1. Para mim é ponto assente: Jesus está nos outros e recebe como feito a si o que lhes fazemos.

Ele o disse: tive fome e deste-me de comer, tive sede e deste-me de beber, era peregrino e acolheste-me, estava nu e deste-me que vestir, adoeci e visitaste-me, estive na prisão e foste ter comigo. Sempre que fizeste isto a um dos meus irmãos mais pequeninos a mim mesmo o fizeste (Mateus 25, 31-40).

Confirmou-o a Saulo quando este ia a caminho de Damasco decidido a perseguir os cristãos: «Estava (Saulo) a caminho e já próximo de Damasco, quando se viu subitamente envolvido por uma intensa luz vinda do Céu. Caindo por terra ouviu uma voz que lhe dizia: ‘Saulo, Saulo, por que me persegues?’ Ele perguntou: ‘Quem és Tu, Senhor?’. Respondeu (a voz): ‘Eu sou Jesus, a quem tu persegues’» (Atos dos Apóstolos 9, 3-5).

«Nós queremos ver Jesus», disseram uns gregos a Filipe (João 12, 20-21). Hoje, à luz da fé, não custa nada ver Jesus: basta olhar para a frente, para trás, para os lados. Onde está uma pessoa encontra-se Jesus.

Jesus Cristo anda na rua, canta Hermano da Câmara. E anda mesmo. Reconhecemo-lo? Eis a grande questão.


2. A presença de Jesus nos outros (que, para mim, é uma inabalável verdade de fé) tem consequências que devo saber aceitar, e aí reside o exigente do ser cristão. Se ser cristão se resumisse a ser batizado, a rezar, a ir (participar é outra coisa) à Missa ao domingo…

A fé sem obras é morta. Pelo que faço se conhece a fé que tenho (Carta de Tiago, 2, 14-19). E as obras a que se refere o texto não são construções materiais, embora também faça falta realizá-las para dar às pessoas condições dignas de vida. Jesus também está nos sem-abrigo a reclamar um teto.

Se realmente acredito que Jesus está nos outros, trato-os como trato, falo-lhes como falo, faço-lhes o que faço? A fé na presença de Jesus nos outros não me leva a corrigir comportamentos?

À semelhança do encontro com Saulo, se não vivo em coerência com a fé também a mim Ele poderá dizer: eu sou Jesus a quem tu maltratas, a quem tu difamas, a quem tu calunias, de quem tu escarneces, a quem tu desprezas, a quem tu prejudicas, de cuja necessidade tu abusas, a quem tu falas com maus modos, a quem tu voltas as costas…

Mas se O reconhecer nos outros dirá: sou Cristo a quem ajudaste a pagar a renda de casa e os medicamentos, que acompanhaste ao médico, a quem deste explicações de graça, a quem defendeste de acusações injustas, a quem deste uma palavra de encorajamento, a quem arranjaste trabalho digno e dignamente remunerado, a quem ajudaste a calçar as meias e a apertar os cordões dos sapatos…

Uma pergunta: não andaremos, com certa frequência, a recordar o sofrimento de Jesus de há mais de dois mil anos esquecidos de alertar, como devemos, para o sofrimento de Jesus nos tempos de hoje e para as perseguições de que é objeto? O sofrimento de Jesus em tantas pessoas neste ano de 2024 não nos incomoda e nos sacode?


3. É lindo ter fé. É consolador ter fé. Mas se não mostro com a vida aquilo em que acredito… Se não vejo Jesus (e o trato como deve ser tratado) na pessoa que me prepara as refeições, que me vende bens de que preciso, nas pessoas com quem me cruzo, no desconhecido que me pede uma informação…

Aqui em Braga é tempo de Lausperene. Está em preparação o V Congresso Eucarístico Nacional. Somos convidados a honrar o Jesus do sacrário e a pensar muito muito muito nos Jesus que lá não estão.

QOSHE - Jesus nos outros - Silva Araújo
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Jesus nos outros

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14.03.2024

1. Para mim é ponto assente: Jesus está nos outros e recebe como feito a si o que lhes fazemos.

Ele o disse: tive fome e deste-me de comer, tive sede e deste-me de beber, era peregrino e acolheste-me, estava nu e deste-me que vestir, adoeci e visitaste-me, estive na prisão e foste ter comigo. Sempre que fizeste isto a um dos meus irmãos mais pequeninos a mim mesmo o fizeste (Mateus 25, 31-40).

Confirmou-o a Saulo quando este ia a caminho de Damasco decidido a perseguir os cristãos: «Estava (Saulo) a caminho e já próximo de Damasco, quando se viu subitamente envolvido por uma intensa luz vinda do Céu. Caindo por terra ouviu uma voz que lhe dizia: ‘Saulo, Saulo, por que me persegues?’ Ele perguntou: ‘Quem és Tu, Senhor?’. Respondeu (a voz): ‘Eu sou Jesus, a quem tu persegues’» (Atos dos Apóstolos 9, 3-5).

«Nós queremos ver Jesus», disseram uns........

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