Impressionante atitude num direto televisivo mostrou bem como Diogo Ribeiro encara qualquer desafio sob pressão. Cria a sua forma de o vencer

Vi o Diogo Ribeiro no programa do Ricardo Araújo Pereira e confesso que muito me impressionou pela invulgaridade da atitude. Numa palavra: desarmante. Um daqueles entrevistados que um jornalista deve saber temer. Por muito preparado e experiente que seja o entrevistador, é difícil ler-lhe as emoções e encontrar o caminho certo para tirar o máximo partido do seu pensamento, que, aliás, parece guardado no fundo, muito fundo, da sua personalidade.

Confesso que sempre me apaixonou a relação entre cada ser humano e a sua forma de comunicar. Ao longo da minha vida profissional, acho que encontrei pelo caminho todas as variáveis possíveis e aprendi a perceber que no género jornalístico da entrevista, que vai muito para além de se saber fazer perguntas, é preciso que o entrevistador saiba com quem está a falar, perceba o homem ou a mulher que está diante de si, sabendo neutralizar-se, reduzindo ao mínimo a influência que possa exercer sobre os menos esclarecidos ou os menos fortes psicologicamente, e procurando evidenciar o caráter da personagem que deseja expor ao público na maior dimensão possível da sua verdade.

Percebeu-se, no início, uma certa intimidação do Diogo perante a força comunicacional do Ricardo Araújo Pereira e perante o desconforto de um direto televisivo. Mas tornou-se particularmente significativo a forma como o jovem campeão do Mundo se defendeu do universo estranho em que o colocaram, falando pouco, mostrando-se esfíngico na reação a qualquer piada e deixando sorrisos mais enigmáticos que o de Gioconda.

Parece haver, de facto, uma natureza diferente neste jovem quando se confronta com a pressão. Não se desvia do que é ou do que quer ser naquele momento. Enfrenta o desafio com uma serena determinação e nunca parece perder o domínio das suas capacidades.

É, isto, um campeão. Alguém que tem um dom natural, um talento treinado até à exaustão, mas também alguém que é psicologicamente forte e dominador de espaços. Alguém que, por isso, e como diria Fernando Pessoa, se aproxima mais de um herói do que de um santo e, assim, é mais amado por Deus.

Diogo Ribeiro tem apenas 19 anos e um mundo inteiro à sua espera. Lembro-me, quando ele era ainda júnior, de ter tido conhecimento das suas primeiras grandes marcas internacionais. Confesso que, nessa altura, não me entusiasmei demasiado. Havia, na minha memória, demasiados casos de jovens promessas da natação portuguesa que, com os anos, começaram a nadar pior e nunca atingiram, nem de perto, as esperanças precocemente anunciadas. Havia, mesmo, quem acusasse os treinadores portugueses de obrigarem jovens ainda em formação a treinarem demais. Também me lembro de ter admitido que o Diogo só poderia evoluir para uma dimensão mundial se fosse acolhido numa boa universidade americana e que, em Portugal, nunca teria as condições necessárias a um campeão da Europa, muito menos do Mundo. Enganei-me e é justo dizê-lo aqui, com a humidade de quem, pelo menos conscientemente, nunca se comportou como um iluminado.

A verdade é que este jovem campeão do Mundo não pára de me surpreender. Desde as suas finais em que, a meio da última piscina, parecia atrasar-se e acabava por galgar metros e metros aos adversários principais, até à atitude de uma inacessibilidade mental que conseguiu fabricar para seu conforto no programa televisivo e passando pela superação das condições espartanas em que vive nas modestas residências do Centro de Alto Rendimento do Jamor.

QOSHE - Diogo: a personalidade de um campeão - Vitor Serpa
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Diogo: a personalidade de um campeão

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24.02.2024

Impressionante atitude num direto televisivo mostrou bem como Diogo Ribeiro encara qualquer desafio sob pressão. Cria a sua forma de o vencer

Vi o Diogo Ribeiro no programa do Ricardo Araújo Pereira e confesso que muito me impressionou pela invulgaridade da atitude. Numa palavra: desarmante. Um daqueles entrevistados que um jornalista deve saber temer. Por muito preparado e experiente que seja o entrevistador, é difícil ler-lhe as emoções e encontrar o caminho certo para tirar o máximo partido do seu pensamento, que, aliás, parece guardado no fundo, muito fundo, da sua personalidade.

Confesso que sempre me apaixonou a relação entre cada ser humano e a sua forma de comunicar. Ao longo da minha vida profissional, acho que encontrei pelo caminho todas as variáveis possíveis e aprendi a perceber que no género jornalístico da entrevista, que vai muito para além de se saber fazer perguntas, é........

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