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Os campos que Abril libertou

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18.04.2024

São da cidade as imagens e os sons da Revolução. É da cidade o povo que saúda a liberdade resgatada ao desterro, nas ruas, nas praças, nas avenidas. É na cidade boquiaberta que comungam os capitães, os soldados, os políticos, os jornalistas, os ativistas, os mirones, na cenografia de prédios e quartéis, comércios e palácios, varandas e arcadas, no meio de carros, motas, camionetas, blindados.

Dos campos vieram os cravos rubros para entupir os fuzis. Dos campos se colhia também a flor da juventude para que fosse matar e morrer no Ultramar. Aos campos foram alguns buscar raízes culturais para reinventar um povo-nação na água lustral da democracia. E as toadas e litanias para refundar a música portuguesa. Dos campos, é certo, ficaram as imagens televisivas das ocupações de herdades, a gesta da reforma agrária. Nos interstícios dos jornais e das filmagens, alguns camponeses, com os seus andrajos e toscas alfaias e os seus rostos talhados pelos elementos. No mais, são da cidade as imagens e os sons, os heróis e os vilões, os pregões e as canções, os discursos e os murais.

Ao contrário de outras revoluções, feitas pelo campesinato, ou em seu nome, a nossa Revolução não teve nos camponeses protagonistas centrais. O isolamento, o analfabetismo e a penúria não eram de molde a engendrar sujeitos políticos. Contudo, há cinquenta anos, nenhum país carecia tanto de uma Revolução como o Portugal rural.

A ditadura mitificava o campo com a sua propaganda telúrica, o seu provincianismo programático.........

© Expresso


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