No dia em que esta crónica é publicada, começa um período de espera e de ansiedade até se receber um contacto do veículo robótico (não tripulado) que aterrou na Lua no mês passado. Sem mais informação, esta poderia ser a descrição de uma missão soviética - a Luna 9 - que ocorreu em 1966, há mais de 58 anos. Contudo, e apesar de mais de meio século volvido, esta missão mais recente à Lua não deixa de ser igualmente fascinante e, acima de tudo, um exemplo de inovação.
Mais de cinco décadas depois da última presença humana na Lua, em 1972, a NASA e a empresa Intuitive Machines, com sede em Houston, lançaram um veículo robótico de aterragem lunar com caraterísticas únicas. O veículo, designado Odysseus (ou Ulisses em português), aterrou no passado dia 22 de fevereiro na Lua, marcando a primeira aterragem lunar (ou alunagem) dos Estados Unidos em mais de 50 anos desde a missão Apollo 17.
Os funcionários da empresa e da NASA, em conferência de imprensa depois da aterragem, confirmaram que todos os instrumentos do Odysseus estavam a transmitir dados, levando-os a declarar que a missão tinha sido bem-sucedida, apesar dos contratempos ocorridos durante a descida do veículo até à superfície lunar, onde aterrou muito próximo do polo sul lunar.

O Odysseus teve problemas de navegação nos momentos que antecederam a sua aterragem. Ao pousar na Lua, ficou posicionado numa cratera lunar, tendo “tropeçado” na superfície irregular, o que o deixou inclinado lateralmente, comprome- endo uma parte das suas antenas e mecanismos de transmissão de dados. Depois de alguma incerteza sobre o estado dos instrumentos do veículo, foi finalmente anunciado que o Odysseus tinha superado todas as dificuldades e estava a enviar dados de todos os seis instrumentos que a NASA tinha colocado a bordo, assim como de outros instrumentos de empresas privadas.
A escolha do local de aterragem também foi um aspeto importante da missão já que muito ainda se desconhece sobre o polo sul da Lua. A NASA e outras instituições estão muito interessadas nesta área da Lua, porque acreditam que pode abrigar reservas de gelo, um recurso crítico que poderia fornecer água potável para os astronautas ou até mesmo combustível em missões futuras à Lua.

Apesar de tudo, esta missão foi inovadora por vários outros motivos. Por exemplo, porque foi a primeira vez que uma empresa privada conseguiu ser a fornecedora do serviço de transporte de carga útil até à Lua, tendo como sua principal cliente a (gigante) NASA.
Mas também porque permitiu aterrar o Odysseus num ponto mais a sul que qualquer outro veículo que já tenha aterrado na Lua. Isso é um passo importante na exploração lunar, sobretudo tendo em conta que o programa Artemis da NASA, que pretende fazer esta viagem com tripulação até estas localizações, tem um orçamento de 93 mil milhões de dólares, valor que, por referência, corresponderá a aproximadamente 40% do PIB anual de Portugal.

Após quase 150 horas de funcionamento, o Odysseus - também carinhosamente designado por “Odie” - entrou em modo de espera, ou seja, perdeu a sua energia e não foi possível recarregá-la já que o local de aterragem entrou na designada noite lunar, uma situação que é sempre agressiva para os veículos e instrumentos na medida que se registam temperaturas extremamente baixas. Durante a noite lunar, quando a superfície é iluminada apenas pelo reflexo da luz da Terra, as temperaturas podem descer até aos -180 ºC. Algumas localizações na lua têm noites mais curtas, mas outros locais, como nos polos, as noites são muito longas e inúmeras missões robóticas anteriores pereceram durante a exposição ao período noturno e frio prolongado.

As missões tripuladas no programa Apollo, entre 1969 e 1972, permaneceram na superfície apenas alguns dias de cada vez e todas elas durante o início da chamada “manhã lunar”. Contudo, os futuros colonos da Lua terão de viver tanto de dia como de noite, sabendo de antemão que a vital energia solar poderá estar indisponível durante os 14 dias da noite lunar.
Depois de cerca de três semanas em modo de espera, é grande agora a expetativa de poder ver o “Odie” acordar de novo e nos voltar a dar um bom dia a partir da Lua, a mais de 384 000 quilómetros de distância.

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“À espera de notícias... da Lua!”

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25.03.2024

No dia em que esta crónica é publicada, começa um período de espera e de ansiedade até se receber um contacto do veículo robótico (não tripulado) que aterrou na Lua no mês passado. Sem mais informação, esta poderia ser a descrição de uma missão soviética - a Luna 9 - que ocorreu em 1966, há mais de 58 anos. Contudo, e apesar de mais de meio século volvido, esta missão mais recente à Lua não deixa de ser igualmente fascinante e, acima de tudo, um exemplo de inovação.
Mais de cinco décadas depois da última presença humana na Lua, em 1972, a NASA e a empresa Intuitive Machines, com sede em Houston, lançaram um veículo robótico de aterragem lunar com caraterísticas únicas. O veículo, designado Odysseus (ou Ulisses em português), aterrou no passado dia 22 de fevereiro na Lua, marcando a primeira aterragem lunar (ou alunagem) dos Estados Unidos em mais de 50 anos desde a missão Apollo 17.
Os funcionários da empresa e da NASA, em conferência de imprensa depois da aterragem, confirmaram que todos os instrumentos do Odysseus estavam a transmitir dados, levando-os a declarar que a missão tinha sido bem-sucedida, apesar dos........

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