Tenda montada entre os escombros de um edifício danificado por bombardeio israelense em Rafah, na Faixa de Gaza

Obstinação não é energia, estupidez não é firmeza. Imprevisibilidade e incerteza não justificam improvisação e violência. Os objetivos inaceitáveis dos governos atuais de dois dos mais simbólicos e admiráveis povos da antiguidade – persas e hebreus - são uma lástima política e uma vergonha moral. Combater, sobreviver e garantir a segurança de Israel e do Irã, não é o que move o radical Benjamin Netanyahu, nem o xiita Aiatolá Khamenei.

Desgastados, sem criatividade, transmitindo aos seus países seus instintos pessoais mais ferozes e sem a sabedoria que a história de seus povos ensinou, as vibrações ruins que deles emanam comprovam como no Oriente Médio é um retrocesso a mania de governos longevos, sem fim.

A maior motivação dos dois é se aproveitar da desordem mundial que tolera a equivalência moral entre o desejo do governante e os crimes que comete. Equação perversa de um mundo sem regulação internacional diante de uma ONU frágil e desmoralizada e da ascensão da criminalidade e do terrorismo.

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Este foi o primeiro ataque direto a Israel perpetrado pelo regime dos aiatolás iranianos. Tudo bem que o Irã organizou e divulgou o ataque de uma maneira que desse chance de Israel se programar, calcular os riscos, e se defender.

Oque Israel fez, aliás, de forma primorosa, com alguma ajuda de seus aliados. O contra-ataque contido de Israel, também ao decidir reagir sem massacrar, mostra que o governo de Netanyahu entendeu o recado de Khamenei e decidiu tratá-lo diferente dos terroristas do Hamas. Os dois ataques, “cuidadosamente calibrados”, revelam a estranha interação entre dois tiranos e seus aliados internacionais.

Quem não se incomoda de estar por fora da lógica de dois governos obsoletos, aconselho a não olhar para a realidade dos fatos, mas para as conexões que eles vão adquirir.

O Oriente Médio sempre nos ofereceu um cenário de risco e incerteza entrelaçados cada vez mais dada a grande complexidade da disputa na região. Com isso, as companhias de seguro, que fazem da ciência de medir risco e da arte de avaliar incerteza sua vocação, estão sob grande pressão. Como assegurar de verdade a restituição de danos oriundos de destruição física causada em uma região cada vez mais vulnerável a conflitos?

Em tal contexto, como andam as mensurações acerca das perspectivas de risco para a geopolítica global balançadas pela conflagração no Oriente Médio? Compilada por Dario Caldara e Matteo Iacoviello, que trabalham para o FED, o Banco Central americano, existe uma série que se baseia numa identificação de menções a situações que impactam risco geopolítico encontradas em 10 dos principais jornais de língua inglesa.

Como esperado, o ataque iraniano a Israel produziu uma curva ascendente no índice. Todavia, não só a medida vem relativamente elevada desde o ataque do Hamas contra Israel em outubro de 2023, como, de fato, o índice permanece bem abaixo dos níveis mais altos atingidos logo após o ataque daquele outubro.

É evidente que uma conflagração total entre Irã e Israel não serviria a nenhum dos dois lados. É um cenário péssimo para suas populações. Países herdeiros de duas grandes civilizações, a persa e a hebraica, Irã e Israel são reféns de suas ofensivas estratégias de defesa. Se prevalecer a lógica de que a cada ataque – não importando quão bem-sucedido em causar estrago – couber um contra-ataque, os países serão capturados por uma espiral beligerante.

Enquanto a civilização hebraica é uma das principais raízes do mundo ocidental judaico-cristão, a civilização persa se organizou a partir de um dos mais complexos e poderosos impérios do mundo antigo. O império persa foi particularmente bem-sucedido em sua expansão territorial por conta da prática de poupar a vida das populações conquistadas e de seus líderes.

Sendo também notória sua tolerância para com a pluralidade de manifestações culturais e religiosas ao longo do império. Uma posição bastante diferente da praticada pela teocracia vigente em Teerã. Um regime, que por sua intolerância e falta de apreço pelas liberdades individuais não é nada bem-quisto pela diáspora iraniana mundo afora.

Já os judeus e cristãos que saíram da terra de Israel e se espalharam pelo mundo explicam a simpatia – e até comprometimento – que os países ocidentais tendem a ter com o democrático Estado de Israel. Ainda que o atual governo Netanyahu ponha essa simpatia à prova com sua fixação de permanência no poder à custa de métodos belicosos e pouco misericordiosos.

No momento, o risco de conflito entre Israel e Irã aumenta substancialmente dada a característica de suas lideranças. E isso envolve o mundo em esquecimento e incerteza.

QOSHE - Persas e hebreus malgovernados - Paulo Delgado
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Persas e hebreus malgovernados

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21.04.2024

Tenda montada entre os escombros de um edifício danificado por bombardeio israelense em Rafah, na Faixa de Gaza

Obstinação não é energia, estupidez não é firmeza. Imprevisibilidade e incerteza não justificam improvisação e violência. Os objetivos inaceitáveis dos governos atuais de dois dos mais simbólicos e admiráveis povos da antiguidade – persas e hebreus - são uma lástima política e uma vergonha moral. Combater, sobreviver e garantir a segurança de Israel e do Irã, não é o que move o radical Benjamin Netanyahu, nem o xiita Aiatolá Khamenei.

Desgastados, sem criatividade, transmitindo aos seus países seus instintos pessoais mais ferozes e sem a sabedoria que a história de seus povos ensinou, as vibrações ruins que deles emanam comprovam como no Oriente Médio é um retrocesso a mania de governos longevos, sem fim.

A maior motivação dos dois é se aproveitar da desordem mundial que tolera a equivalência moral entre o desejo do governante e os crimes que comete. Equação perversa de um mundo sem regulação internacional diante de uma ONU frágil e desmoralizada e da ascensão da criminalidade e do terrorismo.

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