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O presidente Lula desautorizou qualquer manifestação institucional que faça referência, de qualquer natureza, ao Golpe de 1964. Essa decisão, compreensível, causou desconforto ao nosso campo, afinal aprendemos que os tempos e movimentos da História são guardiões de muita sabedoria e que, visitar atos e fatos pode ter enorme poder.

Para encerrar o ciclo de artigos meus que o BRASIL 247 publicou sobre o golpe de 1964, hoje pretendo refletir sobre aspectos que me parecem fundamentais, quase que uma síntese.

Fatos antecedentes ao golpe - Desde que assumiu a presidência, após a renúncia de Jânio, João Goulart sofreu incansável campanha de destruição de sua reputação, o mesmo método usado hoje, desde as marchas de junho de 2013, perpassando pela Lava-Jato, golpe de 2016, governo Temer, eleição da extrema-direita em 2018; campanha que segue forte contra o nosso campo e contra qualquer um que se oponha ao projeto de instalação de um estado teocrático e fascista e pobre de democracia.Na época coube à UDN e a parte da imprensa: (i) convencer a opinião pública de que Jango era comunista e que o Brasil “ia virar uma Cuba” e (ii) impedir que Jango governasse (tudo com apoio do IBAD e IPES); hoje, manejada por canalhas, as redes sociais dão conta de criar uma realidade paralela para alimentar os incautos.

A ideologia do golpe - A Escola Superior de Guerra, que seguia o modelo do National War College dos EUA, foi a propagandista da ideologia que sustentou o golpe. A ESG defendia que a ameaça ao país era interna; que os inimigos eram: os sindicatos; os intelectuais; os trabalhadores rurais; a Igreja Católica; estudantes e professores universitários; que os inimigos deveriam ser neutralizados e extirpados “através de ações decisivas”, pois, “representavam séria ameaça para o país”, como escreveu Thomas Skidmore, famoso brasilianista, no seu “Brasil, de Castelo a Tancredo”.

Penso que a ideologia da ESG se mantém entre nós, muito viva.

Esse pensamento venceu Getúlio (PTB) em 1954.

A tragédia de 1954 – A similaridade entre os fatos de 1954 e aqueles de 1961, 1964, 2016, 2018, 2022 e os que ocorrem hoje, merecem reflexão posterior, especialmente no que diz respeito à polarização e o radicalismo, como método antecedente à ruptura institucional. A era JK – A morte de Getúlio trouxe confusão institucional, o país teve três presidentes até a posse de Juscelino em 31 de janeiro de 1956. Eleito pelo centrista PSD, JK teve sua posse ameaçada, também em razão do veto dos militares.

Juscelino, que tem seu governo lembrado pelo rápido crescimento econômico e pela construção de Brasília, não se ocupou dos problemas estruturais, e terminou seu governo acusado de manter relações não republicanas com as empreiteiras; deixando a presidência com o Brasil campeão do mundo no futebol, mas com problemas econômicos graves.

Jânio no Planalto – O discurso antissistema e anticorrupção venceu as eleições em 1960 e em 2018, mas sem nenhum projeto para o país. Jânio foi eleito com o apoio da direita e da extrema-direita, em poucos meses rompeu com a UDN, e com o FMI, e, sem apoio do congresso, renunciou.

A renúncia de Jânio devolveu a presidência ao PTB.

João Goulart presidente – Jango ainda voava da China para o Brasil, quando os ministros militares, liderados pelo marechal Odílio Denys, anunciaram que não permitiriam sua posse, segundo eles, ele poderia trazer ao país o comunismo (na lógica das Forças Armadas a democracia e o povo eram irrelevantes).

Grande tensão e incerteza institucional tomou conta do país e a solução foi Jango tomar posse com poderes reduzidos; foi aprovada, apressadamente, uma emenda que instituiu o regime parlamentarista, um golpe à soberania do voto e à democracia.

O referendo de 1963 – Com o apoio de políticos da direita à esquerda e das Forças Armadas, Jango conseguiu antecipar o referendo para o início de 1963, previsto para 1965; com 80% dos votos o povo decidiu pela volta do presidencialismo.

Em janeiro de 1963 teve início de fato a presidência de João Goulart, apeado do poder um ano e dois meses depois.

O Brasil de 1963 - No momento da renúncia de Jânio o Brasil tinhas sérios problemas econômicos e de infraestrutura; apesar de o PIB brasileiro crescer, desde 1940, entorno de 6% ao ano, a ausência de infraestrutura impedia desenvolvimento (a produção de energia era insuficiente; o parque fabril era obrigado a recorrer a geradores a diesel; havia racionamento de água e energia; as estradas pavimentadas eram de pouco mais de mil quilômetros; o sistema ferroviário usava bitolas diferentes em diferentes regiões; não havia política industrial ou investimento em ciência e tecnologia; o país dependia quase que totalmente de tecnologia importada).

No sistema educacional menos de 1% dos alunos matriculados no “fundamental I”, concluíam o ensino médio; não havia um sistema público de saúde; a pobreza do homem do campo fez com que enormes contingentes abandonassem o campo em direção às cidades, aumentando a demanda por moradia, escolas, saneamento, saúde e educação.

Num ciclo vicioso e trágico, de 1889 a 1961, os governos, todos de direita - sempre tão eficientes na transferência de dinheiro público para o setor privado -, foram incapazes de realizar investimentos públicos e estimular os privados.

Foi nesse contexto que João Goulart ousou propor mudanças estruturais de caráter capitalista e inspiradas na social-democracia europeia; ele submeteu as propostas ao debate, contudo, o debate democrático, foi vencido pela polarização e pelo radicalismo.

A consequência foi a ruptura institucional e vinte e um anos de ditadura.

O papel dos EUA – Sem a interferência americana não haveria golpe; João Goulart teria encontrado soluções e saídas para o país, através do debate democrático; os EUA liberaram cerca de 12 milhões de dólares para financiar a campanha de propaganda contra o governo João Goulart (através do IBAD e do IPES, que disseminavam fake News); financiaram candidatos de oposição nas eleições de 1962 (mesmo assim, o PTB de Goulart, aumentou sua bancada no Congresso).

O povo manifestou sua vontade nas urnas em 1962, ainda assim o golpe continuou em marcha; no final de 1963 o presidente Lyndon Johnson aderiu ao golpe e ofereceu apoio militar aos golpistas.

Acredito que o Brasil tenha sido vítima dos medos da Guerra Fria e dos fantasmas que orientavam a geopolítica naqueles dias.

Passados sessenta anos, é possivel mensurar o custo da ruptura institucional, por isso, não se pode perder de vista que a democracia liberal, apesar de todas as suas limitações, é o caminho disponível a ser trilhado na construção de uma sociedade fraterna e justa e um Estado de bem-estar social, suas contradições são o nosso desafio, são o desafio da nossa militância.

Que as nossas instituições vençam todas as novas tentativas de golpe e que a propaganda não obscureça a nossa compreensão da realidade.

Pedro Benedito Maciel Neto, 60, advogado, pontepretano e avô; sócio da www.macielneto.adv.brpedromaciel@macielneto.adv.br

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25.03.2024

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