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(3) A Universidade perdeu o rumo?

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18.05.2025

Depois de um enquadramento da situação atual da Universidade e de uma discussão sobre os principais desafios que enfrenta, este artigo aborda a sua evolução histórica e os diferentes modelos de Universidade que foram surgindo em diferentes contextos.

1) Um ideal originário

A instituição universitária, no sentido em que a conhecemos hoje, surgiu no final do século XI, na Europa Medieval – e não em Fez – a partir das escolas catedrais, com a designação “Universidade de Mestres e Estudantes”. A sua principal razão de existir era “o amor ao conhecimento pelo conhecimento”. Os primeiros ciclos de estudos não eram concebidos para responder às necessidades práticas da sociedade, e o conhecimento tinha um valor intrínseco, independente de razões práticas ou económicas.

O ideal do “saber pelo saber”, independentemente da sua utilidade, moldou a Universidade durante séculos, seguindo uma mentalidade claramente oposta à de Fedro (se não for útil o que fizermos a glória será vã). Paradoxalmente, foi essa atitude livre e não utilitarista que permitiu o progresso da tecnologia, e a resposta a inúmeros problemas práticos da sociedade, pois foi esse ideal que lançou as bases do espírito científico.

Desde a sua origem até hoje, a Universidade atravessou diferentes contextos sociais, políticos, económicos e epistemológicos. A Universidade atual desviou-se consideravelmente do ideal original, mas há aspetos familiares que permitem reconhecê-la como descendente direta da Universidade Medieval. De todas as instituições seculares atuais, a instituição universitária é talvez a única que continua a gozar de uma elevada consideração social, ao contrário, por exemplo, das instituições militares, políticas ou religiosas.

2) A Universidade Medieval

Desde sempre, pessoas curiosas e interessadas pelo saber, com sede de conhecimento, têm-se reunido para estudar, debater e filosofar, como acontecia nas escolas, nas academias e nas ágoras da Grécia Antiga. No entanto, isso não corresponde ao conceito de Universidade, tal como as madraças da cultura islâmica também não são consideradas universidades.

As primeiras universidades (séculos XI-XIII) nasceram, maioritariamente, sob a autoridade eclesiástica, com uma missão “teológica” (Deus, Espírito, Verdade). Assim permaneceram durante cerca de sete séculos, como o caso de Oxford (1096), Paris (1170), Cambridge (1209) ou Salamanca (1218). Funcionavam como corporações de “mestres e estudantes”, financiadas pela Igreja, por reis e por mecenas. No caso de Bolonha (1088) a sua origem é mais laica. Até meados do século XVI, o método de ensino-aprendizagem era a Escolástica, baseada na filosofia aristotélica, harmonizando a fé cristã e a razão. Existia a Faculdade de Artes, para estudos preparatórios, correspondente às sete artes liberais: Trivium (gramática, lógica e retórica) e Quadrivium (aritmética, geometria, astronomia e música); e existiam as Faculdades profissionais (Teologia, Direito e Medicina).

O declínio da Escolástica deu-se no final da Idade Média (século XV), no contexto do Humanismo e do Renascimento, que valorizavam mais a observação e a experiência do que os textos clássicos. No entanto, foi mais tarde, cerca do século XVIII/XIX, que as universidades passaram por um processo de secularização e autonomia, sem a autoridade eclesiástica. No final do século XIX a maioria dessas universidades já era essencialmente laica.

É interessante notar que, durante este período sob a autoridade eclesiástica, a Universidade permitiu o florescimento do pensamento científico moderno, preparando o terreno para a Revolução Científica do século XVII. As universidades foram o centro do conhecimento no Ocidente, sendo responsáveis pelo desenvolvimento do Direito e do pensamento jurídico, bem como por inúmeros avanços científicos, tais como a Ótica (Bacon, 1267), Heliocentrismo (Copérnico, 1543), Anatomia (Vesalius, 1543) e Astronomia (Kepler, 1609).

3) Os modelos de Universidade dos séculos XVIII e XIX

Neste período, em França, na Alemanha e na Inglaterra foram desenvolvidos três modelos diferentes de Universidade que a influenciaram até hoje.

De acordo com o modelo Napoleónico ou Francês (final do século XVIII), a Universidade tem a missão do ensino profissionalizante. A Universidade é um instrumento para a formação dos quadros do Estado e para formar profissionais com competências úteis às necessidades sociais e económicas, nomeadamente, nas áreas da Engenharia, Direito e Medicina.

O modelo Humboldtiano ou Alemão (início do século XIX), idealizado por Wilhelm von Humboldt, defendia que a Universidade tinha a missão de gerar e de preservar a........

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