É útil ter um dia para pensar

Depois de tanto ruído, de tanto massacre político-mediático, é evidente que há razões para manter o dia de reflexão antes de eleições.

Nota prévia: Foi com alívio que se ouviu a Procuradora-Geral dizer que não quer ser reconduzida. Lucília Gago evitou assim ser apeada por indecente e má figura. Falta escolher o sucessor, esperando-se que não venha da mesma máquina para não ser mais do mesmo. Seria desastroso manter um Ministério Público que vive mais de estardalhaço do que de eficácia transparente e respeitadora dos direitos dos investigados.

1. Embora seja controverso na bolha político-mediática, a existência de um dia de reflexão é salutar. Atente-se que em três meses que caiu um governo por razões judiciárias, o maior partido mudou de líder, houve centenas de reuniões partidárias, congressos e convenções, eleições nos Açores, demissões e volte-faces na Madeira, sucessivos casos de Justiça, agitação nas forças de segurança e de defesa, pré-campanha eleitoral com dezenas de debates e entrevistas (com e sem lágrimas) e agora uma campanha oficial com tempos de antena, cartazes, redes sociais. Tudo associado a certezas de centenas de comentadores de jornais (sim, o articulista é mais um), de rádios e de televisões, além palpites e dúvidas dos familiares, vizinhos e comensais. É, pois, salutar um hiato de silêncio de algumas horas para que cada um pense em quem vai votar, se vai votar ou se fica em casa. É verdade que ainda sobram incontroláveis redes sociais infecciosas no dia de ponderação. Mesmo assim a relativa bonança permite uma libertação mínima da poluição sonora e visual da campanha. É um saudável exercício silencioso de Democracia que começa às zero horas de sábado e dura até às 20 horas de domingo. A partir daí a algazarra regressa. Eventualmente com mais barulho ainda, se é que é possível. É até provável que se alongue mais uns quantos meses, se o quadro de sondagens se verificar certo quanto à alta probabilidade de ingovernabilidade.

2. O Portugal que vai às urnas no domingo não é um país pequeno em termos europeus. É médio na sua dimensão territorial e populacional e é gigante quando se conta o seu ignorado Mar. Mas, 50 anos depois do 25 de Abril e ao fim de 40 de membro da Europa comunitária livre e democrática, continua a ser um país pobre, deprimido, cheio de contrastes sociais, apesar dos milhares de milhões que os europeus despejaram em cima dele. A pergunta mais racional é cruel: afinal para onde foi o dinheiro? Para que serviu, se estamos na mesma na cauda dessa Europa, se fomos ultrapassados por recém-chegados e se não beneficiamos de infraestruturas e de contrapartidas sociais dignas da enorme massa de dinheiro que nos deram? O balanço é paupérrimo. Se a União Europeia se lembrasse de nos pedir contas ou o regresso do que foi mal aplicado, estaríamos desgraçados para centenas de anos. Não vale a pena recordar a rede de ineficiências que vai da Saúde ao Poder Local, passando pela Justiça, os erros económicos no modelo de desenvolvimento e o tempo de estagnação em que estamos na prática desde os finais dos anos 90 do século passado. A circunstância de sermos periféricos não é justificação suficiente. Se assim fosse, a Noruega também estaria mal e a Califórnia seria o estado mais pobre da América do Norte. O facto é que não soubemos aproveitar o que nos foi dado de bandeja. Resultado: estamos resignados, envelhecidos, dependentes e desmotivados. Pior ainda é que não temos a noção de que o mal está tanto no nosso ADN como na falta de preparação de muitos dos que nos dirigiram e que são feitos da mesma massa. Todos somos culpados pelas escolhas e opções de governo havidas quando não temos hospitais recentes, habitações condignas, uma rede ferroviária mínima eficaz, um aeroporto de jeito, uma companhia aérea sem sobressaltos, uma justiça com meios, polícias bem equipados, forças armadas com material adequado, um ordenamento territorial racional, uma estratégia para o Mar, uma agricultura preparada, um plano de rega racional, uma defesa da orla marítima estruturada, um acolhimento de imigrantes criterioso, uma associação articulada com os PALOP e, sobretudo, uma Educação feita para os estudantes e não para os professores. Depois de 50 anos de Democracia e 40 de Europa, ganha-se mal, há dezenas de ineficácias, o trabalho é desgastante, os velhos estão mal, os jovens partem e o fosso entre muito ricos e as classes média, remediada e pobre acentua-se. O Estado tentacular é cada vez maior e menos eficaz. Ao ponto do que corre bem ser surpresa. Estamos ancorados a um desenvolvimento baseado no turismo e alguns outros setores heroicos, mas que volta e meia rebentam. Foi o caso da Farfech. Julgávamos ser a nossa Amazon. Afinal implodiu e está a ser desmembrada por sul coreanos. O mesmo vai suceder à Efacec onde enterrámos milhões. Se há momento de balanço, esta semana deveria ser uma boa oportunidade. Vale estarmos na União Europeia. Mesmo aí, estamos prestes a ser o mais pobre dos ricos, o que ainda assim é melhor do que ser o mais rico dos pobres que estão fora desse circulo de elite. Magra consolação!

3. Cavaco Silva é uma espécie de cinturão negro da política. Quando entra na luta é em força. Agora escreveu um artigo de apoio a Montenegro, estrategicamente colocado no Correio da Manhã, o jornal mais lido no país. O dia, sábado, coincidiu com o meio da campanha eleitoral e véspera da votação antecipada requerida por 200 mil pessoas, entre as quais o Presidente Marcelo. Visou indecisos, potenciais abstencionistas e reformados. Tocou nas falhas da governação socialista. Foi Cavaco quem mais obra deixou em 50 anos e atribuiu aos reformados os 14 meses de pensão. No mesmo dia, o PS foi buscar António Costa, o seu valor mais seguro. Falou num comício no Porto. Admitiu que não deixa muita obra feita, mas garantiu que há muita coisa em curso para o seu sucessor inaugurar. Esta é a semana do tudo ou nada para todos os partidos. Os portugueses vão decidir se a esquerda permanece maioritária, se PS e PSD se mantêm dominantes e se o Chega vai mesmo ser uma força política que veio para ficar.

4. António Costa está a frequentar uma pós-graduação na Universidade Católica. Depois fica habilitado a lançar-se na arbitragem, uma especialidade rara, bem paga e que requer experiência técnica e humana para mediar e decidir sobre conflitos de interesses. Advogado de formação, António Costa tem essas qualidades. Além disso, é novo para se reformar e não há indício de ser rico. O seu exemplo é positivo, desde logo ao optar por uma universidade onde não há tretas, ao contrário de algumas do Brasil que outros frequentam. A arbitragem é uma substituição privada, rápida e cara da justiça de estados. Não é por acaso que Costa vai ser patrocinado nesta entrada por José Miguel Júdice e Lobo Xavier, referências no setor. Costa percebeu que a situação judicial em que foi envolvido pelo Ministério Público deve durar uma eternidade. A isso provavelmente juntou a baixa probabilidade de a Internacional Socialista manter a sua dimensão na Europa, o que o levou a fazer-se à estrada.

5. O historiador João Pedro Marques acaba de lançar A Culpa do Homem Branco. A obra reúne crónicas publicadas no Observador e algumas inéditas. Nela se procede à desmontagem da chamada cultura woke que visa reduzir os Descobrimentos e o Império Colonial a episódios sangrentos. O fenómeno é crescente em Portugal e é generalizado nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha. A partir de agora há um argumentário realista para contraditar esse tipo de novo e deturpador fanatismo. Num efeito perverso, a cultura woke está a ser a alavanca de movimentos de sinal contrário, como o avassalador “trumpismo”.

Nota prévia: Foi com alívio que se ouviu a Procuradora-Geral dizer que não quer ser reconduzida. Lucília Gago evitou assim ser apeada por indecente e má figura. Falta escolher o sucessor, esperando-se que não venha da mesma máquina para não ser mais do mesmo. Seria desastroso manter um Ministério Público que vive mais de estardalhaço do que de eficácia transparente e respeitadora dos direitos dos investigados.

1. Embora seja controverso na bolha político-mediática, a existência de um dia de reflexão é salutar. Atente-se que em três meses que caiu um governo por razões judiciárias, o maior partido mudou de líder, houve centenas de reuniões partidárias, congressos e convenções, eleições nos Açores, demissões e volte-faces na Madeira, sucessivos casos de Justiça, agitação nas forças de segurança e de defesa, pré-campanha eleitoral com dezenas de debates e entrevistas (com e sem lágrimas) e agora uma campanha oficial com tempos de antena, cartazes, redes sociais. Tudo associado a certezas de centenas de comentadores de jornais (sim, o articulista é mais um), de rádios e de televisões, além palpites e dúvidas dos familiares, vizinhos e comensais. É, pois, salutar um hiato de silêncio de algumas horas para que cada um pense em quem vai votar, se vai votar ou se fica em casa. É verdade que ainda sobram incontroláveis redes sociais infecciosas no dia de ponderação. Mesmo assim a relativa bonança permite uma libertação mínima da poluição sonora e visual da campanha. É um saudável exercício silencioso de Democracia que começa às zero horas de sábado e dura até às 20 horas de domingo. A partir daí a algazarra regressa. Eventualmente com mais barulho ainda, se é que é possível. É até provável que se alongue mais uns quantos meses, se o quadro de sondagens se verificar certo quanto à alta probabilidade de ingovernabilidade.

2. O Portugal que vai às urnas no domingo não é um país pequeno em termos europeus. É médio na sua dimensão territorial e populacional e é gigante quando se conta o seu ignorado Mar. Mas, 50 anos depois do 25 de Abril e ao fim de 40 de membro da Europa comunitária livre e democrática, continua a ser um país pobre, deprimido, cheio de contrastes sociais, apesar dos milhares de milhões que os europeus despejaram em cima dele. A pergunta mais racional é cruel: afinal para onde foi o dinheiro? Para que serviu, se estamos na mesma na cauda dessa Europa, se fomos ultrapassados por recém-chegados e se não beneficiamos de infraestruturas e de contrapartidas sociais dignas da enorme massa de dinheiro que nos deram? O balanço é paupérrimo. Se a União Europeia se lembrasse de nos pedir contas ou o regresso do que foi mal aplicado, estaríamos desgraçados para centenas de anos. Não vale a pena recordar a rede de ineficiências que vai da Saúde ao Poder Local, passando pela Justiça, os erros económicos no modelo de desenvolvimento e o tempo de estagnação em que estamos na prática desde os finais dos anos 90 do século passado. A circunstância de sermos periféricos não é justificação suficiente. Se assim fosse, a Noruega também estaria mal e a Califórnia seria o estado mais pobre da América do Norte. O facto é que não soubemos aproveitar o que nos foi dado de bandeja. Resultado: estamos resignados, envelhecidos, dependentes e desmotivados. Pior ainda é que não temos a noção de que o mal está tanto no nosso ADN como na falta de preparação de muitos dos que nos dirigiram e que são feitos da mesma massa. Todos somos culpados pelas escolhas e opções de governo havidas quando não temos hospitais recentes, habitações condignas, uma rede ferroviária mínima eficaz, um aeroporto de jeito, uma companhia aérea sem sobressaltos, uma justiça com meios, polícias bem equipados, forças armadas com material adequado, um ordenamento territorial racional, uma estratégia para o Mar, uma agricultura preparada, um plano de rega racional, uma defesa da orla marítima estruturada, um acolhimento de imigrantes criterioso, uma associação articulada com os PALOP e, sobretudo, uma Educação feita para os estudantes e não para os professores. Depois de 50 anos de Democracia e 40 de Europa, ganha-se mal, há dezenas de ineficácias, o trabalho é desgastante, os velhos estão mal, os jovens partem e o fosso entre muito ricos e as classes média, remediada e pobre acentua-se. O Estado tentacular é cada vez maior e menos eficaz. Ao ponto do que corre bem ser surpresa. Estamos ancorados a um desenvolvimento baseado no turismo e alguns outros setores heroicos, mas que volta e meia rebentam. Foi o caso da Farfech. Julgávamos ser a nossa Amazon. Afinal implodiu e está a ser desmembrada por sul coreanos. O mesmo vai suceder à Efacec onde enterrámos milhões. Se há momento de balanço, esta semana deveria ser uma boa oportunidade. Vale estarmos na União Europeia. Mesmo aí, estamos prestes a ser o mais pobre dos ricos, o que ainda assim é melhor do que ser o mais rico dos pobres que estão fora desse circulo de elite. Magra consolação!

3. Cavaco Silva é uma espécie de cinturão negro da política. Quando entra na luta é em força. Agora escreveu um artigo de apoio a Montenegro, estrategicamente colocado no Correio da Manhã, o jornal mais lido no país. O dia, sábado, coincidiu com o meio da campanha eleitoral e véspera da votação antecipada requerida por 200 mil pessoas, entre as quais o Presidente Marcelo. Visou indecisos, potenciais abstencionistas e reformados. Tocou nas falhas da governação socialista. Foi Cavaco quem mais obra deixou em 50 anos e atribuiu aos reformados os 14 meses de pensão. No mesmo dia, o PS foi buscar António Costa, o seu valor mais seguro. Falou num comício no Porto. Admitiu que não deixa muita obra feita, mas garantiu que há muita coisa em curso para o seu sucessor inaugurar. Esta é a semana do tudo ou nada para todos os partidos. Os portugueses vão decidir se a esquerda permanece maioritária, se PS e PSD se mantêm dominantes e se o Chega vai mesmo ser uma força política que veio para ficar.

4. António Costa está a frequentar uma pós-graduação na Universidade Católica. Depois fica habilitado a lançar-se na arbitragem, uma especialidade rara, bem paga e que requer experiência técnica e humana para mediar e decidir sobre conflitos de interesses. Advogado de formação, António Costa tem essas qualidades. Além disso, é novo para se reformar e não há indício de ser rico. O seu exemplo é positivo, desde logo ao optar por uma universidade onde não há tretas, ao contrário de algumas do Brasil que outros frequentam. A arbitragem é uma substituição privada, rápida e cara da justiça de estados. Não é por acaso que Costa vai ser patrocinado nesta entrada por José Miguel Júdice e Lobo Xavier, referências no setor. Costa percebeu que a situação judicial em que foi envolvido pelo Ministério Público deve durar uma eternidade. A isso provavelmente juntou a baixa probabilidade de a Internacional Socialista manter a sua dimensão na Europa, o que o levou a fazer-se à estrada.

5. O historiador João Pedro Marques acaba de lançar A Culpa do Homem Branco. A obra reúne crónicas publicadas no Observador e algumas inéditas. Nela se procede à desmontagem da chamada cultura woke que visa reduzir os Descobrimentos e o Império Colonial a episódios sangrentos. O fenómeno é crescente em Portugal e é generalizado nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha. A partir de agora há um argumentário realista para contraditar esse tipo de novo e deturpador fanatismo. Num efeito perverso, a cultura woke está a ser a alavanca de movimentos de sinal contrário, como o avassalador “trumpismo”.

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05.03.2024

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Depois de tanto ruído, de tanto massacre político-mediático, é evidente que há razões para manter o dia de reflexão antes de eleições.

Nota prévia: Foi com alívio que se ouviu a Procuradora-Geral dizer que não quer ser reconduzida. Lucília Gago evitou assim ser apeada por indecente e má figura. Falta escolher o sucessor, esperando-se que não venha da mesma máquina para não ser mais do mesmo. Seria desastroso manter um Ministério Público que vive mais de estardalhaço do que de eficácia transparente e respeitadora dos direitos dos investigados.

1. Embora seja controverso na bolha político-mediática, a existência de um dia de reflexão é salutar. Atente-se que em três meses que caiu um governo por razões judiciárias, o maior partido mudou de líder, houve centenas de reuniões partidárias, congressos e convenções, eleições nos Açores, demissões e volte-faces na Madeira, sucessivos casos de Justiça, agitação nas forças de segurança e de defesa, pré-campanha eleitoral com dezenas de debates e entrevistas (com e sem lágrimas) e agora uma campanha oficial com tempos de antena, cartazes, redes sociais. Tudo associado a certezas de centenas de comentadores de jornais (sim, o articulista é mais um), de rádios e de televisões, além palpites e dúvidas dos familiares, vizinhos e comensais. É, pois, salutar um hiato de silêncio de algumas horas para que cada um pense em quem vai votar, se vai votar ou se fica em casa. É verdade que ainda sobram incontroláveis redes sociais infecciosas no dia de ponderação. Mesmo assim a relativa bonança permite uma libertação mínima da poluição sonora e visual da campanha. É um saudável exercício silencioso de Democracia que começa às zero horas de sábado e dura até às 20 horas de domingo. A partir daí a algazarra regressa. Eventualmente com mais barulho ainda, se é que é possível. É até provável que se alongue mais uns quantos meses, se o quadro de sondagens se verificar certo quanto à alta probabilidade de ingovernabilidade.

2. O Portugal que vai às urnas no domingo não é um país pequeno em termos europeus. É médio na sua dimensão territorial e populacional e é gigante quando se conta o seu ignorado Mar. Mas, 50 anos depois do 25 de Abril e ao fim de 40 de membro da Europa comunitária livre e democrática, continua a ser um país pobre, deprimido, cheio de contrastes sociais, apesar dos milhares de milhões que os europeus despejaram em cima dele. A pergunta mais racional é cruel: afinal para onde foi o dinheiro? Para que serviu, se estamos na mesma na cauda dessa Europa, se fomos ultrapassados por recém-chegados e se não beneficiamos de infraestruturas e de contrapartidas sociais dignas da enorme massa de dinheiro que nos deram? O balanço é paupérrimo. Se a União Europeia se lembrasse de nos pedir contas ou o regresso do que foi mal aplicado, estaríamos desgraçados para centenas de anos. Não vale a pena recordar a rede de ineficiências que vai da Saúde ao Poder Local, passando pela Justiça, os erros económicos no modelo de desenvolvimento e o tempo de estagnação em que estamos na prática desde os finais dos anos 90 do século passado. A circunstância de sermos periféricos não é justificação suficiente. Se assim fosse, a Noruega também estaria mal e a Califórnia seria o estado mais pobre da América do Norte. O facto é que não soubemos aproveitar o que nos foi dado de bandeja. Resultado: estamos resignados, envelhecidos, dependentes e desmotivados. Pior ainda é que não temos a noção de que o mal está tanto no nosso ADN como na falta de preparação de muitos dos que nos dirigiram e que são feitos da mesma massa. Todos somos culpados pelas escolhas e opções de governo havidas quando não temos hospitais recentes, habitações condignas, uma rede ferroviária mínima eficaz, um aeroporto de jeito, uma companhia aérea sem sobressaltos, uma justiça com meios, polícias bem equipados, forças armadas com material adequado, um ordenamento territorial racional, uma estratégia para o Mar, uma agricultura preparada, um plano de rega racional, uma defesa da orla marítima estruturada, um acolhimento de imigrantes criterioso, uma associação articulada com os PALOP e, sobretudo, uma Educação feita para os estudantes e não para os professores. Depois de 50 anos de Democracia e 40 de Europa, ganha-se mal, há dezenas de ineficácias, o trabalho é desgastante, os velhos estão mal, os jovens partem e o fosso entre muito ricos e as classes média, remediada e pobre acentua-se. O Estado tentacular é cada vez maior e menos eficaz. Ao ponto do que corre bem........

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