Um outdoor, mas não só
Ao longo das últimas semanas, tenho sido visualmente assediado pelo fúcsia de um outdoor tão sugestivo quanto grotesco, plantado em plena A29, junto à saída para Espinho. Pelo facto de ser este o trajeto que faço para o meu local de trabalho, todos os dias sou confrontado, nestas viagens pendulares, com os dois desmedidos e despudorados elementos anatómicos que preenchem, abundantemente, aquele cartaz publicitário. Já todos vimos, certamente, peles e poses como aquelas algures nos classificados de um jornal, ou numa cabine de um pesado de mercadorias que estacionou na berma, ou ainda na parede da oficina onde vamos substituir os calços da viatura, pelo que não será inusitada a natureza da imagem, mas sim o contexto em que a mesma se nos apresenta.
Todos seremos também capazes de compreender, sem estranheza, o olhar mais ou menos lascivo que, após a demanda, encontra estas imagens, ou o olhar mais ou menos sobressaltado que, fortuitamente, se lhes depara. Contudo, com a inclemente e rotineira imposição da volúpia e da obscenidade, os olhares tendem a tornar-se gradualmente mais complacentes, mais indiferentes e, por conseguinte, menos sagazes. Para os mais novos, que observam tudo ao seu redor com um olhar mais absorvente do que reativo, a exposição constante a imagens progressivamente mais hipersexualizadas acabará, entre outros efeitos nefastos, por condicionar a sua ideia de vergonha, a qual, o filósofo alemão Max Scheler definiu como “schützendes gefühl”, ou seja, um sentimento protetor, e o psicanalista suíço Léon Wurmser como “abwehrhaltung”, uma postura defensiva. Podemos comparar a importância que este sentimento tem no âmbito do desenvolvimento sexual saudável, com a importância que, segundo o professor Manuel Sobrinho Simões, o........
© Observador
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