As folhas de Outono

O Outono é tido como a estação da nostalgia: evoca mais crepúsculos do que auroras, a luz vermelha do poente prevalece sobre o azul das alvoradas; é o tempo da evanescência dos dias, da aproximação das chuvas, dos cinzentos e castanhos, do frio que se insinua. Apesar da vivacidade campestre evocada por Vivaldi, é sobretudo a dolência da canção “Autumn Leaves” – que convoca doces memórias, embora apenas memórias – que se impõe como soundtrack, caso imaginássemos um filme sobre o Outono. Esta estação, que antecede os rigores do Inverno, é também metáfora do envelhecimento, tantas vezes interpretada como sinal de finitude ou decadência. O título da versão francesa original, “Les feuilles mortes” , acentua justamente essa tonalidade invernal.

Albert Camus, citado por José Tolentino de Mendonça no belíssimo texto “Fazer mais com menos” (em “Para os Caminhantes tudo é Caminho”), escreveu que “O Outono é uma segunda primavera, onde cada folha é uma flor”, sugerindo que a queda das folhas não marca um fim, mas anuncia uma renovação tecida de desapego e liberdade. Desenvolvendo essa ideia, Tolentino afirma: “No Outono, assistimos à exposição fulgurante que a natureza faz das suas metamorfoses, expressando nessa dança de cambiantes o seu indómito desejo de existir, e mostrando que este se realiza na aceitação do modo sempre diverso com que a vitalidade se declina.” E acrescenta: “Para sermos os mesmos, para aprofundarmos........

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