Crônicas costumam falar das coisas da vida, mas também podem falar da vida das coisas. Então, te convido a conhecer a história de vida do novo morador do bairro.
Chegou num domingo e estacionou ao lado da loja de fechaduras.
Não é bicho, gente ou carro.
Ele é um sofá preto de tecido aconchegante, entre veludo e camurça. Não é de curvas ou reviravoltas; tampouco de tachas brilhantes. É sóbrio, de braços altos e ângulos retos. Não veio só, trouxe um puf, preto e simplório.
Me concentro no sofá. Não fosse o corte largo, a revelar a espuma amarelada, diríamos: é um seminovo. Como chamam carro usado em bom estado.
Na biografia inventada, começo pelo último dono. Um homem de 40 anos a coçar a cabeça e planejar o transporte. Não quer ou não pode pagar o frete, também não se interessa em doar. Preguiçoso, apela ao vizinho.
- Joelson, vai fazer o que amanhã?
- Vou ficar com Suelen. Qual a bronca?
- Presente de sogra, meu. Dona Dirce comprou um sofá novo e me deu o dela, daí não tenho mais espaço para o meu, que ganhei faz tempo daquele cliente. A gente bota o velho na sua picape e larga por aí.........