Reza a lenda das frases inspiradas que Arthur Clarke certa vez disse: "quão inapropriado é chamar este planeta de Terra, quando seguramente ele é um Mar".
Essa lógica deveria se estender às nossas perspectivas sobre conflitos e tendências. Assumir que as forças que alteram o curso do status quo são as que levantam poeira é intuitivo. Porém, um foco excessivamente telúrico pode obliterar o reconhecimento de mudanças fundamentais que têm o mar como pivô.
Os Estados Unidos acabam de estender seus domínios em 1 milhão de quilômetros quadrados. São mais de duas Califórnias incorporadas dentro de uma lógica global de redefinição de fronteiras marítimas, em função de novas tecnologias exploratórias, tensões geopolíticas e do aquecimento global.
Um dogma fundamental da guerra acaba de ser alterado: até este momento, para se realizar um bloqueio naval relevante era preciso uma Marinha e, de preferência, um país. Os houthis inauguraram a era em que isso deixa de ser necessário. No background, está o fato de mais de 80% de todo o comércio internacional ser marítimo e de a pandemia ter mostrado que a logística global é muito mais frágil do que assumíamos.
Militares americanos e chineses entreolham-se pelas lunetas. Entre eles, impõem-se 4.000 km de águas salgadas, das bases do Alasca e até as da costa norte da China, e mais do que o dobro disso entre os principais centros militares de ambas as potências. Parte relevante dos cálculos bélicos que fazem inclui suas respectivas esquadras, as quais estão sendo repensadas tecnologicamente. Enquanto isso, dezenas de cidades importantes preparam-se para serem engolidas pelas águas.
O mar está revolto e seu protagonismo não para de crescer.
Se pegarmos um barco em direção ao alto mar, seguiremos em território nacional por 22 km. Este trecho, chamado de mar territorial, bem como os 348 km seguintes, fazem parte da zona econômica exclusiva (ZEE), balizando os direitos de exploração da nação costeira. Dali em diante, entramos em águas internacionais. Quem dita essas regras é a Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar (UNCLOS), de 1982, que o Brasil ratificou seis anos depois.
A gente possui pequenas ilhas que estendem os limites do país dramaticamente: no Nordeste, temos o arquipélago de São Paulo e São Pedro, a quase mil quilômetros de Natal e, no Sudeste, a Ilha da Trindade, que está a 1.140 km de Vitória e a apenas 2.400 km da costa africana.
A UNCLOS prevê que as diferentes nações possuem direito exclusivo de exploração do leito do mar das ZEEs, desde que este tenha até 200 metros de profundidade. O nome desta área explorável é........