Justiça
Neste artigo refere-se o “representante sindical” do Ministério Público, que se aliviou, como acontece frequentemente, de opiniões. Da Associação Sindical dos Juízes Portugueses vieram declarações em sentido diferente, num curioso dissídio.
Cabe aqui um ponto prévio: os juízes são órgãos de soberania e as suas decisões são inerentemente soberanas, cabendo-lhes aplicar nos tribunais às pretensões das partes ou aos réus as leis que um dos outros poderes elabora. “Um dos” em tese, porque na prática o Executivo também legisla, teoricamente por delegação da AR, para não falar da legislação importada da UE à sombra dos tratados. O quarto poder serve sobretudo para cortar fitas e exercer uma magistratura de influência – um rei constitucional a prazo certo.
A defesa que têm a parte decaída, os réus ou o MP é o recurso – para outros tribunais. Isto é, no osso, parte importante do Estado de Direito, e uma das suas pedras de toque é a independência e irresponsabilidade dos juízes. Sem ela os fracos não poderiam ter esperança na defesa contra os fortes, os cidadãos contra o Estado e os inocentes contra a justiça popular.
Entre nós a outra magistratura dentro do sistema judicial, a do MP, goza igualmente de prerrogativas semelhantes, embora com limitações – numa salganhada jurídica que já teve contornos diferentes dos actuais.
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Isto significa que uns e outros administram a Justiça em nome do povo. Este é que é o patrão abstracto porque cada magistrado deve apenas obediência à sua consciência jurídica na interpretação das leis que deve aplicar aos factos concretos que tem de investigar ou julgar.
Fazer greve contra o patrão povo não é admissível; e sindicatos alheios a greves são um oxímoro. Daí que a Associação de Juízes nunca se deveria designar como “sindical” e muito menos deveria ser sequer admitida a existência de um Sindicato dos Magistrados do Ministério Público, pelo menos não havendo dependência hierárquica de outros poderes no âmbito da condução dos processos.
Um magistrado sindicalista tem, na minha opinião, um entendimento deficiente do seu papel. E não vejo que a função se enobreça com esta banalização.
Este o ponto prévio. Quanto à notícia, vejamos o que diz Adão Carvalho:
“Temos de compreender que as funções que os tribunais e o Ministério Público exercem têm interferência, claro, na sociedade”.
Claro que têm, mas há interferências e interferências: Quando estamos a falar de crimes duvidosos na sua existência, na sua prova ou na sua qualificação, convém, no mínimo, ponderar as consequências, se estas forem potencialmente a queda de Governos ou outros órgãos eleitos. Não no sentido de criar estatutos de imunidade, mas antes o de garantir que as investigações se revestem do secretismo possível e não causam mais males do que........
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