Na próxima sexta-feira assinala-se o Dia Internacional da Mulher.
Parece-me um bom pretexto para abordar a presença feminina na Universidade de Coimbra (UC).
De acordo com números publicados num jornal em 1885, nessa altura a UC tinha apenas cerca de mil estudantes matriculados, e entre eles nenhuma mulher.
Neste momento, 139 anos volvidos, a UC tem mais de 28 mil alunos e bem mais de metade deles (exactamente 16 244 ) são do sexo feminino.
Para se chegar até aqui, o percurso foi difícil.
Só em 1891 se matriculou a primeira mulher na UC. Chamava-se Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho, tinha 20 anos (nascera no concelho da Feira em 1871 ). Matriculou-se no Curso de Matemática, que concluiu em 1894. Viria ainda a concluir as licenciaturas em Filosofia (em 1895 ) e em Medicina (em 1904 ). Entre 1891 e 1896, Domitila foi a única aluna da Universidade de Coimbra. Só a partir do ano letivo de 1896-1897 passaria a contar com algumas (poucas) colegas.
(Viria a ser Reitora, em Lisboa, do primeiro liceu feminino português – o Liceu Maria Pia, posteriormente designado por Liceu Maria Amália Vaz de Carvalho. Exerceu também Medicina).
Mas se o acesso não foi fácil para as alunas, para as professoras foi ainda mais difícil e mais tardio.
A primeira docente da Universidade de Coimbra, e também do ensino universitário português, só foi nomeada em 1911 (um ano depois da implantação da República), por António José de Almeida, então Ministro da Instrução Pública (antigo estudante da UC e que viria a ser Presidente da República). Essa pioneira foi Carolina Michaelis de Vasconcelos, de nacionalidade alemã e também portuguesa, pelo casamento. Em Dezembro de 1911, quando tinha já 60 anos, foi festivamente acolhida na Sala dos Capelos da UC como a primeira professora universitária em Portugal, ficando a leccionar na recém-criada Faculdade de Letras. Para além do seu prestígio como docente de Língua e Literatura Alemã, distinguiu-se pelas posições de apoio à emancipação da mulher.
Actualmente, não é apenas no sector estudantil que as mulheres estão já em maioria na UC. Também no pessoal técnico elas dominam, com 945 elementos, enquanto os homens são 426. Igualmente há mais investigadoras ( 154 ) do que investigadores ( 138 ).
No corpo docente é que elas continuam (por enquanto…), em minoria: são 850, e os homens ascendem a 1037.
Com estes dados estatísticos não pretendo simular uma competição de género, mas apenas mostrar que na Universidade (e não só na de Coimbra), como em quase todos os outros sectores de actividade, as mulheres têm vindo a conquistar, por mérito próprio, um papel cada vez mais relevante.
Numa altura em que se assinalam os 50 anos da Revolução de Abril de 1974, é justo destacar que a Democracia veio conceder à Mulher portuguesa direitos essenciais, que antes lhe eram negados. Só para citar alguns exemplos: as mulheres estavam impedidas de aceder a diversas profissões, como as forças armadas, as polícias, a magistratura, a diplomacia. Mesmo quando desempenhavam funções iguais às dos homens, o respectivo salário era substancialmente mais reduzido. Em algumas profissões, como as de enfermeira e hospedeira do ar, havia limitações ao casamento. Se fossem casadas, tinham de ter autorização do marido para o exercício de certas actividades (como o comércio), bem como para se deslocarem para fora do País. As mães solteiras não tinham protecção legal. As mulheres (e os homens) que tivessem contraído matrimónio pela igreja, não podiam divorciar-se.
A realidade de hoje é muito diversa, embora haja ainda situações em que não se verifica uma verdadeira igualdade de oportunidades para mulheres e homens. Esperemos que as novas gerações consigam eliminar essa injustiça.
A título pessoal, e em nome da AAEC – Associação dos Antigos Estudantes de Coimbra (cuja Direcção é maioritariamente feminina), a minha homenagem a todas as Mulheres.

QOSHE - A mulher e a universidade - Jorge Castilho
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A mulher e a universidade

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06.03.2024

Na próxima sexta-feira assinala-se o Dia Internacional da Mulher.
Parece-me um bom pretexto para abordar a presença feminina na Universidade de Coimbra (UC).
De acordo com números publicados num jornal em 1885, nessa altura a UC tinha apenas cerca de mil estudantes matriculados, e entre eles nenhuma mulher.
Neste momento, 139 anos volvidos, a UC tem mais de 28 mil alunos e bem mais de metade deles (exactamente 16 244 ) são do sexo feminino.
Para se chegar até aqui, o percurso foi difícil.
Só em 1891 se matriculou a primeira mulher na UC. Chamava-se Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho, tinha 20 anos (nascera no concelho da Feira em 1871 ). Matriculou-se no Curso de Matemática, que concluiu em 1894. Viria ainda a concluir as licenciaturas em Filosofia (em 1895 ) e em Medicina (em 1904 ). Entre 1891 e 1896, Domitila foi a única aluna da Universidade de Coimbra. Só a partir do ano letivo de 1896-1897 passaria a contar com algumas (poucas) colegas.
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