Esta semana fica marcada por uma nova iniciativa da direita conservadora em defesa da “família”, que juntou líderes e antigos líderes de PSD, CDS e Chega.

Não se ergueram para defender o acesso universal às creches. Não apoiaram a redução do preço dos passes sociais, nem aumentos do salário mínimo. Não se mobilizaram pela extensão das licenças parentais. Também não se preocuparam em garantir que os pais têm flexibilidade nos horários ou mais rendimentos.

Não, nenhuma destas medidas despertou a direita conservadora e a sua preocupação com a família. Afinal, tal implicaria uma reflexão e admissão das falhas da economia de mercado e o papel do Estado em corrigi-las. Só que, para azar das famílias, a direita conservadora prefere não questionar a “mão invisível” do sagrado mercado.

Não defendem, portanto, “as famílias” (plural). Levantam-se, sim, para promover uma excursão ao passado e defender o mais arcaico conceito de “família” (singular). Lutam por uma conceção moral que querem tornar universal, promovendo um modelo uniformizado de família à força.

Vitimizam-se com uma suposta imposição da “ideologia de género”, sem compreender que aceitar a diversidade não significa impor nada a ninguém. Mas o modelo único que defendem, isso sim, retira a liberdade de cada um fazer as escolhas que entende para a sua própria vida, escolher o seu projeto de felicidade.

Foi esta ideologia, esta visão da sociedade, que juntou na mesma sala Pedro Passos Coelho, Nuno Melo e André Ventura, juntamente com outros dirigentes e ex-dirigentes de PSD, CDS e Chega, no lançamento do livro Identidade e Família. É este ultraconservadorismo que querem promover em Portugal.

Querem impedir aulas de Educação Sexual, valorizar as mulheres na sua condição de “donas de casa”, acabar com a legislação que “facilita o divórcio” e que permite a Interrupção Voluntária da Gravidez, e tratar os homossexuais como doentes (ideia afastada pela ciência há mais de 50 anos). Chegam, até, ao ponto de rejeitar que historicamente a sociedade tenha sido dominada pelos homens - o argumento tem o seu quê de cómico: “Essas senhoras, alegadamente tiranizadas, nunca se queixavam ou manifestavam o seu desagrado.”

No fundo, querem o regresso da família tradicional com papéis de género bem cristalizados, não apenas para si, mas como um modelo para todos os outros. Reeditar os filmes a preto-e-branco onde não havia dúvidas, nem diferença, nem liberdade. O homem é o ganha-pão, a mulher uma doméstica parideira.

Pouco lhes importa que essa realidade tenha sido construída e sustentada por gerações consecutivas de mulheres silenciadas, de vidas destruídas pela impossibilidade de serem felizes para não quebrar o conceito de família tradicional. Preferem viver a tradição da submissão feminina do que a sua emancipação.

O Portugal moderno, o Portugal da igualdade, dos direitos das mulheres, o Portugal que construímos em democracia é o verdadeiro inimigo de muitos destes que agora vão pondo a cabeça de fora. Esta direita, que abraça o Chega e Ventura como um dos seus, vai destapando o rosto, e não é bonito o que se vê.

Quero deixar registada a minha admiração por João Sousa que, aos 35 anos, anunciou o fim de uma extraordinária carreira.

Esteve quase oito anos seguidos na tabela dos 100 melhores tenistas do mundo, atingiu o 28.º lugar do ranking, disputou 12 finais de Torneios ATP, ganhou quatro.

João Sousa foi o melhor português de sempre no meu desporto. Vai continuar a ser um campeão.

QOSHE - Defender as famílias não é isso - Pedro Marques
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Defender as famílias não é isso

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11.04.2024

Esta semana fica marcada por uma nova iniciativa da direita conservadora em defesa da “família”, que juntou líderes e antigos líderes de PSD, CDS e Chega.

Não se ergueram para defender o acesso universal às creches. Não apoiaram a redução do preço dos passes sociais, nem aumentos do salário mínimo. Não se mobilizaram pela extensão das licenças parentais. Também não se preocuparam em garantir que os pais têm flexibilidade nos horários ou mais rendimentos.

Não, nenhuma destas medidas despertou a direita conservadora e a sua preocupação com a família. Afinal, tal implicaria uma reflexão e admissão das falhas da economia de mercado e o papel do Estado em corrigi-las. Só que, para azar das famílias, a direita conservadora prefere não questionar a “mão invisível” do sagrado mercado.

Não defendem, portanto, “as famílias” (plural). Levantam-se, sim, para........

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