Ao longo das últimas duas semanas, tem sido evidente o interesse em explicar os resultados eleitorais do Chega. O país pareceu surpreendido, como se Ventura fosse uma novidade ou que as sondagens já não mostrassem que os seus votos iriam aumentar significativamente.

O facto de se procurarem respostas só após as eleições, e não antes, é um exemplo interessante de como o país aborda os seus desafios. Portugal é ótimo a reagir e péssimo a antecipar.

O distanciamento entre políticos e eleitores é um problema antigo, mas atual, com os resultados no Algarve a serem um bom exemplo.

Algumas semanas antes da campanha, propus aqui alguns temas que me pareciam cruciais serem discutidos de forma aberta, honesta e construtiva. Sem surpresa, mas com tristeza, foram assuntos esquecidos ou, talvez pior, evitados pela maioria dos políticos.

Não se falou, por exemplo, de segurança, de água nem de imigração, questões críticas para a sustentabilidade de um país, seja em termos económicos seja de coesão social.

E o que dizer do facto de o Chega ser, de longe, o partido com melhores resultados de interação nas redes sociais, sobretudo no TikTok?

A Iniciativa Liberal e o Livre também trabalham as redes de forma sistemática e objetiva, mas como explicar que os restantes partidos continuem no mantra eleitoral do século XX de comícios, jantares, arruadas, cartazes e tempos de antena na televisão?

Como é possível que PS e PSD praticamente ignorem as novas formas de chegarem às pessoas? Com agências de comunicação e gurus do marketing envolvidos, ninguém pensa no posicionamento destes partidos, trabalhando a sua sustentabilidade e relevância?

Não há quem repare nas alterações demográficas em Portugal? Os resultados do PS na faixa etária 18-25 indiciam que se poderá tornar num partido de pensionistas e funcionários públicos. Um partido do passado, percecionado como pouco interessado no futuro.

Os mandatos do Chega foram obtidos, em boa parte, com os novos votantes – é a democracia a funcionar. Não vai ser fácil voltar a colocar a pasta de dentes no tubo e os fenómenos internacionais mostram que se trata de uma tendência global.

Quem pretenda ajudar a defender o regime democrático deve abandonar as discussões antigas, sectárias e politicamente corretas, para apostar em falar do que interessa às pessoas, até porque os espaços livres serão sempre preenchidos.

QOSHE - Surpreendidos? - Filipe Garcia
menu_open
Columnists Actual . Favourites . Archive
We use cookies to provide some features and experiences in QOSHE

More information  .  Close
Aa Aa Aa
- A +

Surpreendidos?

10 7
22.03.2024

Ao longo das últimas duas semanas, tem sido evidente o interesse em explicar os resultados eleitorais do Chega. O país pareceu surpreendido, como se Ventura fosse uma novidade ou que as sondagens já não mostrassem que os seus votos iriam aumentar significativamente.

O facto de se procurarem respostas só após as eleições, e não antes, é um exemplo interessante de como o país aborda os seus desafios. Portugal é ótimo a reagir e péssimo a antecipar.

O distanciamento entre políticos e eleitores é um problema antigo, mas atual, com os resultados no Algarve a serem um bom........

© Jornal Económico


Get it on Google Play