazer muito mais e melhor, com o mesmo ou menos e, para isso, muita coisa vai ter de mudar.

A parte boa da história é que é grande o consenso - entre a globalidade dos agentes da Saúde - quanto às grandes mudanças e reformas que será necessário levar a cabo.

A menos boa é que este consenso é sobretudo aparente e dificilmente resiste ao detalhe e, sobretudo, à sua passagem à prática e ao terreno. Os interesses instalados - uns legítimos e outros nem por isso, mas ambos eficazes força de bloqueio - conjugados com a falta de coragem, de determinação e de lucidez de quem tem tido a seu cargo a tarefa de nos governar são sinal de grande preocupação.

E aqui chegados, não tenho qualquer dúvida em depositar todas as minhas esperanças na rutura com a eminência do desastre a ser protagonizada pela coragem e determinação de quem nos vai governar, até porque, se bem-sucedida, a moderação e racionalidade dos interesses surgirão como consequência.

As mudanças de ciclo governativo são uma oportunidades e por isso atrevo-me a instar a nova ministra da Saúde - a quem desejo os maiores sucessos - a que tenha coragem, a que saia da caixa e ouse mudar. Não se preocupe com o politicamente correto, centre-se antes, por favor, no que lhe parece que está certo. Boa parte das soluções estão ao virar da equina e passam pela aplicação do elementar bem senso.

Se não o fez já, vacine-se, por favor, contra a “ideologite” pateta e inoportuna que tanto nos tem prejudicado a todos. Sei que pode parecer populista, mas faça um pacto com os cidadãos, que estarão consigo - e para isso vai ser importante comunicar bem.

QOSHE - Os trabalhos da (nova) ministra da Saúde - Joaquim Cunha
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Os trabalhos da (nova) ministra da Saúde

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02.04.2024

São muitos, e alguns de muito difícil superação, os trabalhos que a nova ministra da Saúde tem pela frente. Valha, no entanto, a verdade que, nos países como o nosso, que dispõem de sistemas de saúde estruturados, com uma forte componente dependente da gestão e da decisão públicas, esta será, porventura, uma das pastas mais desafiantes porque a equação que lhe está subjacente é, aparentemente, impossível.

Isto porque o que temos pela frente é uma desproporcionalidade, preocupantemente crescente, entre o que se está a pedir ao sistema - que decorre da combinação da pressão demográfica com a exigência, e bem, de cada vez mais e melhores cuidados - e os recursos que lhe conseguimos alocar, os quais, por sua vez, não vão poder, por muitos mais anos, continuar a........

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