É inevitável abordar a situação política nacional. De uma maioria absoluta, cuja principal prioridade anunciada foi a estabilidade, no espaço de menos de uma semana o país recebeu a demissão de um Primeiro-Ministro, uma dissolução do Parlamento e a convocação de eleições para março de 2024.

Várias são as teses do "como aqui chegámos e de como daqui vamos sair", contudo não posso deixar de sublinhar alguns aspetos dos acontecimentos que assolaram a nação nos últimos dias. Assim, a primeira referência terá necessariamente de ir para António Costa.

Trata-se do político nacional com maior longevidade em funções. Dessa forma, e entre os cargos que desempenhou, foi o político que mais tempo teve a confiança dos portugueses. Honra lhe seja feita porque sempre afirmou ser um institucionalista, ou seja, defender a instituição acima de si próprio.

Costa nunca deixou de ser ou parecer sério. No primeiro dia em que essa seriedade foi colocada em causa, a sua opção imediata foi agir em conformidade com o que sempre defendeu.

Portugal despede-se de um Primeiro-Ministro que liderou o país em vários momentos difíceis e que o credibilizou junto dos seus parceiros europeus. Fê-lo em muitos momentos, mas especialmente através da sua participação no Conselho da Europa e junto dos restantes países da lusofonia.

Perante este contexto preocupante, a oposição não demorou a fantasiar e a criar narrativas que tentam encontrar histórias tendenciosas e convenientes. Costa demitiu-se por imperativo de consciência e alinhamento total com aquilo que sempre acreditou e apregoou, mesmo que debaixo de um contexto rodeado de grande insipiência.

Tanto o Presidente da República como o Primeiro-Ministro agem em função do que sabem. E se é verdade que a Sr.ª Procuradora Geral da República esteve no Palácio de Belém, não é menos verdadeiro que perante a gravidade da situação a justiça necessite de fundamentar em público a hecatombe que criou.

A questão que urge fazer é a seguinte: perante a queda de um governo, e de um parlamento democraticamente eleito, não merecerá o país mais do que um parágrafo numa nota à comunicação social, e uma adenda dias depois?

Como advogado sou defensor do princípio da separação de poderes; como democrata seguro com firmeza a convicção da presunção da inocência, do ónus da prova e da independência do poder judicial. Deste modo, não se trata de defender o governo mas sim legitimar a atuação do Ministério Público perante os portugueses.

O segredo de justiça é importantíssimo, assim como a imparcialidade enquanto "manto" da soberania e sobriedade, mas quanto mais dúvidas permanecerem, mais haverá a perder em toda a linha. E ainda que a justiça não deva atuar de forma diferente em função dos visados, há uma certeza: um parágrafo não é suficiente para justificar tamanha catástrofe governamental.

QOSHE - O parágrafo mais longo da democracia contemporânea - Manuel Portugal Lage
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O parágrafo mais longo da democracia contemporânea

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13.11.2023

É inevitável abordar a situação política nacional. De uma maioria absoluta, cuja principal prioridade anunciada foi a estabilidade, no espaço de menos de uma semana o país recebeu a demissão de um Primeiro-Ministro, uma dissolução do Parlamento e a convocação de eleições para março de 2024.

Várias são as teses do "como aqui chegámos e de como daqui vamos sair", contudo não posso deixar de sublinhar alguns aspetos dos acontecimentos que assolaram a nação nos últimos dias. Assim, a primeira referência terá necessariamente de ir para António Costa.

Trata-se do político nacional com maior longevidade em funções. Dessa forma, e entre os cargos que desempenhou, foi o político que mais tempo teve a........

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