O Chade atinge actualmente vários limites. O primeiro, interno, de 10 de outubro, data limite do período de transição de dois anos, estabelecido pela Junta Militar liderada pelo Major-General e Presidente Interino (PRi), Mahamat Déby Itno, que sucedeu a seu pai, o PR eleito (PRe) Idriss Déby (1990-2021), após morte na frente de batalha ainda por explicar cabalmente. O filho cavalgou abril desse ano com a influência que detinha e detém, junto das fileiras e em poucas horas instalou-se no trono, ainda quente. Decretou um período de transição de 18 meses, que em pouco tempo passou para 2 anos. A Comunidade Internacional, a União Africana, quem conta, “assobiou para o lado”! Porquê?

Em primeiro e também do ponto de vista interno, é importante para a estabilidade regional que o Povo Zaghawa, a etnia predominante no Darfur do norte e nordeste do Chade, mantenha as rédeas, para a manutenção da estrutura social que permita um regresso à constitucionalidade, programado para maio/junho, com a realização de eleições presidenciais. É tão importante para os Zaghawa e para a estabilidade do Chade que estes se mantenham no poder, que a oposição política ao actual Estabelecimento é também encabeçada por primos do actual PRi. A este propósito, vale a pena ter presente os seguintes factos: O PRi Mahamat Déby Itno é suspeito de ter assassinado o próprio pai e de ter tudo preparado para lhe suceder, em apoio militar. O principal líder da oposição, já não o é! Ou seja, o primo do PRi, Yaya Dillo, também líder da oposição (PSF - Partido Socialista Sem Fronteiras), foi assassinado a 28 de fevereiro. Quem é que foi preso, sob suspeita de o ter assassinado? O tio do PRi, Saleh Deby Itno, irmão do último PRe, Idriss Déby, cujas circunstâncias da morte ainda estão por apurar. Em resumo, o actual PRi eliminou dois potenciais candidatos, impedindo que um se seguisse ao outro, anulando assim o cenário da vaga de fundo, tão querida às segundas e terceiras escolhas. Tudo isto aconteceu dentro da própria família!

Em segundo e do ponto de vista internacional, o Chade também marca um “limite geodésico” entre a África francófona e, uma vez mais, a África russófona, que por aqui mantém a lógica soviética da “conquista em bloco”, onde a peça do dominó tomba a mais próxima e assim sucessivamente. Ora o Chade encontra-se nessa “fronteira ideológica, entalado” entre o bloco Aliança dos Estados do Sahel (Mali, Burquina e Níger) a Oeste, sob influência e comando russo, a República Centro Africana a Sul, onde os Wagner têm o seu Quartel-General no continente, República do Sudão a Leste e em guerra, da qual a sorte interessa aos russos e a Norte, a “Líbia de todas as milícias”, onde o FACT, a Frente pela Alternância e Concórdia no Chade, o mais forte e estruturado grupo político-militar da oposição chadiana, também suspeito da morte do PRe em 2021, exercita com fogo real sempre que solicitado pelo Marechal Haftar a “ajudar a resolver” certas disputas tribais no Sul da Líbia.

Nos antípodas desta força centrípeta russa, o PM do Chade, Succès Masra, encetou uma “tournée diplomática” pelos EUA e Europa, ao encontro das instituições financeiras internacionais, que lhe garantam o dinheiro e as condições para as eleições presidenciais de maio e junho, a duas voltas. Esta é a solução/aposta do lóbi ocidental nesta “fronteira africana”, a realização de eleições para que fique tudo na mesma, com o bónus de ver mais um regime golpista aderir à Letra de uma Nova Constituição aprovada no passado dia de Natal. Se tudo correr por esta via, o 6 de maio será de eleições, com o actual PRi a concorrer para se legitimar enquanto PRe. Bon Courage Tchad!

www.maghreb-machrek.pt (em reparação)

QOSHE - O Chade - Raúl M. Braga Pires
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O Chade

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08.03.2024

O Chade atinge actualmente vários limites. O primeiro, interno, de 10 de outubro, data limite do período de transição de dois anos, estabelecido pela Junta Militar liderada pelo Major-General e Presidente Interino (PRi), Mahamat Déby Itno, que sucedeu a seu pai, o PR eleito (PRe) Idriss Déby (1990-2021), após morte na frente de batalha ainda por explicar cabalmente. O filho cavalgou abril desse ano com a influência que detinha e detém, junto das fileiras e em poucas horas instalou-se no trono, ainda quente. Decretou um período de transição de 18 meses, que em pouco tempo passou para 2 anos. A Comunidade Internacional, a União Africana, quem conta, “assobiou para o lado”! Porquê?

Em primeiro e também do ponto de vista interno, é importante para a estabilidade regional que o Povo Zaghawa, a etnia predominante no Darfur do norte e nordeste do Chade, mantenha as rédeas, para a manutenção da estrutura social que permita um........

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