Da capacidade eleitoral dos criminosos

Em vários Estados os condenados pela prática de certos crimes, durante o cumprimento da pena, ou por um determinado período, não gozam do direito de eleger ou de ser eleitos para cargos políticos.

O pós 25 de Abril trouxe a universalidade ao direito de sufrágio (nº 1 do artigo 49º da Constituição) com ressalva das incapacidades previstas na lei. O núcleo duro das incapacidades inclui os menores de idade e os que, por condição psíquica, não possam expressar livremente a sua vontade. A universalidade da capacidade eleitoral activa tem correspondência na capacidade eleitoral passiva: todos os que podem eleger podem também ser eleitos (com ressalva de requisitos específicos, como a idade superior a 35 anos para ser eleito Presidente da República). É este o regime da lei eleitoral para a Assembleia da República, Lei 14/79, de 16 de Maio, regime espelhado na restante legislação eleitoral.

Não obstante a aposta na universalidade da capacidade eleitoral, as primeiras leis eleitorais a seguir ao 25 de Abril continham uma incapacidade eleitoral que afectava “os definitivamente condenados a pena de prisão por crime doloso infamante, enquanto não hajam expiado a respectiva pena”. Depois de sucessivos julgamentos de inconstitucionalidade deste tipo de dispositivo, o Tribunal Constitucional declarou, no acórdão 748/93, a inconstitucionalidade do mesmo por violação do nº 4 do artigo 30º da Constituição: “Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos.” Até os crimes contra o bom funcionamento dos processos eleitorais (reunidos nos artigos 336º a 343º do Código Penal) não dão origem a incapacidades eleitorais. O mesmo se passa com a violação das obrigações declarativas de património por parte dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, violação que pode dar origem à perda de mandato mas não gera incapacidade eleitoral.

Já o regime dos crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos estabelece uma pena acessória de incapacidade eleitoral passiva: “O titular de cargo político que, no exercício da atividade para que foi eleito ou nomeado ou por causa dessa atividade, cometer crime punido com pena de prisão superior a 3 anos, ou cuja pena seja dispensada se se tratar de crime de recebimento ou oferta indevidos de vantagem ou de corrupção, fica também proibido do exercício de qualquer cargo político por um período de 2 a 10 anos, quando o facto: a) For praticado com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos deveres que lhe são inerentes; b) Revelar indignidade no exercício do cargo; ou c) Implicar a perda da confiança necessária ao exercício do cargo.” (nº 1 do artigo 27.º-A, da Lei 34/87, de 16 de Julho).

Nos EUA a 2ª secção da XIV emenda à Constituição, que prevê a possibilidade de incapacidade eleitoral pela prática do crime de rebelião (ou de outros crimes), tende a ser lida de forma restritiva, com alguma doutrina a considerar o dispositivo como não self-executing na ausência de legislação aprovada pelo Congresso. A História dá nota de um candidato a Presidente – o socialista Eugene V. Debs – que, em 1920, obteve, a partir da prisão, 3% dos votos. No caso de Trump vir a ser condenado antes da data das eleições é provável que não venha a cumprir pena de prisão. Mas, se tal acontecer, há boas razões, jurídicas, para considerar que caso seja eleito possa assumir o mandato, suspendendo-se a execução da sentença pela duração daquele. E poderá um Presidente, em causa própria, indultar penas? Nunca tal aconteceu na história dos EUA. Nos estertores da administração Nixon o Departamento de Justiça produziu um parecer negando tal possibilidade.

O pós 25 de Abril trouxe a universalidade ao direito de sufrágio (nº 1 do artigo 49º da Constituição) com ressalva das incapacidades previstas na lei. O núcleo duro das incapacidades inclui os menores de idade e os que, por condição psíquica, não possam expressar livremente a sua vontade. A universalidade da capacidade eleitoral activa tem correspondência na capacidade eleitoral passiva: todos os que podem eleger podem também ser eleitos (com ressalva de requisitos específicos, como a idade superior a 35 anos para ser eleito Presidente da República). É este o regime da lei eleitoral para a Assembleia da República, Lei 14/79, de 16 de Maio, regime espelhado na restante legislação eleitoral.

Não obstante a aposta na universalidade da capacidade eleitoral, as primeiras leis eleitorais a seguir ao 25 de Abril continham uma incapacidade eleitoral que afectava “os definitivamente condenados a pena de prisão por crime doloso infamante, enquanto não hajam expiado a respectiva pena”. Depois de sucessivos julgamentos de inconstitucionalidade deste tipo de dispositivo, o Tribunal Constitucional declarou, no acórdão 748/93, a inconstitucionalidade do mesmo por violação do nº 4 do artigo 30º da Constituição: “Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos.” Até os crimes contra o bom funcionamento dos processos eleitorais (reunidos nos artigos 336º a 343º do Código Penal) não dão origem a incapacidades eleitorais. O mesmo se passa com a violação das obrigações declarativas de património por parte dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, violação que pode dar origem à perda de mandato mas não gera incapacidade eleitoral.

Já o regime dos crimes de responsabilidade dos titulares de cargos políticos estabelece uma pena acessória de incapacidade eleitoral passiva: “O titular de cargo político que, no exercício da atividade para que foi eleito ou nomeado ou por causa dessa atividade, cometer crime punido com pena de prisão superior a 3 anos, ou cuja pena seja dispensada se se tratar de crime de recebimento ou oferta indevidos de vantagem ou de corrupção, fica também proibido do exercício de qualquer cargo político por um período de 2 a 10 anos, quando o facto: a) For praticado com flagrante desvio ou abuso da função ou com grave violação dos deveres que lhe são inerentes; b) Revelar indignidade no exercício do cargo; ou c) Implicar a perda da confiança necessária ao exercício do cargo.” (nº 1 do artigo 27.º-A, da Lei 34/87, de 16 de Julho).

Nos EUA a 2ª secção da XIV emenda à Constituição, que prevê a possibilidade de incapacidade eleitoral pela prática do crime de rebelião (ou de outros crimes), tende a ser lida de forma restritiva, com alguma doutrina a considerar o dispositivo como não self-executing na ausência de legislação aprovada pelo Congresso. A História dá nota de um candidato a Presidente – o socialista Eugene V. Debs – que, em 1920, obteve, a partir da prisão, 3% dos votos. No caso de Trump vir a ser condenado antes da data das eleições é provável que não venha a cumprir pena de prisão. Mas, se tal acontecer, há boas razões, jurídicas, para considerar que caso seja eleito possa assumir o mandato, suspendendo-se a execução da sentença pela duração daquele. E poderá um Presidente, em causa própria, indultar penas? Nunca tal aconteceu na história dos EUA. Nos estertores da administração Nixon o Departamento de Justiça produziu um parecer negando tal possibilidade.

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Da capacidade eleitoral dos criminosos

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10.11.2023

Da capacidade eleitoral dos criminosos

Em vários Estados os condenados pela prática de certos crimes, durante o cumprimento da pena, ou por um determinado período, não gozam do direito de eleger ou de ser eleitos para cargos políticos.

O pós 25 de Abril trouxe a universalidade ao direito de sufrágio (nº 1 do artigo 49º da Constituição) com ressalva das incapacidades previstas na lei. O núcleo duro das incapacidades inclui os menores de idade e os que, por condição psíquica, não possam expressar livremente a sua vontade. A universalidade da capacidade eleitoral activa tem correspondência na capacidade eleitoral passiva: todos os que podem eleger podem também ser eleitos (com ressalva de requisitos específicos, como a idade superior a 35 anos para ser eleito Presidente da República). É este o regime da lei eleitoral para a Assembleia da República, Lei 14/79, de 16 de Maio, regime espelhado na restante legislação eleitoral.

Não obstante a aposta na universalidade da capacidade eleitoral, as primeiras leis eleitorais a seguir ao 25 de Abril continham uma incapacidade eleitoral que afectava “os definitivamente condenados a pena de prisão por crime doloso infamante, enquanto não hajam expiado a respectiva pena”. Depois de sucessivos julgamentos de inconstitucionalidade deste tipo de dispositivo, o Tribunal Constitucional declarou, no acórdão 748/93, a inconstitucionalidade do mesmo por violação do nº 4 do artigo 30º da Constituição: “Nenhuma pena envolve como efeito necessário a perda de quaisquer direitos civis, profissionais ou políticos.” Até os crimes contra o bom funcionamento dos processos eleitorais (reunidos nos artigos 336º a 343º do Código Penal) não dão origem a incapacidades eleitorais. O mesmo se passa com a violação das obrigações declarativas de património por parte dos titulares de cargos políticos e altos cargos públicos, violação que pode dar origem à perda de mandato mas não gera incapacidade eleitoral.

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