Não fossem as mídias sociais canais tão relevantes para muitos aspectos de uma atuação política, não tenho a menor dúvida de que eu não possuiria mais perfis em nenhuma delas: nem no Facebook, nem no Instagram, nem no TikTok, nem no X… E tudo bem se você quiser ter um perfil em todas essas plataformas. Só não as chame de “redes sociais”.

As redes sociais são formas de interação entre as pessoas. E uma cidade depende muito de como os seus cidadãos interagem uns com os outros.
No dia 28 de março de 2024, uma quinta-feira, já no fim da noite, parti caminhando do Mina Jazz Bar, um espaço onde as pessoas se divertem com gastronomia e música, na avenida Álvares Cabral, 17, em direção a outro estabelecimento. Estava acompanhando de amigos e disse a eles que iria apresentá-los a um lugar muito legal.

Meses antes, Leandro Rallo, um artista, designer e DJ, havia me convidado para conhecer um espaço que estava vazio há tempos. Tratava-se de um edifício com fachada em pó de pedra datado de uma época em que a “Gare du Belo Horizonte”, nossa estação ferroviária, era o grande ponto de conexão para chegadas e partidas. Na mesma região, há um conjunto de hotéis sem uso há décadas, uma vez que o trem foi substituído por outras formas de viajar.

Empolgado, ele me explicava que via naquele ambiente o potencial para criar algo diferente. Visitamos os aposentos dos funcionários, a garagem e os quartos. E ele apontava para muitas direções dizendo o que seria o quê. Já na calçada, coçava a cabeça perguntando-me se eu achava que iria dar certo. Eu disse que sim, pois eu acredito nesta cidade.

Não levou muito tempo para a proprietária do espaço, Marina Lopes, ver a extrema transformação realizada. Além de uma decoração elaborada (somada à obra de Ans Rallo), serviço de cozinha (com João Borges) e poltronas aconchegantes. E o bar, claro. O palco estava montado. Além do idealizador, somaram-se para empreender Daniel Zago, Janaína Renné, Léo Ziller, Paulo Oliveira e Ricardo Laudares. Aplaudo-os!

Não é fácil tirar uma ideia assim do papel. Eu sei. Apesar dos muitos esforços da Câmara Municipal em atuar para desburocratizar a cidade, quem quer empreender em Belo Horizonte sofre. Além da papelada, os riscos. E uma prefeitura chata e lenta.

Fica na avenida Santos Dumont, número 240, no centro de Belo Horizonte, quase na esquina com a rua da Bahia, pertinho da praça Rui Barbosa. E foi uma das noites mais divertidas que eu já vivenciei nessa cidade. A fila na porta era algo que eu não via há tempos… Surgiram para se apresentar, além de Marco Túlio Lara, um dos fundadores da banda Jota Quest, Haroldo Ferretti e Henrique Portugal, do Skank, que deixou saudades.

Naquela noite, naquele tempo, éramos gente interagindo de verdade, ao se apresentar para desconhecidos sem ser por uma mensagem e ao interagir sem ser por uma tela luminosa. Era uma porta que se abria para uma calçada antes escura e sem circulação em que tantos desafios a serem superados ficam mais perceptíveis. Não adianta se refugiar num condomínio fechado em Nova Lima. Os (nossos!) problemas seguem aqui.

Cada imóvel, cada quarteirão, cada bairro da nossa cidade carrega um mundo de possibilidades à espera de quem queira fazer acontecer. Uma cidade vibrante precisa se encontrar.

Não sou saudosista. Acho que o saudosismo é uma prisão. É uma forma de não se permitir perceber que o melhor ainda pode estar por vir. Encaro o passado como uma motivação… Há cerca de um século, na mesma avenida, ainda denominada “do Comércio”, duas pessoas se conheceram num estabelecimento divertido. Era um lugar com um bar e com música.

Um estudante de medicina descreveu assim um jornalista: “Um moço muito calado, óculos redondos, aros de tartaruga, olhos muito claros, pele muito branca”. Assim, numa noite cheia de possibilidades, Pedro Nava avistou Carlos Drummond. Era o início de uma amizade. Também era mais uma página da história da capital mineira sendo escrita.

Tenho certeza que, naquele momento, nenhum dos dois estava cercado de gente que imaginava o que eles viriam a ser. E eles também não saíram de casa para escrever… Não. Eles queriam se divertir. E ao se conhecerem se divertindo começaram a tecer um fio das muitas redes sociais que nos movem. Elas não são artificiais ou virtuais. Elas são verdadeiras e precisam da interação entre pessoas de forma intensa.

Que o Hotel Londres dê certo para que essa cidade dê certo. E que essa hospedaria seja ponto de encontro para quem queira muito uma Belo Horizonte assim: de verdade.

GABRIEL AZEVEDO
Presidente da Câmara Municipal de BH
ver.gabriel@cmbh.mg.gov.br

QOSHE - O Grande Hotel Londres - Gabriel Azevedo
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O Grande Hotel Londres

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12.04.2024

Não fossem as mídias sociais canais tão relevantes para muitos aspectos de uma atuação política, não tenho a menor dúvida de que eu não possuiria mais perfis em nenhuma delas: nem no Facebook, nem no Instagram, nem no TikTok, nem no X… E tudo bem se você quiser ter um perfil em todas essas plataformas. Só não as chame de “redes sociais”.

As redes sociais são formas de interação entre as pessoas. E uma cidade depende muito de como os seus cidadãos interagem uns com os outros.
No dia 28 de março de 2024, uma quinta-feira, já no fim da noite, parti caminhando do Mina Jazz Bar, um espaço onde as pessoas se divertem com gastronomia e música, na avenida Álvares Cabral, 17, em direção a outro estabelecimento. Estava acompanhando de amigos e disse a eles que iria apresentá-los a um lugar muito legal.

Meses antes, Leandro Rallo, um artista, designer e DJ, havia me convidado para conhecer um espaço que estava vazio há tempos. Tratava-se de um edifício com fachada em pó de pedra datado de uma época em que a “Gare du Belo Horizonte”, nossa estação ferroviária, era o grande ponto de conexão para chegadas e partidas. Na mesma região, há um........

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