O muro da Cohab e as notas de repúdio
No domingo, 4 de agosto, fazendeiros de Mato Grosso do Sul atacaram mais uma vez indígenas do povo Guarani-Kaiowá, deixando dez feridos, dois deles gravemente, um com tiro na cabeça e outro atingindo no pescoço. “Ministério repudia”, diz a matéria publicada no caderno Cotidiano da Folha de S.Paulo na segunda-feira.
A mesma aldeia já tinha sido atacada dois dias antes. E outros povos indígenas têm sido atacados violentamente, muitas pessoas são mortas. Ao ver a matéria da Folha, tive uma sensação desgraçada: a violência contra indígenas, posseiros e sem-terra está tão comum que nem é noticiada no caderno principal, vai para o Cotidiano. Parece que virou cotidiano mesmo.
E lá vem nota de repúdio. Toda vez que isso acontece, há organismos e pessoas lançando notas de repúdio.
Aí me lembrei de uma história antiga, sem um milésimo da gravidade da ação de grileiros, garimpeiros e outros que se dizem “pessoas de bem”.
O que vou contar parece não ter nada a ver com essas agressões atuais, e não tem mesmo, mas me faz pensar na falta de ação “do lado de cá”, das vítimas, sem justiça, com reações limitadas às famigeradas “notas de repúdio”.
Explico no fim do texto.
Mais ou menos no meio do governo da Erundina, na prefeitura de São Paulo, fui convidado para ser assessor de imprensa da Cohab. Aceitei e, no primeiro dia, logo de manhã, recebi um telefonema do editor de um jornal do bairro de Itaquera. Perguntou:
— Tem alguma novidade sobre o muro da Cohab?
Não sabia que muro era esse, pedi que me ligasse por volta das três horas da tarde que eu lhe daria resposta.
Perguntei aos colegas que história era essa e me contaram. Tinha um conjunto habitacional construído anos antes no bairro de Itaquera e, como as ruas do bairro quase não tinham movimento de carros, os moradores de um prédio transformaram uma das ruas em estacionamento. Os prédios da Cohab não previam estacionamento, pois achavam que seus moradores nunca teriam carros. Mas vieram a ter. Aos poucos, uns moradores foram comprando fuscas, brasílias, kombis e outros carros, a maioria baratos. Com o tempo, as ruas até tinham movimento de carros, que precisavam desviar daquele pedaço.
Acontece que no início do governo Erundina resolveram asfaltar as ruas do bairro, e naquela rua os asfaltadores deram de cara com um muro que interrompia a rua. O que fazer? Acionaram o Departamento Jurídico da Cohab para derrubar o tal muro. Mas a coisa foi se enrolando, não resolviam nunca. E moradores de outros prédios começaram a........
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