A notícia/actualização da semana africana, é a suspensão dos acordos militares entre Níger e Estados Unidos da América (EUA), com efeitos imediatos desde o sábado passado, de acordo com o Coronel Amadou Abdramane, porta-voz da Junta Militar que governa o país, desde o putsch de junho de 2023.

A delegação americana (Molly Phee do Dept. de Estado, Celeste Wallander do Dept. de Defesa e Gen. Michael Langley, Comandante-em-Chefe do AFRICOM) foi aliás tratada durante toda a semana passada, com o desprezo que anunciava a ruptura verificada, ao não serem recebidos pelo General Tchiani, o Chefe da Junta Militar e arquitecto do Golpe. O que é que está em jogo para os americanos?

Em primeiro, o Níger apresenta-se para EUA e Europa enquanto o “entrocamento africano” que permite um desdobramento de vigilância, prevenção e ataque a todos os azimutes geográficos no Sahel. Por isso mesmo, era em Agadez, norte do Níger que os americanos tinham, até sábado passado (já se pode dizer assim), a sua principal base de drones no Continente, a qual muito contribuiu nos últimos anos para a monitorização das movimentações jihadistas, respectivas tendências e modus operandi. A Polícia prende, a tropa combate e a inteligência monitoriza, toma notas, compara comportamentos ao longo do tempo, estabelece padrões que ajudam a perceber a mente destes humanos na “franja da franja do Islão”. Por outro lado, ter um “olho invisível no céu” permite avanço mais seguro e sono tranquilo às patrulhas que vão avançando no terreno sabendo que o caminho está livre, conjuntamente com os necessários períodos de descanso. Esta é uma perda considerável ao nível da eficácia e operacionalidade ocidentais na luta contra o jihadismo e as redes dos tráficos diversos que o alimentam.

Em segundo, trata-se de uma derrota americana/ocidental no braço-de-ferro da nova “bipolaridade tripolar”, confirmada desde o início da guerra na Ucrânia. Expulsar franceses do Sahel, o antigo colonizador, obedece a uma lógica, com lógica! Expulsar americanos do principal activo em informações militares que tinham em África, é a confirmação de que isto já virou, sendo África novamente o palco ideal para estas disputas mais às claras.

Em terceiro e na sequência do “mais às claras”, a aproximação “desta África” à Rússia é inegável. “Mais às escuras”, os americanos suspeitam que o Irão seja um “atrelado russo” e que já tenha estabelecido um acordo secreto (Irão-Níger) para o fornecimento de urânio “aos ayatollahs”.

Em quarto, é possível concluir que África não apresenta vulnerabilidades face à Rússia, apresentando antes oportunidades para os chamados BRICS. Os avanços de Rússia e China no Continente que têm centrado as atenções dos analistas, tratam-se apenas e só da “ponta de um iceberg” mais complexo e multidimensional, cujas rupturas entretanto criadas por russos e chineses têm funcionado enquanto “navios quebra-gelo” que vão abrindo caminho aos “menos poderosos” e que entretanto começaram a dar cartas, potenciados pela recente mudança de paradigma internacional.

E, já que mencionámos o Irão, aproveitamos também para desejar Nowruz Mubarak a todos os que celebram por estes dias o Ano Novo Persa, que se inicia a cada Primavera!

www.maghreb-machrek.pt (em reparação)

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Níger: Não é a Rússia, são os BRICS!

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24.03.2024

A notícia/actualização da semana africana, é a suspensão dos acordos militares entre Níger e Estados Unidos da América (EUA), com efeitos imediatos desde o sábado passado, de acordo com o Coronel Amadou Abdramane, porta-voz da Junta Militar que governa o país, desde o putsch de junho de 2023.

A delegação americana (Molly Phee do Dept. de Estado, Celeste Wallander do Dept. de Defesa e Gen. Michael Langley, Comandante-em-Chefe do AFRICOM) foi aliás tratada durante toda a semana passada, com o desprezo que anunciava a ruptura verificada, ao não serem recebidos pelo General Tchiani, o Chefe da Junta Militar e arquitecto do Golpe. O que é que está em jogo para os americanos?

Em primeiro, o Níger apresenta-se para EUA e Europa enquanto o “entrocamento africano” que permite um desdobramento de vigilância, prevenção e........

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