Geralmente referidos enquanto Acordos de Camp David, foi esta A Letra que em setembro de 1978 estabeleceu a paz entre Egipto e Israel. São exactamente estes os Acordos que o Egipto ameaça agora denunciar, caso Israel concretize a vontade manifestada de “encostar Rafah às cordas”, única forma de aniquilar quatro resistentes batalhões do Hamas, aparentemente os últimos. Na óptica de Israel, o imperativo desta investida deriva da necessidade de não deixar o trabalho a meio. Só com um “avanço arrastão” conseguirão obliterar o Hamas do mapa. Não é esse o problema, em comunicado oficial a diplomacia egípcia afirma “não nos opomos aos planos israelitas de atacarem os quatro batalhões do Hamas sitos em Rafah, mas as nossas linhas vermelhas são claras: que não haja massacre (civis) e que não implique um afluxo de refugiados para o Sinai”. O problema são os civis e o bloqueio que tal investida provocará no único acesso de aprovisionamentos, víveres e medicamentos, sendo também a partir daí a única estrada para distribuição dos mesmos.

E se Israel “invadir” e o Egipto “romper”? Consequências:

Primeiro, os Acordos de Camp David remontam ao tempo do “xadrez a preto e branco”, numa bipolaridade que se resumia a “zeros e a uns”! É também o tempo, após duas guerras com Israel, cujo placard internacional regista “um empate a uma guerra”! Após a “tempestade veio a bonança” e este também foi o tempo de perceber que nem Israel, nem os palestinianos iriam deixar de existir e perante tal, foi o tempo em que quem estendesse a mão primeiro, ganhava! É esta a simbólica que Camp David representa e é isto que se perde se estes Acordos forem denunciados, já que representam um momento de clarividência de ambas as partes, que estenderam a mão direita em simultâneo;

Segundo e reforçando o simbolismo já identificado, o Egipto foi o primeiro país árabe a reconhecer o direito à existência de Israel, estabelecendo com este a paz. Custou-lhe a animosidade da Ummah, a Nação Islâmica, e a vida do Presidente Anwar Sadat (1918-1981), mas alguém tinha que ser o primeiro e o Egipto não pode deixar cair esta tocha que lhe confere responsabilidade e legitimidade. O quase reconhecimento saudita de Israel, através da quase adesão da Arábia aos Acordos de Abraão em 2023, teve início em 1978! O papel do Egipto, ao ser esse “primeiro árabe”, foi de “contaminador/normalizador” da ideia/facto, com os restantes parceiros com quem partilha religião, língua, cultura e algum ascendente também;

Terceiro, romper os Acordos de Camp David é acabar com os Acordos de Abraão, objectivo último do Hamas, razão aliás do timing do sete de outubro para o ataque do grupo terrorista;

Quarto, ambos, Egipto e Israel, têm como principal aliado os Estados Unidos da América, pelo que romper com Israel será um claro tiro no pé;

Quinto, a gravidade e repercussões de tal iniciativa seriam tais, que o Ministro Sameh Choukri, dos Negócios Estrangeiros, já veio efectuar a necessária correcção de tiro, dizendo que “exclui colocar em causa o acordo de paz com Israel”;

Sexto, caso este evitável se torne in, teremos um prazo de validade de Camp David a bater nos 50 anos, da mesmo forma que a guerra na Síria e o Estado Islâmico decretaram em 100 a validade do Acordo de Sykes-Picot!

www.maghreb-machrek.pt (em reparação)

QOSHE - De Camp David a Abraão - Consequências de uma ameaça egípcia! - Raúl M. Braga Pires
menu_open
Columnists Actual . Favourites . Archive
We use cookies to provide some features and experiences in QOSHE

More information  .  Close
Aa Aa Aa
- A +

De Camp David a Abraão - Consequências de uma ameaça egípcia!

10 0
16.02.2024

Geralmente referidos enquanto Acordos de Camp David, foi esta A Letra que em setembro de 1978 estabeleceu a paz entre Egipto e Israel. São exactamente estes os Acordos que o Egipto ameaça agora denunciar, caso Israel concretize a vontade manifestada de “encostar Rafah às cordas”, única forma de aniquilar quatro resistentes batalhões do Hamas, aparentemente os últimos. Na óptica de Israel, o imperativo desta investida deriva da necessidade de não deixar o trabalho a meio. Só com um “avanço arrastão” conseguirão obliterar o Hamas do mapa. Não é esse o problema, em comunicado oficial a diplomacia egípcia afirma “não nos opomos aos planos israelitas de atacarem os quatro batalhões do Hamas sitos em Rafah, mas as nossas linhas vermelhas são claras: que não haja massacre (civis) e que não implique um afluxo de refugiados para o........

© Diário de Notícias


Get it on Google Play