A criatividade dos territórios, o espaço de lugares e fluxos
"Os lugares são os rostos do nosso habitar sobre a terra. Eles são também palimpsestos, uma delicada e complexa estratificação de rastos, sinais, subversões, de remodelações e destruições, humanas e naturais, nunca são aqueles territórios anódinos que imaginam os projetistas e especuladores".
(Luísa Bonesio, p.472, em Filosofia da Paisagem)
Vivemos um tempo de grandes transições e de impactos severos sobre os territórios e os espaços de lugares que os constituem. A antropologia do espaço está em profunda transformação e o palimpsesto continua em constante remodelação. Na sociedade da informação e do conhecimento prevalece a sobremodernidade, a tecnologia e a velocidade e ganham terreno os espaços de fluxos, os não-lugares e os hiper-lugares, ao mesmo tempo que a desterritorialização prossegue e os lugares mais vulneráveis se esvaziam. Num país como Portugal, em declínio demográfico e com saldo natural negativo, as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto coexistem com o grande país do interior, agora declinado de acordo com as chamadas áreas de baixa densidade (167 concelhos).
Nas palavras do arquiteto Christian Schultz, o espírito do lugar será, cada vez mais, a arte do lugar, (Schultz, 1997), uma arte que o marketing cultural e turístico aproveitará para segmentar, diferenciar e explorar comercialmente. De facto, as metrópoles e as grandes cidades procuram afanosamente na arquitetura, nas grandes obras de arte e na ecologia urbana uma fonte para o mistério e o espírito dos lugares, contra o tédio e a melancolia das grandes urbes verticais. Na verdade, a cidade sobremoderna já está cheia de não-lugares, hiper-lugares e terceiros-lugares construídos a partir de uma dialética intensa entre espaços de fluxos e espaços de lugares. O mais provável é que tenhamos, mesmo, uma situação caótica e uma verdadeira cacofonia ao quotidiano e em vez do mistério e do espírito do lugar teremos, muito provavelmente, a rotina e a melancolia do quotidiano. Este é o paradoxo que preside à vida ao quotidiano nas grandes cidades, entre a banalidade e alienação, de um lado, a liberdade e a reinvenção do quotidiano, de outro. Mas para lá do tédio e da monotonia do espaço de fluxos nas grandes cidades, há, também, e cada vez mais, os espaços de lugares turistificados e uma explosão de eventos espalhados por todo o território, que não só nos aliviam o peso da melancolia
e solidão como exigem que os abordemos com inteligência e criatividade numa perspetiva de multilocalidade e espaços-rede de lugares.
Num contexto de sobremodernidade, tecnologia e velocidade em que prevalecem os dispositivos e as artes digitais, a criatividade dos territórios é uma grande oportunidade, pois permite-nos passar do espírito do lugar ao sítio da internet e deste ao local de destino de visitação Por isso, devemos perguntar, o que temos nós para propor às áreas de baixa densidade que dominam o grande país do interior? Vejamos, então, quatro aspetos relevantes desta viagem pela criatividade dos territórios, do espírito à arte dos lugares. Em primeiro........
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