Os investigadores universitários, o Chega e a História
Foi com uma certa desconfiança que li o artigo da Lusa sobre a interpretação que um investigador universitário oferece do fenómeno “Chega”. O investigador em questão, Muñoz Sanchéz, é historiador, especialista nas relações Alemanha Federal–Portugal–Espanha nos anos 60 e 70. Tem, evidentemente, todo o direito de comentar o tema das direitas radicais ou extremas; e sou, aliás, o primeiro a rejeitar a ideia de que apenas especialistas certificados e doutorados podem pronunciar-se sobre determinados temas. Não sou investigador, e no entanto já publiquei artigos científicos e, sobretudo, inúmeros textos de opinião sobre matérias para as quais não possuo qualquer doutoramento.
Contudo, ao escrever ou debater um tema, convém conhecê-lo com alguma profundidade. Caso contrário, seria sensato recomendar aos “tutólogos” que comentam sobre tudo e nada, que se mantivessem dentro das respectivas áreas de estudo, em vez de se aventurarem por territórios que manifestamente não dominam. No meu caso, não me atreveria a dissertar sobre a influência da RFA na democratização de Portugal e Espanha: sei pouco, ou nada, sobre esse assunto e, para ser sincero, não nutro grande interesse pelo tema. Porém, ler o investigador em questão afirmar coisas sem nexo sobre a suposta “extrema-direita” portuguesa, mais concretamente sobre o Chega, levou-me a redigir este texto. A esquerda aprecia, com manifesto entusiasmo, desconstruir argumentos da direita. Pelo contrário, não aprecia que os seus próprios argumentos sejam desconstruídos, nem que os seus artigos sejam criticados. Consequentemente, é exactamente isso que farei.
Muñoz Sanchéz começa por afirmar que “mais do que o surgimento da extrema-direita em Portugal, é a enorme força com que se produziu a irrupção do Chega que deve fazer soar todos os alarmes”. Comecemos pelo essencial: o Chega não é de extrema-direita. Situa-se antes na direita radical. Não rejeita a democracia; pretende, isso sim, uma democracia mais directa, com a realização de mais referendos e com a redução dos corpos intermédios entre o “chefe” e o povo. Podemos, evidentemente, criticar esta visão — populismo fácil, risco de demagogos dominarem o espaço público —, mas é um facto que, longe de querer abolir a democracia, o Chega defende apenas outro tipo de democracia. Será este modelo “iliberal”, à semelhança do modelo húngaro? Não sabemos: ninguém no Chega publicou livros ou artigos substanciais sobre o assunto (a falta de intelectuais no partido continua a ser um problema).
Afirmar que o Chega é de extrema-direita revela, antes de mais, desconhecimento do que constitui, historicamente, a verdadeira extrema-direita. Esta pretendia abolir a democracia. Tanto a extrema-direita contra-revolucionária, como a extrema-direita conservadora-revolucionária (Konservative Revolution), ou ainda a extrema-direita revolucionária de tipo fascista e/ou nacional-socialista, rejeitaram a democracia. Viam a democracia como um regime burguês liderado por fracos e traidores, que entorpecia as massas e conduzia invariavelmente, segundo Oswald Spengler (inspirado nas teses do grego Políbio), à Oclocracia: a fase final e degenerada da democracia, em que a massa popular, quase sempre irracional, exerce o poder político sem se aperceber de que é manipulada por demagogos que apelam aos seus sentimentos mais baixos (raiva, sentimento de injustiça, inveja, ódio). Nunca li nem ouvi André Ventura declarar que deseja dissolver o Parlamento e instaurar uma Quarta República, com ele à cabeça do Conselho de Ministros. Quanto à frase “era preciso haver três Salazares”, proferida num debate, trata-se de uma tentativa de gerar polémica — nada de novo em “sociedades do espectáculo”, nas quais os políticos necessitam de ocupar permanentemente o espaço mediático (Ventura conhece bem essa regra).
A quem tiver dúvidas sobre o que distingue extrema-direita contra-revolucionária, revolucionária e conservadora-revolucionária, bem como as diferenças entre direita........





















Toi Staff
Penny S. Tee
Sabine Sterk
Gideon Levy
Mark Travers Ph.d
Gilles Touboul
John Nosta
Daniel Orenstein