Inimigos íntimos

Você conhece aquele clichê "é preciso saber envelhecer"? Não ria. Os clichês são clichês por algum motivo.

Anos atrás, li algures que a longevidade de Cristiano Ronaldo como jogador de futebol não estava apenas na sua disciplina física. Era questão de inteligência no amadurecimento. Sim, o jogador, aos 35 anos, já não conseguia correr como antigamente. Não era possível os "sprints" e os dribles dos tempos do Manchester United ou do Real Madrid.

Ronaldo não insistiu nesse caminho. Optou por outro: reinventar-se como atacante, apurando o salto, a cabeça e o chute de primeira. Quem o viu, dias atrás, marcando um gol de bicicleta à Polônia na Liga das Nações sabe do que estou falando. O coroinha continua imparável.

"Saber envelhecer" é isso: fazer menos, fazer diferente, fazer melhor. E "não saber envelhecer" é ser incapaz de largar o jovem que fomos em suas atitudes e proezas. É fazer o mesmo, mas pior.

Lembrei tudo isso quando assistia ao filme "A Substância" de Coralie Fargeat, com Demi Moore no papel principal. Provavelmente, não eram esses os pensamentos que a diretora esperava que eu tivesse. Mas, às vezes, as obras de arte escapam às nossas intenções conscientes e revelam pensamentos mais profundos, mais involuntários. Mais interessantes.

À superfície, aqui está mais um filme-denúncia sobre o patriarcado que usa e abusa das mulheres quando jovens. Depois, quando elas envelhecem, são descartadas como se fossem um trapo.

A........

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