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O marxismo de William Burghardt Du Bois

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22.06.2024

DU BOIS, W. E. B. (estadunidense-ganense; Great Barrington/Estados Unidos, 1868 – Acra/Gana, 1963).

1 - Vida e práxis política

William Edward Burghardt Du Bois foi filho único de Alfred Alexander Du Bois, barbeiro e trabalhador itinerante, e Mary Silvina Burghardt, dona de casa. Sua família era composta por fazendeiros e trabalhadores afro-estadunidenses da Nova Inglaterra. Seu pai tinha nascido no Haiti e migrado para os Estados Unidos, onde serviu como soldado unionista na Guerra Civil. Da parte materna, a ascendência de Du Bois vinha de uma tradicional família de negros livres, sendo o bisavô Tom, um escravizado africano que obteve a liberdade após Independência estadunidense. A partir dos dois anos de idade, Du Bois foi educado pela mãe e família materna, após o pai deixá-los, mudando-se para Connecticut, onde faleceu pouco depois.

Até os 17 anos, viveu em sua cidade natal, Great Barrington, no interior de Massachussetts, de população majoritariamente branca. A condição do negro na sociedade de classes dos EUA da segunda metade do século XIX aumentou o significado da formação educacional como via de ascensão, o que permitiu a Du Bois experimentar a confirmação precoce de suas habilidades intelectuais, bem como os limites sociais e econômicos que afetariam sua carreira acadêmica. Foi o primeiro estudante negro a concluir o ensino médio na escola preparatória de sua cidade natal, em 1884.

Durante os anos escolares, Du Bois já escrevia artigos para periódicos regionais, como Republican [Republicano] e Globe [Globo]. Aluno destacado, mas sem meios para cobrir as despesas universitárias, recebeu apoio do diretor da escola, que arrecadou doações para custear seu ingresso, em 1885, na Fisk University (Nashville, estado do Tennessee) – instituição surgida no fim da Guerra Civil com a proposta de educar a população negra, recentemente livre da escravidão. Ali, tornou-se editor do Fisk Herald [Arauto de Fisk], dando ênfase às contribuições vanguardistas dos afrodescendentes, além de ministrar cursos para comunidades negras do meio rural.

Os anos vividos no sul do país expuseram ainda mais o jovem estudante às contradições sociais de seu tempo – como o racismo e a pobreza. Em 1888, após graduar-se em Fisk, foi admitido na Harvard University (Cambridge, estado de Massachusetts), reduto educacional da elite do país. Lá, formou-se em Filosofia e História em 1890, defendeu o mestrado em 1891 e foi o primeiro afrodescendente da instituição a obter o doutorado – em História, no ano de 1895, com a tese The suppression of the african slave trade to the United States of America, 1638-1870 [A supressão do tráfico de africanos escravizados para os EUA], publicada no ano seguinte na coleção Harvard Historical Studies Series.

Entre 1892 e 1894, manteve também vínculo formal como aluno do curso de Economia da Universidade de Berlim (Alemanha), após obter uma bolsa de estudos. Apesar de cumprir a maior parte dos requisitos para a titulação, precisou interromper o curso e voltar para os EUA devido à falta de dinheiro. Então, deu aulas de estudos clássicos e línguas modernas por dois anos na Wilberforce University, (Ohio), instituição destinada a estudantes negros. Ali, conheceu a colega Nina Gomer, com quem se casou em 1896 e teve dois filhos.

A formação superior pluri-institucional de Du Bois, assim como seu trabalho docente fora da área em que se especializou, expressam as restrições sociais impostas para um pesquisador vindo de fora dos círculos dominantes da academia; por outro lado, estar fora dos grupos de poder lhe permitiu certo trânsito entre vários campos do conhecimento, predispondo o jovem intelectual à aposta em searas científicas diversas, muitas das quais ainda estavam em seu estágio inicial (caso da Sociologia). Neste percurso, ainda em 1896, ele recebeu o convite para ser professor auxiliar na University of Pennsylvania e para conduzir um estudo sobre o distrito de Seventh Ward na Filadélfia, região habitada majoritariamente por afrodescendentes e imigrantes.

Fazendo uso de métodos quantitativos, Du Bois desenvolveu uma pesquisa que resultou em um trabalho de referência sobre a condição de vida da população negra, publicado com o título The Philadelphia negro [O negro da Filadélfia] (1899) – com que se tornou o pioneiro no uso de abordagem sociológica para a compreensão do “problema negro” no país. Em seus estudos da época, o autor chamava a atenção aos fatores estruturais de ordem socioeconômica e racial que levaram a população negra à miséria após a escravidão. A partir de então, dedicou-se a variados estudos empíricos que abordaram as implicações do racismo na sociedade, destacando o valor das culturas de matriz africana.

Em 1897, assumiu o posto de professor de Sociologia na Atlanta University (Geórgia/EUA), onde permaneceu por 13 anos, dando início ao primeiro dos dois longos períodos em que permaneceu na instituição (o segundo seria entre 1934 e 1944, quando ocupou a chefia do Departamento). Ali, Du Bois organizou o curso de Sociologia e colaborou com a reformulação do currículo acadêmico; o apoio institucional aos seus projetos foi fundamental para se tornar um autor prolífico e promover o estudo das condições sociais das comunidades negras.

Além de sua carreira como docente e de suas pesquisas pioneiras, Du Bois se dedicou também à militância política e ao trabalho editorial. Em 1901, foi convidado por Booker T. Washington (ativista dos direitos civis) para participar do Tuskegee Institute. Contudo, logo percebeu que suas concepções políticas na luta contra o racismo eram divergentes da do líder, cujas ideias para a melhoria da condição de vida dos afro-estadunidenses se baseavam no incentivo à educação para o trabalho técnico, com vistas ao acúmulo gradual de riqueza – o que, para Du Bois, era uma “política acomodacionista”. Segundo ele, apenas uma concessão abrangente de direitos (voto, educação superior e cidadania) poderia garantir alguma ascensão social.

Afastou-se do grupo e, em 1905, organizou o Niagara Movement, com o apoio de William Monroe Trotter e outros desafetos de Washington. O novo coletivo tinha por princípios a defesa dos direitos sociais e civis para a população negra visando sua completa integração à sociedade. A agremiação, porém, teve curta duração (até 1909), devido à falta de recursos e ao acirramento da oposição dos antigos correligionários da Tuskegee.

Assim, em 1909, Du Bois criou o National Negro Committee e, no ano seguinte, a National Association for the Advancement of Colored People (NAACP) – organização com enfoque mais abrangente, multirracial (o que permitia maior possibilidade de financiamento) e com posições nitidamente contrárias ao movimento negro conservador – a qual absorveria os membros e o ideário do Niagara. Ele passou então a se dedicar integralmente à NAACP, abdicando da docência universitária para trabalhar na sede da organização, em Nova Iorque, como diretor de publicações e pesquisa.

Em 1910, Du Bois se filiou ao Socialist Party of America, do qual, entretanto, logo se afastou, em 1912, para apoiar Woodrow Wilson na campanha eleitoral – em que o candidato democrata prometia defender as causas negras, ao contrário de seu opositor, o presidente republicano William Taft (passivo diante violência sofrida pelos negros).

Quanto a sua atuação como editor, Du Bois dirigiu a partir desta época várias revistas de ampla circulação, tais como: Moon (1905-06); Horizon (1907-1910); o renomado The Crisis, editado desde 1910 pela NAACP, jornal que chegou a ter 100 mil exemplares em circulação (1920), com discussões em torno das relações raciais e cultura, e que se tornaria um veículo para a expressão de suas opiniões (aumentando as dissonâncias políticas dentro da organização); e, mais tarde, também o Phylon (1940-1944).

Após a I Grande Guerra, Du Bois se distanciou gradualmente da NAACP, ao mesmo tempo em que se aproximava do Communist Party of the United States of America (Partido Comunista dos EUA) e do marxismo. Passou a questionar com mais ênfase o ideário liberal, intrínseco ao repertório político da NAACP (demasiado moderado e dependente da filantropia); e, por outro lado, seu pensamento se radicalizou em direção à internacionalização do movimento antirracista – somando motivos para uma ruptura com a direção desta entidade. Tal evolução de seu pensamento se manifestou como resposta ao cenário calamitoso da Guerra no plano internacional, à expansão do colonialismo e à opressão dos africanos e afro-estadunidenses – o que expunha a dimensão global do “problema negro”, conferindo ainda mais sentido à ideia de pan-africanismo (movimento pela união transnacional de africanos e afrodescendentes).

A organização do I Congresso Pan-Africano, por Du Bois e........

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