O presidente do CDS, Nuno Melo, tem sido acusado de ter cometido a primeira grande gaffe da pré-campaha. E porquê? Porque admitiu, candidamente, que, se o PS vencer as eleições, é natural que venha a governar – ainda que, à direita, se possa constituir uma maioria parlamentar (que, obviamente, não se fará sem o Chega). André Ventura saltou imediatamente em cima do dirigente centrista, mas por portas travessas, exigindo explicações, antes, a Luís Montenegro. E o pobre Nuno Melo teve de se desdizer rapidamente: afinal, a AD só viabilizará um governo da AD. As declarações de Nuno Melo devem ser lidas a dois tempos, sendo que, como veremos, não são assim tão contraditórias. Afinal, Nuno Melo cometeu uma gaffe ou disse o óbvio, depois de declarações anteriores de Montenegro? É que o líder do PSD já anunciou, alto e bom som, que só será primeiro-ministro se ganhar as eleições. O que quer dizer que não o será se for o PS a vencê-las. Logo, a resposta que Ventura exigiu a Montenegro está dada. Mas Ventura pediu mais: disse que a AD deve, previamente, anunciar ao que vem. Ora, ouvindo o autodesmentido de Nuno Melo, convém, de facto, que Montenegro diga se mudou de posição – a de que não seria primeiro ministro se ficasse em 2.º lugar – e se inviabilizará um governo do PS, tendo uma maioria à direita. Ou, então, que a AD esclareça, face à posição já definida por Montenegro, se pretende apresentar um segundo nome que lidere um governo à direita. E o eleitorado tem o direito, não só de estar informado dessa opção mas também de saber quem será esse segundo nome!

Isto é cristalino. Além disso, podemos ler, nas segundas declarações de Nuno Melo, uma opção alternativa a estas duas: diz ele que a AD apenas viabilizará um governo da AD. Se tomarmos a frase pelo seu valor facial, isto não significa que a AD se venha a entender com o Chega para formar um governo que… já não seria da AD! Neste quadro, e dispondo dos elementos que o conjunto de declarações que Melo e Montenegro nos forneceram até ao momento, se o PS ganhar as eleições e a AD, dispondo de uma maioria à direita (com o Chega e a IL), inviabilizar um governo minoritário socialista, mas, ao mesmo tempo, apenas viabilizar um governo seu (que também seria minoritário), teremos novas eleições, ainda neste ano. Isto é, a AD avançará com uma moção de rejeição mas não apresentará qualquer governo alternativo viável.

Esta polémica existe pelo simples facto de termos este elefante na sala: um partido radical e populista que concorre diretamente com o PSD e que, numa OPA hostil aos sociais-democratas, até vai exibindo, como troféus de caça, alguns nomes (menores) que se vão passando da bancada “laranja” para a bancada de Ventura. Pessoal movido pela única razão do tacho, que perderá, ao figurar em lugares não elegíveis das listas definidas por Montenegro. Nada mal, para um partido, o Chega, que tanto se insurge contra os tachos! Mas quando Ventura pede explicações a Montenegro, o líder do PSD não tem nada que lhe responder. Ou melhor, pode inverter a pergunta: tenciona o Chega rejeitar um governo minoritário da AD? E se uma eventual moção de rejeição do Chega for chumbada, estará André Ventura disposto a votar favoravelmente uma moção de rejeição apresentada pela esquerda, dando, assim, a mão ao PS, aos bloquistas e aos comunistas? Se Ventura quer que os partidos mostrem o jogo, e digam ao que vêm, terá de dar o exemplo e responder a isto.

O único caminho para Luís Montenegro é reforçar a sua mensagem ‒ “só governo, se ganhar” ‒ e não se mostrar titubeante, permitindo tergiversações como a de Nuno Melo. Caso não o faça, o efeito pretendido pela arriscada declaração acima colocada entre aspas – apelar ao voto útil e esvaziar a mensagem do Chega – não só se perderá como o próprio Montenegro pode perder tudo: o voto útil e o lugar. Não reforçando a sua ideia inicial – “só governo, se ganhar” –, mete-se no mesmo beco sem saída em que se meteu Nuno Melo. Mas, para retirar argumentos a Ventura, ele deve acrescentar mais: anunciar que se, por absurdo, o Chega ganhasse as eleições, o PSD inviabilizaria um governo seu. Esta dupla declaração é a única que demonstrará aos eleitores que, da perspetiva da AD, cada voto no Chega será, na melhor das hipóteses, um voto desperdiçado. E, na pior, um voto em Pedro Nuno Santos.

Golpe de vista

A espera e o telemóvel

Uma espera ao ainda ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, convenientemente filmada por um telemóvel, com o objetivo, entre outros, de ser difundida nas redes do Chega, mostra até que ponto (baixo) poderá descer o argumentário eleitoral, em tempos de populismos. Um suposto filho de um suposto polícia que, supostamente, quando de serviço, dorme ao relento, passa acriticamente nas televisões sem que o contraditório – quem é o manifestante?, quem é o polícia?, onde são as pretensas instalações? – seja escrutinado. Depois, queixamo-nos…

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A OPA hostil ao PSD

9 14
25.01.2024

O presidente do CDS, Nuno Melo, tem sido acusado de ter cometido a primeira grande gaffe da pré-campaha. E porquê? Porque admitiu, candidamente, que, se o PS vencer as eleições, é natural que venha a governar – ainda que, à direita, se possa constituir uma maioria parlamentar (que, obviamente, não se fará sem o Chega). André Ventura saltou imediatamente em cima do dirigente centrista, mas por portas travessas, exigindo explicações, antes, a Luís Montenegro. E o pobre Nuno Melo teve de se desdizer rapidamente: afinal, a AD só viabilizará um governo da AD. As declarações de Nuno Melo devem ser lidas a dois tempos, sendo que, como veremos, não são assim tão contraditórias. Afinal, Nuno Melo cometeu uma gaffe ou disse o óbvio, depois de declarações anteriores de Montenegro? É que o líder do PSD já anunciou, alto e bom som, que só será primeiro-ministro se ganhar as eleições. O que quer dizer que não o será se for o PS a vencê-las. Logo, a resposta que Ventura exigiu a Montenegro está dada. Mas Ventura pediu mais: disse que a AD deve, previamente, anunciar ao que vem. Ora, ouvindo o autodesmentido de Nuno Melo, convém, de facto, que Montenegro diga se mudou de posição – a de que não seria primeiro ministro se ficasse em 2.º lugar – e se inviabilizará um governo do PS,........

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