Reportagens e editorial da Folha sobre a eleição do novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo revelam detalhes constrangedores da disputa entre o corregedor-geral (vencedor) e o vice-presidente (derrotado).

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Os candidatos naturais ao cargo se recusaram a dar entrevista: só se manifestariam depois da eleição. O jornal também não teve acesso formal a programas de gestão apresentados porque as propostas são de interesse dos colegas, membros do colégio eleitoral formado por 357 desembargadores.

É como se a governança do Judiciário de São Paulo fosse coisa deles.

Nem sempre o foco é a melhoria dos serviços de Justiça, ainda precários, mas sim a distribuição de benesses corporativas aos magistrados.

Como os cofres vão "engordar" a partir de 2024, pelo aumento da taxa judiciária devida pelas partes envolvidas em processos judiciais, a realidade orçamentária é "mais confortável".

Ainda sem mulheres em cargo de direção, um dos nortes da futura administração do TJ de São Paulo, que se define como o maior tribunal do mundo, responsável por 25% da tramitação judicial no Brasil, será o pagamento do passivo devido aos próprios juízes.

Por alguma razão insondável, mesmo que disciplinada pelo Conselho Nacional de Justiça, a remuneração de juízes no Brasil segue a lógica da multiplicação dos pães.

Em tese, um ministro do Supremo recebe R$ 41.650 por mês. É o teto constitucional, aparentemente criado para inglês ver. A "remuneração paradigma" de um desembargador é pouco mais de R$ 37 mil, mas é comum o pagamento de "vantagens pessoais", "indenizações", "vantagens eventuais" e "gratificações".

Quem consultar as folhas de pagamento da magistratura paulista (que, registre-se, estão no seu portal da transparência) vai verificar que, no mês de setembro (por exemplo), mais de 90% do colégio eleitoral (357 desembargadores) recebeu mais de R$ 60 mil.

O regime de dois meses de férias por ano alavanca a possibilidade de "vantagens eventuais", como abono constitucional de 1/3, indenização, antecipação, pagamentos retroativos, entre outros "desta natureza".

Assim como ministros do Supremo Tribunal Federal, juízes podem ser remunerados por palestras, conferências e participações em simpósios, mas não são obrigados a publicar os valores recebidos. Basta informar a data, o tema, o local e a entidade promotora do evento. É a antítese dos princípios constitucionais da transparência e da moralidade.

É assunto de natureza privada, sustentava em 2016 o ex-ministro do STF Ricardo Lewandowski. Não é. É de interesse público. Se um magistrado recebe valor relevante por palestra, talvez patrocinada por empresa que também litiga, a informação deve ser difundida.

A engrenagem de se beneficiar do poder judicial e administrativo é desnudada pela obra de Gregório de Matos, na cidade da Bahia do século 17. "Ai de quem caísse nas mãos dessa justiça tarda, incompetente, cruel, amparada nas duras leis do tempo", assinala Raymundo Faoro.

Como estancar a sangria e investir na eficácia do serviço judicial: este é o desafio político.

Por se tratar de benefício funcional, seus efeitos se estendem para outras carreiras jurídicas de Estado, de alguma forma equiparadas, como Ministério Público, procuradorias, Tribunais de Contas etc. Cria-se a desconfiança de que todos se vigiam muito pouco.

O sumidouro de recursos é histórico, extraordinário, estratégico, nacional.

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Vantagens corporativas no Judiciário são sumidouro de recursos

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11.11.2023

Reportagens e editorial da Folha sobre a eleição do novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo revelam detalhes constrangedores da disputa entre o corregedor-geral (vencedor) e o vice-presidente (derrotado).

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Os candidatos naturais ao cargo se recusaram a dar entrevista: só se manifestariam depois da eleição. O jornal também não teve acesso formal a programas de gestão apresentados porque as propostas são de interesse dos colegas, membros do colégio eleitoral formado por 357 desembargadores.

É como se a governança do Judiciário de São Paulo fosse coisa deles.

Nem sempre o foco é a melhoria dos serviços de Justiça, ainda precários, mas sim a distribuição de benesses corporativas aos magistrados.

Como os cofres vão "engordar" a partir de 2024, pelo aumento da taxa judiciária devida pelas partes envolvidas em processos judiciais, a realidade orçamentária é "mais confortável".

Ainda sem mulheres em cargo de direção, um dos nortes da futura administração do TJ de São Paulo, que se define como o maior tribunal do mundo, responsável por 25% da tramitação........

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