As lembranças e algumas revelações trazidas à tona no aniversário de um ano dos lamentáveis atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 reforçaram a compreensão, assustadora, do quão perto estivemos de um golpe de Estado, algo que nos últimos 40 anos julgávamos haver sido extirpado do vocabulário político brasileiro.

Nem as ameaças, nada veladas, feitas ao longo do governo anterior, nos prepararam para a fúria golpista de uma militância de extrema-direita mobilizada por uma avalanche de desinformação e teorias da conspiração compartilhadas – e amplificadas – nas redes sociais.

O terreno foi pavimentado por líderes com pretensões autoritárias e narrativas online cada vez mais sofisticadas e abundantes, que minaram a confiança no sistema eleitoral e atacaram instituições democráticas, em especial, o Judiciário.

O problema não é uma jabuticaba brasileira. Mundo afora a cartilha se repete: populistas se elegem sob um verniz de institucionalidade para, uma vez no poder, adotarem práticas de enfraquecimento do sistema de freios e contrapesos, de silenciamento da oposição e de extermínio de instrumentos de controle à expansão de poder. O próprio ataque ao Capitólio americano em 2021 corrobora o fato de que o fechamento do espaço cívico e as ameaças à democracia são um fenômeno global.

Nesse quesito, 2024 será um ano decisivo. Pela primeira vez na história, mais da metade da população mundial será impactada por eleições nacionais: quase 2 bilhões de pessoas em mais de 70 países irão às urnas.

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Se podemos esperar este ano avanços significativos em tecnologias digitais e verdes, financiamento climático e em outras agendas relevantes, o aprofundamento da polarização política e dos conflitos que se espalham da Europa ao Oriente Médio, chegando às Américas, nos leva a cenários de alto risco para a democracia.

Não é exagero dizer que o progresso global da sociedade depende do que acontece nas urnas, e de se os resultados dos pleitos irão na direção da busca por oportunidades de convergência e cooperação para enfrentar os desafios comuns à humanidade.

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O exemplo mais contundente dessas ameaças potenciais são as eleições presidenciais nos EUA. O ex-presidente Donald Trump, enquanto trava uma batalha na Justiça para definir a sua responsabilidade pelos ataques ao Capitólio, já conseguiu mobilizar seu partido e eleitores, e lidera as pesquisas.

O legado dos ataques golpistas não parece claro nos EUA, mas, no Brasil, a história parece estar sendo escrita com outros contornos. Para além da destruição de patrimônio físico e institucional dos poderes que fundamentam o funcionamento democrático da sociedade brasileira, o 8 de janeiro deixou no rastro duas importantes constatações. A primeira: o Brasil é capaz de defender sua democracia. A segunda é que não basta a eterna vigilância – a defesa do Estado de direito exige alcançarmos sociedades mais justas, inclusivas e sustentáveis.

A sociedade civil tem um papel fundamental para que os governos se mantenham responsáveis, monitorando o cumprimento de suas promessas e cobrando a formulação e implementação de políticas públicas que posicionem o interesse público no centro das prioridades. E as eleições municipais que teremos aqui são um bom começo para trazer no nível local aquilo que gostaríamos de alcançar a nível global.

Em um ano de tantos desafios, o Brasil pode liderar pelo exemplo, construindo e adotando de fato políticas de redução das desigualdades e de combate à tripla crise planetária, traçando estratégias responsáveis para fazer frente aos impactos da transformação digital e erguendo pontes em um mundo multipolar por meio da cooperação, do diálogo e do compromisso com a democracia.

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O 8/1 e a lembrança de que o futuro do planeta depende das urnas

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10.01.2024

As lembranças e algumas revelações trazidas à tona no aniversário de um ano dos lamentáveis atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023 reforçaram a compreensão, assustadora, do quão perto estivemos de um golpe de Estado, algo que nos últimos 40 anos julgávamos haver sido extirpado do vocabulário político brasileiro.

Nem as ameaças, nada veladas, feitas ao longo do governo anterior, nos prepararam para a fúria golpista de uma militância de extrema-direita mobilizada por uma avalanche de desinformação e teorias da conspiração compartilhadas – e amplificadas – nas redes sociais.

O terreno foi pavimentado por líderes com pretensões autoritárias e narrativas online cada vez mais sofisticadas e abundantes, que minaram a confiança no sistema eleitoral e atacaram instituições democráticas, em especial, o Judiciário.

O problema não é uma jabuticaba brasileira. Mundo afora a cartilha se repete: populistas se elegem sob um verniz de institucionalidade para, uma vez no poder, adotarem práticas de enfraquecimento do sistema de freios e contrapesos, de silenciamento da oposição e de extermínio de instrumentos de controle à expansão de poder. O próprio ataque ao Capitólio americano em 2021 corrobora o fato de que o fechamento do espaço........

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