Os atrasos do PPR e a crise na Habitação

Os atrasos do PPR e a crise na Habitação

Álvaro Santos 16/04/2024 10:12

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Uma herança pesada para o novo governo.

A execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) anda pelas ruas da amargura. Com de 3 anos de existência e governos estáveis, Portugal apenas concretizou uma execução financeira de 24%. Na componente Habitação do PRR, a situação é ainda pior: uma medíocre taxa de execução de 14%. O novo governo herda uma situação muito complexa, apesar dos alertas efetuados por todos os agentes do mercado.

O drama é que faltam apenas 2 anos e meio para o final deste programa, que deve estar concluído até ao final de 2026, e não se vislumbra nenhuma possibilidade de prorrogação de prazo, uma vez que as novas preocupações europeias estão concentradas mais a Leste, no conflito da Ucrânia.

Mas se, de uma forma geral, o PRR anda pelas ruas da amargura, em matéria de Habitação, a situação é ainda pior.

Recorde-se que a principal linha de investimento da componente Habitação do PRR é o Programa de Apoio ao Acesso à Habitação (1º Direito) que tem por objetivo garantir uma habitação digna e adequada para as famílias mais necessitadas e para os grupos mais vulneráveis. Este investimento tem uma dotação de 1.211 M€ e compreende a construção de novos edifícios ou a renovação de habitações existentes, bem como, sempre que necessário, a aquisição de novos edifícios ou o arrendamento de edifícios para subarrendar, prevendo-se dar resposta a pelo menos 26.000 famílias até 2026.

No entanto, à data de hoje, a componente da Habitação do PRR surge com uma execução de 14%, o que representa o pagamento aos respetivos beneficiários finais de apenas 436 M€ de uma dotação total de 3.226 M€.

Esta é uma situação dramática e paradoxal.

Dramática porque vivemos, a maior crise no setor habitacional deste século, e paradoxal porque nunca, como agora o nosso país dispôs de tanto dinheiro para investir no setor.

Temos milhões de euros para habitação, mas os prazos do PRR impõem a sua conclusão até finais de 2026. Ou seja, temos uma crise séria, temos dinheiro para ajudar a minimizar essa crise, mas não temos tempo para o executar.

O Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) é a entidade pública responsável pela coordenação e financiamento, cabendo aos Municípios um papel central na sua dinamização e implementação, primeiro através da elaboração das Estratégias Locais de Habitação e depois com a promoção direta das soluções habitacionais financiadas através de Acordos de Colaboração.

Todo este trabalho foi desenvolvido pelos municípios portugueses nos últimos meses e anos, culminando na submissão de milhares de candidaturas para financiamento das soluções habitacionais, no passado dia 31 de Março.

É chegada a hora da apreciação célere destas candidaturas, permitindo que os procedimentos contratuais possam ser lançados e as obras iniciadas, tendo em conta que tudo deve estar concluído até Junho de 2026, sob pena do dinheiro disponível não ser aplicado ou até devolvido a Bruxelas.

Aliás, o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa lançou recentemente o alerta para a urgência da aprovação dos projetos habitacionais submetidos e que se encontram pendentes da resposta do IHRU.

Os novos responsáveis governativos têm aqui um desafio ciclópico: fazer rapidamente em dois escassos anos aquilo que não foi feito nos últimos três.

Neste contexto, importa também não esquecer que o Portugal 2030 já deveria estar em velocidade cruzeiro ao final do primeiro ano de existência, mas a verdade é que apresenta uma medíocre taxa de execução de 0,5%.

Em matéria de Política de Coesão e do seu impulso para promover o crescimento económico sustentado e a convergência com a Europa, parece que os anos de ouro do “bom aluno português” constituem uma memória longínqua que ficou lá atrás, no final do século passado.

Parece que o nosso País não aprendeu nada com 40 anos de adesão à União Europeia. Recorde-se que Portugal já recebeu mais de 84.000 milhões de euros provenientes da Política de Coesão. É verdade que o nosso País cresceu, desenvolveu-se, modernizou-se, mas ainda persistem muitos constrangimentos e entropias.

A excessiva burocracia, a falta de clareza das regras, a morosidade na contratação pública, a sobreposição de objetivos e investimentos, a insuficiência de medidas e de recursos financeiros destinados à competitividade e à inovação das empresas, o excessivo peso da componente pública dos investimento ou a incapacidade da máquina do Estado para assegurar os processos de candidatura, seleção, aprovação, pagamento, acompanhamento, monitorização, controlo, auditoria e avaliação, são um enorme empecilho a uma célere e desejável boa aplicação dos fundos europeus.

Para isso, é fundamental colocar a máquina administrativa a funcionar em pleno e a responder imediatamente às necessidades económicas e sociais dos diversos setores da atividade. Sem burocracias e sem mais delongas.

Os portugueses não compreenderiam se algo falhasse nesta matéria.

Doutor, Especialista em Habitação e coautor do livro 'Políticas Locais de Habitação'

A execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) anda pelas ruas da amargura. Com de 3 anos de existência e governos estáveis, Portugal apenas concretizou uma execução financeira de 24%. Na componente Habitação do PRR, a situação é ainda pior: uma medíocre taxa de execução de 14%. O novo governo herda uma situação muito complexa, apesar dos alertas efetuados por todos os agentes do mercado.

O drama é que faltam apenas 2 anos e meio para o final deste programa, que deve estar concluído até ao final de 2026, e não se vislumbra nenhuma possibilidade de prorrogação de prazo, uma vez que as novas preocupações europeias estão concentradas mais a Leste, no conflito da Ucrânia.

Mas se, de uma forma geral, o PRR anda pelas ruas da amargura, em matéria de Habitação, a situação é ainda pior.

Recorde-se que a principal linha de investimento da componente Habitação do PRR é o Programa de Apoio ao Acesso à Habitação (1º Direito) que tem por objetivo garantir uma habitação digna e adequada para as famílias mais necessitadas e para os grupos mais vulneráveis. Este investimento tem uma dotação de 1.211 M€ e compreende a construção de novos edifícios ou a renovação de habitações existentes, bem como, sempre que necessário, a aquisição de novos edifícios ou o arrendamento de edifícios para subarrendar, prevendo-se dar resposta a pelo menos 26.000 famílias até 2026.

No entanto, à data de hoje, a componente da Habitação do PRR surge com uma execução de 14%, o que representa o pagamento aos respetivos beneficiários finais de apenas 436 M€ de uma dotação total de 3.226 M€.

Esta é uma situação dramática e paradoxal.

Dramática porque vivemos, a maior crise no setor habitacional deste século, e paradoxal porque nunca, como agora o nosso país dispôs de tanto dinheiro para investir no setor.

Temos milhões de euros para habitação, mas os prazos do PRR impõem a sua conclusão até finais de 2026. Ou seja, temos uma crise séria, temos dinheiro para ajudar a minimizar essa crise, mas não temos tempo para o executar.

O Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) é a entidade pública responsável pela coordenação e financiamento, cabendo aos Municípios um papel central na sua dinamização e implementação, primeiro através da elaboração das Estratégias Locais de Habitação e depois com a promoção direta das soluções habitacionais financiadas através de Acordos de Colaboração.

Todo este trabalho foi desenvolvido pelos municípios portugueses nos últimos meses e anos, culminando na submissão de milhares de candidaturas para financiamento das soluções habitacionais, no passado dia 31 de Março.

É chegada a hora da apreciação célere destas candidaturas, permitindo que os procedimentos contratuais possam ser lançados e as obras iniciadas, tendo em conta que tudo deve estar concluído até Junho de 2026, sob pena do dinheiro disponível não ser aplicado ou até devolvido a Bruxelas.

Aliás, o Presidente da Câmara Municipal de Lisboa lançou recentemente o alerta para a urgência da aprovação dos projetos habitacionais submetidos e que se encontram pendentes da resposta do IHRU.

Os novos responsáveis governativos têm aqui um desafio ciclópico: fazer rapidamente em dois escassos anos aquilo que não foi feito nos últimos três.

Neste contexto, importa também não esquecer que o Portugal 2030 já deveria estar em velocidade cruzeiro ao final do primeiro ano de existência, mas a verdade é que apresenta uma medíocre taxa de execução de 0,5%.

Em matéria de Política de Coesão e do seu impulso para promover o crescimento económico sustentado e a convergência com a Europa, parece que os anos de ouro do “bom aluno português” constituem uma memória longínqua que ficou lá atrás, no final do século passado.

Parece que o nosso País não aprendeu nada com 40 anos de adesão à União Europeia. Recorde-se que Portugal já recebeu mais de 84.000 milhões de euros provenientes da Política de Coesão. É verdade que o nosso País cresceu, desenvolveu-se, modernizou-se, mas ainda persistem muitos constrangimentos e entropias.

A excessiva burocracia, a falta de clareza das regras, a morosidade na contratação pública, a sobreposição de objetivos e investimentos, a insuficiência de medidas e de recursos financeiros destinados à competitividade e à inovação das empresas, o excessivo peso da componente pública dos investimento ou a incapacidade da máquina do Estado para assegurar os processos de candidatura, seleção, aprovação, pagamento, acompanhamento, monitorização, controlo, auditoria e avaliação, são um enorme empecilho a uma célere e desejável boa aplicação dos fundos europeus.

Para isso, é fundamental colocar a máquina administrativa a funcionar em pleno e a responder imediatamente às necessidades económicas e sociais dos diversos setores da atividade. Sem burocracias e sem mais delongas.

Os portugueses não compreenderiam se algo falhasse nesta matéria.

Doutor, Especialista em Habitação e coautor do livro 'Políticas Locais de Habitação'

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Uma herança pesada para o novo governo.

A execução do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) anda pelas ruas da amargura. Com de 3 anos de existência e governos estáveis, Portugal apenas concretizou uma execução financeira de 24%. Na componente Habitação do PRR, a situação é ainda pior: uma medíocre taxa de execução de 14%. O novo governo herda uma situação muito complexa, apesar dos alertas efetuados por todos os agentes do mercado.

O drama é que faltam apenas 2 anos e meio para o final deste programa, que deve estar concluído até ao final de 2026, e não se vislumbra nenhuma possibilidade de prorrogação de prazo, uma vez que as novas preocupações europeias estão concentradas mais a Leste, no conflito da Ucrânia.

Mas se, de uma forma geral, o PRR anda pelas ruas da amargura, em matéria de Habitação, a situação é ainda pior.

Recorde-se que a principal linha de investimento da componente Habitação do PRR é o Programa de Apoio ao Acesso à Habitação (1º Direito) que tem por objetivo garantir uma habitação digna e adequada para as famílias mais necessitadas e para os grupos mais vulneráveis. Este investimento tem uma dotação de 1.211 M€ e compreende a construção de novos edifícios ou a renovação de habitações existentes, bem como, sempre que necessário, a aquisição de novos edifícios ou o arrendamento de edifícios para subarrendar, prevendo-se dar resposta a pelo menos 26.000 famílias até 2026.

No entanto, à data de hoje, a componente da Habitação do PRR surge com uma execução de 14%, o que representa o pagamento aos respetivos beneficiários finais de apenas 436 M€ de uma dotação total de 3.226 M€.

Esta é uma situação dramática e paradoxal.

Dramática porque vivemos, a maior crise no setor habitacional deste século, e paradoxal porque nunca, como agora o nosso país dispôs de tanto dinheiro para investir no setor.

Temos milhões de euros para habitação, mas os prazos do PRR impõem a sua conclusão até finais de 2026. Ou seja, temos uma crise séria, temos dinheiro para ajudar a minimizar essa crise, mas não temos tempo para o executar.

O Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) é a entidade pública responsável pela coordenação e financiamento, cabendo aos Municípios um papel central na sua dinamização e implementação,........

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