'Mulher precisa ter compostura', dizia minha avó quando eu bebia
Um dos momentos mais delicados na minha recuperação foi a morte da minha avó. Ela foi meu chão durante muito tempo. Convivi 39 anos da minha vida com ela —quando adulta, quase sempre bêbada. Nunca conversamos abertamente sobre a gravidade a que chegou meu problema com o alcoolismo, mas tenho certeza de que, no fundo, ela sabia. Impossível não notar minhas ausências (quando eu ficava internada), minhas tristezas (quando eu recaía), meu cheiro (quando eu bebia sem parar) e minha solidão absurda (quando cheguei no fundo do poço).
Ela era uma figura muito importante na família e tínhamos uma conexão muito forte. A ponto de quase todas as vezes que eu me metia numa grande encrenca por causa do álcool, o telefone tocar e ela dizer: "Alice, tava pensando em você!". Era de arrepiar. Morei com ela em algum momento, quando não tinha mais para onde ir.
Era tanta parceria que se acontecesse alguma coisa com ela, fosse o câncer que ela teve já aos 90, fosse uma pneumonia, os meus familiares tentavam esconder de mim com medo da minha reação. Temiam que eu fizesse alguma besteira. Por muitas vezes, de fato era nela que eu encontrava alguma força para acreditar em mim.
Dona T. era doce e dura na mesma medida. Foram inúmeras as vezes que ela me disse: "Homem bêbado é uma desgraça, mulher então, é inadmissível, Alice". Ela gostava de bebida, mas sempre foi de beber pouco. Até os últimos anos de vida, ela não desperdiçava momentos para tomar um chope. Mas era isso. Um chope e só. Eu ficava ali, olhando… Será que ela nunca perdeu as estribeiras?
Minha avó sofreu muito vendo meu pai beber e causar inúmeros desconfortos para a família, e com certeza se tornou uma........
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