Podemos colecionar tudo?

Há coleções para todos os gostos.

Há quem colecione canetas, canecas, bilhetes de cinema e de teatro, porta chaves, figuras de anime, posters, capas de revistas, patos de borracha, carrinhos de brincar, carros a sério, ímanes de frigorífico, cadeados, talheres, moedas antigas, miniaturas de perfumes, latas de refrigerantes… Há colecionadores abonados, que colecionam as obras de arte mais caras do mundo, adquirindo para si relíquias intemporais, numa negociação sempre estreita entre a filantropia e o lucro, entre benfeitoria e o exibicionismo. Há quem colecione livros que nunca vai ler (uma estante cheia de livros deslumbra sempre, mas uma coleção de lombadas por abrir amontoados na estante, por vezes acumula mais pó do que conhecimento), e há ainda coleções de botões, de canivetes, de abre-latas, de cabelos de pessoas famosas, de coçadores de costas, de sapatos sem par. Parece que podemos colecionar tudo!

Online podemos encontrar uma oferta surpreendente de taxidermia: insetos conservados em resina, aves embalsamadas, répteis de vários tipos, cabeças de alce, animais de grande porte empalhados… O método de preservação de animais navega a excêntrica fronteira entre o colecionismo e o estudo científico, e reúne inúmeras coleções, numa espécie de fascínio por conservar na morte, como se isso permitisse fixar a vida, retê-la, controlá-la, mesmo quando o objeto se trata só de uma carapaça, sem vitalidade nem alma.

E é espantosa a quantidade de colecionadores adultos que colecionam afetuosamente objetos infantis: peluches, legos, berlindes… Comprando e catalogando lembranças da infância, a inventariar recordações, como que a conservar a sua condição de criança que manuseia um mundo em miniatura, a guardar as saudades num armário especial.

É irrelevante a utilidade de uma coleção. Ninguém precisa de possuir, por exemplo, centenas de caricas de várias nacionalidades e feitios. É uma daquelas vontades que se inscreve na natureza da falta, mas que em nada está relacionada com uma necessidade real. Se perguntarmos a um colecionador porque reúne tantos objetos da mesma categoria ele provavelmente irá responder que é um gosto, uma mania, um apetite. E nunca acaba. Há sempre uma peça, uma preciosidade por adquirir. A coleção alimenta-se de nostalgia – e a nostalgia provoca mais fome do........

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