O elefante na sala: quem pode representar uma nação?

Quando foi divulgada a shortlist para a representação de Portugal na 61.ª Bienal de Veneza, após um processo em que os nomes dos candidatos foram ocultados ao júri, a curiosidade pública centrou-se não nos projectos, cujos conteúdos nunca foram tornados públicos, mas na composição da lista. Dois nomes portugueses bem conhecidos surgiam ao lado de um terceiro, estrangeiro: o meu. Bastou isto para desencadear uma série de reacções informais. Colegas, curadores, jornalistas e conhecidos transmitiram-me, com graus diversos de delicadeza, que muitos estavam “surpreendidos”, que “não me conheciam” e que já se formava um consenso implícito sobre quem “deveria” ser escolhido. Estas reacções não se baseavam em comparações fundamentadas, mas em expectativas prévias sobre quem se imagina pertencer legitimamente a um contexto de representação nacional e quem, pelo contrário, deve primeiro justificar a sua presença.

À medida que o processo avançava, estas expectativas tornaram-se mais visíveis. Depois de conhecidos os resultados finais, um parceiro do projecto manifestou surpresa por um artista português ter ficado em terceiro lugar, como se a origem nacional devesse, por si só, determinar a hierarquia do resultado. O anúncio na imprensa reforçou este sinal subtil: os nomes surgiram reorganizados para que o nome estrangeiro aparecesse em último lugar, ignorando a ordem alfabética e a classificação oficial. Nenhum destes gestos, isoladamente, constitui um escândalo. Mas, em conjunto, desenham um padrão: uma sequência de pequenos sinais que desloca o artista estrangeiro para a periferia, independentemente do seu contributo ou empenho. É uma coreografia silenciosa que opera nas sombras de um sector que tende a ver-se a si próprio como aberto, crítico e progressista.

Mesmo em conversas com colegas próximos,........

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