"Uma rainha para os dinamarqueses” noticiava o Diário de Notícias a 15 de janeiro de 1972, acrescentando na primeira página “Morreu o rei Frederico IX. Sua filha mais velha, a princesa Margarida, sucede-lhe no trono”. Passados 52 anos exatos, a Rainha Margarida II entregava o testemunho ao filho, o agora rei Frederico X, depois de surpreender os súbditos ao anunciar na sua Mensagem de Ano Novo a intenção de abdicar.

Ao fazê-lo, aos 82 anos, Margarida estava apenas a seguir os passos de vários outros monarcas europeus - em 2013 Beatriz entregou a coroa dos Países Baixos a Guilherme-Alexandre, seguida pouco depois por Alberto II, com Filipe a suceder-lhe como rei dos Belgas. No ano seguinte seria Juan Carlos de Espanha a abdicar a favor do filho, agora Felipe VI.

Mas com a saída de cena de Margarida II o mundo não ganhou só um rei mais jovem - aos 55 anos Frederico encarna na perfeição a ideia de um monarca do século XXI, com o seu passado boémio, o gosto pelo desporto e uma mulher australiana, que conheceu nos Jogos Olímpicos de 2000 - como perdeu a sua última rainha reinante. Com a abdicação de Beatriz, a morte no ano passado de Isabel II de Inglaterra - sucedida por Carlos III - e, agora, a retirada de Margarida, todas as casas reais europeias passam a ser lideradas por homens.

Um cenário que pode, no entanto, mudar em breve. Sobretudo se Carlos XVI Gustavo, da Suécia, seguir os passos da prima dinamarquesa e abdicar a favor da filha, a princesa Victoria. O próprio não mostrou qualquer intenção de o fazer até agora, tendo mesmo, há um ano, criticado a abolição da lei sálica, em 1980, que retirou ao filho Carl Philip o direito ao trono a favor da irmã mais velha. A verdade é que aos 77 anos, e com mais de meio século no trono, são muitos os que acreditam que Carlos XV Gustavo passe o testemunho em breve a Victoria, com a princesa de 46 anos a garantir a sucessão da Casa de Bernadotte. Sendo ela própria um dia sucedida pela filha, Estelle Silvia.

Um exemplo de respeito pela lei sálica é o Japão, onde a ausência de herdeiros homens - o imperador Naruhito só tem uma filha, a princesa Aiko - coloca o seu irmão, o príncipe Akishino, como primeiro na linha de sucessão, seguido do seu filho e sobrinho do imperador, Hisahito. A discriminação das mulheres na família real não terá, com certeza, sido alheia ao facto de muitos elementos femininos terem decidido renunciar aos cargos para se casarem com plebeus, fazendo mesmo temer pelo futuro da monarquia japonesa.

Voltando à Europa, se a saída de cena de Carlos XVI Gustavo - bem como a de Harald V da Noruega, cujos problemas de saúde e os seus 86 anos têm gerado cada vez mais rumores sobre uma possível abdicação a favor do filho, Haakon - pode acontecer em breve, voltando a colocar uma rainha num trono europeu, a verdade é que na geração seguinte, as casas reais do Velho Continente ficarão nas mãos de uma nova geração de rainhas.

A começar por Espanha, onde Filipe VI será sucedido por Leonor, a filha mais velha. No caso do nosso vizinho ibérico, a lei sálica mantém-se em vigor, mas o monarca apenas tem duas filhas, garantindo que terá uma rainha pela primeira vez desde Isabel II no século XIX. Nos Países Baixos, depois de um interregno masculino, as mulheres voltarão ao trono (entre 1890 e 2013 o país teve uma sucessão de três rainhas), com Catarina Amália a suceder, um dia, a Guilherme-Alexandre. O mesmo sucederá na vizinha Bélgica, onde Filipe será sucedido pela filha Isabel, que se tornará na primeira rainha dos Belgas.

Herança da Idade Média, a lei sálica continua a vigorar em vários países europeus, numa clara discriminação em relação às mulheres que pouco se coaduna com os tempos que vivemos. Mas houve quem percebesse a necessidade de adequar aos tempos modernos uma instituição tão antiga e tradicional como a monarquia. O exemplo partiu da Suécia, que logo em 1980 mudou a lei para fazer da princesa nascida dois anos antes a herdeira do pai, apesar de já ter um irmão na altura. Também o Reino Unido decidiu em 2013 tornar a monarquia mais igualitária, bem como a Bélgica, Dinamarca, Luxemburgo, Noruega e Países Baixos.

Com idades entre os 18 e os 22 anos, Leonor de Espanha, Catarina Amália dos Países Baixos e Isabel da Bélgica estão todas a ser preparadas para reinar desde o dia em que nasceram. E do pouco que se tem ouvido delas, todas parecem partilhar um desejo: servir os seus países da melhor forma. Já agora com um real toque feminino.

Editora executiva do Diário de Notícias

QOSHE - Já não há rainhas, vivam as futuras rainhas! - Helena Tecedeiro
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Já não há rainhas, vivam as futuras rainhas!

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27.01.2024

"Uma rainha para os dinamarqueses” noticiava o Diário de Notícias a 15 de janeiro de 1972, acrescentando na primeira página “Morreu o rei Frederico IX. Sua filha mais velha, a princesa Margarida, sucede-lhe no trono”. Passados 52 anos exatos, a Rainha Margarida II entregava o testemunho ao filho, o agora rei Frederico X, depois de surpreender os súbditos ao anunciar na sua Mensagem de Ano Novo a intenção de abdicar.

Ao fazê-lo, aos 82 anos, Margarida estava apenas a seguir os passos de vários outros monarcas europeus - em 2013 Beatriz entregou a coroa dos Países Baixos a Guilherme-Alexandre, seguida pouco depois por Alberto II, com Filipe a suceder-lhe como rei dos Belgas. No ano seguinte seria Juan Carlos de Espanha a abdicar a favor do filho, agora Felipe VI.

Mas com a saída de cena de Margarida II o mundo não ganhou só um rei mais jovem - aos 55 anos Frederico encarna na perfeição a ideia de um monarca do século XXI, com o seu passado boémio, o gosto pelo desporto e uma mulher australiana, que conheceu nos Jogos Olímpicos de 2000 - como perdeu a sua última rainha reinante. Com a abdicação de Beatriz, a........

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