Com quem choram estas crianças?
No dia 16 de fevereiro, celebra-se o Dia do Acolhimento. Urge dar visibilidade a esta realidade, sobretudo estando em plena campanha eleitoral. Ora, num recente encontro político, Leonor Beleza fez algo raro numa intervenção deste tipo: deu visibilidade às crianças e jovens em acolhimento residencial. Não se limitou a falar deles en passant, antes escolheu-os como um exemplo – que detalhou – de uma situação estrutural, paradigmática da falta de igualdade de oportunidade. No meio de várias questões pertinentes, lança esta: “Com quem choram estas crianças?”.
i) O que os olhos não vêem, o coração não sente
Parece-me que um primeiro problema do acolhimento é o facto de ser uma realidade invisível. As crianças e jovens estão colocados em casas iguais às de todos os outros. Andam na escola como todos os outros. Participam em atividades extracurriculares como todos os outros. Isto faz com que o cidadão comum não se depare nunca com os problemas e desafios associados a esta realidade, mesmo que com ela tenha algum contacto.
Nos raros casos em que o cidadão comum ganha noção dos tais problemas e limites, fá-lo através de números, como foi o caso de um recente relatório da UNICEF. É difícil que alguém se comova só com números: os números podem chocar ou até gerar um sentimento de injustiça, mas a empatia e a comoção por números são pouco frequentes. Para que este nosso cidadão comum se comovesse, era preciso que conseguisse ver pessoas por detrás destes números: ninguém luta por números, as lutas sociais fazem-se por pessoas.
Desta forma, o acolhimento ganha menos protagonismo que outras situações socialmente dramáticas com manifestações visíveis, mesmo que estas tenham uma dimensão quantitativamente semelhante.
O caso das pessoas em situação de sem-abrigo é paradigmático. Ao andar na rua, sobretudo em cidades grandes, é impossível ignorar esta realidade. Por detrás das manchetes que anunciam mais de 10 000 pessoas em situação de sem-abrigo, qualquer cidadão (comum ou incomum) consegue ver pessoas. Isso tem como consequência que o problema seja conhecido do grande público e consequentemente escolhido como........
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