A reforma tributária, por fim, está promulgada. Em razão da complexidade do tema, o cidadão comum, pagador dos impostos que incidem sobre seus rendimentos, sobre seu consumo e sobre os serviços que usa, não tem uma opinião formada acerca de seus efeitos, se benéficos ou maléficos. Tem a singela certeza de que paga muito imposto, relativamente à sua renda.

As opiniões que se ouve, em sua maioria, vêm daqueles que se sentem prejudicados, porque perderão benefícios, ou dos “especialistas”, cujo poder de contribuição para a formação da opinião pública é muito baixo.

Reformar o sistema tributário não é coisa fácil, pois açula as tensões federativas e intersetoriais. A última ocorreu no bojo da elaboração da Constituição de 1988, estabelecendo as fontes de incidências para União, Estados e municípios e as competências dos entes federados para fixar alíquotas e arrecadar seus impostos. Entre suas consequências, destaca-se um dos mais complexos processos tributários do mundo, com diferentes impostos pesando sobre a mesma base e com cobranças cumulativas ao longo da cadeia produtiva, causando ineficiência na economia, insegurança jurídica e injustiça fiscal.

Desde o final da década de 1980, o aumento da carga tributária total foi extraordinário, pulando de 22% (1988) para 34% (2022). Embora difícil de calcular, seu impacto no aumento da informalidade não deve ser desprezado. Enfim, o sistema tributário havia perdido no Brasil seus três princípios básicos: simplicidade, justiça tributária e eficiência econômica. A reforma reduziu o número de tributos de cinco para dois, eliminou a cobrança cumulativa e passou o recolhimento da origem para o destino. Mudanças que terão efeitos positivos sobre a eficiência da economia.

Não é por outra razão que, no último domingo, os editoriais dos jornais “O Globo”, “Folha de S.Paulo” e “O Estado de S. Paulo”, uníssonos, saudaram a aprovação final da reforma tributária na Câmara, comparando-a com o Plano Real, e anteviram seu efeito positivo na produtividade e no crescimento econômico. Enfim, simplicidade e eficiência econômica já justificam a reforma.

O acordo parlamentar para aprová-la foi expressivo. Contudo, nem tudo são flores. Vários regimes especiais foram criados, com alíquotas menores (subsídios implícitos), resultando aumento da carga em outros setores.

Agora, aprovada a reforma constitucional, a agenda parlamentar de 2024 estará comprometida com a regulamentação do novo regime tributário, cuja vigência se dará a partir de 2025. O diabo estará escondido nos detalhes, e ainda faltam as reformas do imposto de renda e do patrimônio. Certa vez, Winston Churchill observou: “O povo deve ser poupado de saber como são feitas as leis e as salsichas”. O percurso para a modernização é obscuro, longo e espinhoso. Não tenha pressa, tenha fé.

Desejo a todas e a todos um feliz Natal e muita esperança no futuro.

QOSHE - As reformas e as salsichas - Paulo Paiva
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As reformas e as salsichas

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23.12.2023

A reforma tributária, por fim, está promulgada. Em razão da complexidade do tema, o cidadão comum, pagador dos impostos que incidem sobre seus rendimentos, sobre seu consumo e sobre os serviços que usa, não tem uma opinião formada acerca de seus efeitos, se benéficos ou maléficos. Tem a singela certeza de que paga muito imposto, relativamente à sua renda.

As opiniões que se ouve, em sua maioria, vêm daqueles que se sentem prejudicados, porque perderão benefícios, ou dos “especialistas”, cujo poder de contribuição para a formação da opinião pública é muito baixo.

Reformar o sistema tributário não é coisa fácil, pois açula as tensões federativas e intersetoriais. A última ocorreu no bojo da elaboração da........

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