A Arábia Saudita tem dado provas claras de não querer perder o comboio do pós-guerra, sabendo que é parte envolvida na actual guerra por Gaza. Por isso mesmo tem pautado as suas acções sem escalar a linguagem e as atitudes, optando por diplomacia e acções de voluntarismo discreto, como o abate de um míssil disparado do Iémen, com alvo em Israel, no último dia de outubro.

Esta postura tem permitido à Arábia Saudita assumir-se como um parceiro credível para uma resolução futura, para a Questão Palestiniana, que inevitavelmente já está à mesa das negociações. De momento, ambas as partes projectam o que querem/devem negociar. Importante é este período, este contexto, não criar párias que se tornem mobilizadores dos "órfãos políticos do Islão", os radicais, os fundamentalistas, aqueles que os moderados rejeitam sempre dizendo, "isto não é Islão, não é nada"!

Por isso mesmo a Arábia Saudita tomou a iniciativa de organizar uma conferência do "arco islâmico" (da Mauritânia à Indonésia), com o apoio e mobilização da Organização para a Cooperação Islâmica e a Liga Árabe. Chefes-de-Estado e Chefes-de-Governo do "arco" reuniram-se em Riade no passado fim-de-semana, para exigirem o possível de momento, em vez de engrossarem as vozes com ameaças, que no contexto actual e, conhecendo estes "muçulmanos com poder de ginjeira", rapidamente se poderia cair numa competição interna sobre quem fazia a ameaça mais criativa, sobre quem colocaria mais os dentes de fora!

E, exigir o possível, é "exigir" o fim dos bombardeamentos a Gaza e a organização de uma Conferência Internacional pela Paz, que resolva politicamente esta querela com mais de meio-século. Esta Iniciativa Árabe (e islâmica) para a Paz, apresenta também uma "escadinha com degraus políticos, legais e humanitários" bem definidos e a cumprir. A saber, terminar o cerco a Gaza com garantia de entrada de comboios humanitários árabes, islâmicos e internacionais, com a ajuda necessária a cada momento específico. Apoio directo ao esforço e à pressão egípcia para se tornar no principal e permanente fornecedor de ajuda à população do "mini-rectângulo". Também se apela às organizações internacionais que participem neste processo e ao Conselho de Segurança das Nações Unidas que adopte uma Resolução que condene a destruição, deslocalização das populações e a falta de protecção a serviços e necessidades básicas das mesmas. Garantido isto, estarão reunidas as condições para o cessar-fogo e para a tal Conferência Internacional, que finalmente discuta a condição palestiniana e as intransigências israelitas e como, a partir deste "nariz com nariz" se poderá chegar a um consenso que permita um sono mais tranquilo a ambas as partes.

Esta iniciativa demonstrou ser diferente das anteriores, já que também apresentou soluções como a activação da Rede Financeira de Segurança Árabe e Islâmica, que prestará apoio económico, financeiro e humanitário ao futuro Governo da Palestina, ainda por definir.

A conclusão a tirar desta reunião do passado fim-de-semana, é o facto da Arábia Saudita dar provas de ver um futuro colaborante com Israel, enquanto mal menor para a estabilização regional. Por outro lado, esta postura poderá trazer ganhos para os palestinianos, aquando das futuras negociações. Os Acordos de Abraão não estão perdidos, havendo sinais de que a sua continuidade será uma solução possível, com as potências do Médio Oriente, à excepção do Irão (melhor forma de o isolar a este nível) aliadas com Israel contra "terrorismos menores" que não podem inquinar um objectivo maior, o direito à vida de palestinianos e israelitas e o direito ao sono tranquilo do Suez ao Eufrates!

Politólogo/arabista www.maghreb-machrek.pt

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Abraão "está vivo, aos pontapés e passou o fim-de-semana em Ríade"!

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17.11.2023

A Arábia Saudita tem dado provas claras de não querer perder o comboio do pós-guerra, sabendo que é parte envolvida na actual guerra por Gaza. Por isso mesmo tem pautado as suas acções sem escalar a linguagem e as atitudes, optando por diplomacia e acções de voluntarismo discreto, como o abate de um míssil disparado do Iémen, com alvo em Israel, no último dia de outubro.

Esta postura tem permitido à Arábia Saudita assumir-se como um parceiro credível para uma resolução futura, para a Questão Palestiniana, que inevitavelmente já está à mesa das negociações. De momento, ambas as partes projectam o que querem/devem negociar. Importante é este período, este contexto, não criar párias que se tornem mobilizadores dos "órfãos políticos do Islão", os radicais, os fundamentalistas, aqueles que os moderados rejeitam sempre dizendo, "isto não é Islão, não é nada"!

Por isso mesmo a Arábia Saudita tomou a iniciativa de organizar uma conferência do "arco islâmico" (da Mauritânia à Indonésia), com o apoio e........

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