Entidade para a Opacidade
Entrei pela primeira vez no Tribunal Constitucional em 2008 e, ao chegar, encaminharam-me para uma pequena porta verde, que era a entrada de um pequeno anexo do átrio do Palácio Ratton. Ali funcionava a quarta secção, liderada pelo senhor Cardoso Manso, que era responsável por verificar e disponibilizar a consulta das declarações de rendimentos de titulares de cargos políticos a cidadãos, incluindo jornalistas. Após mostrar o cartão do cidadão, em poucos minutos tinha na mão a declaração de rendimentos e património do primeiro-ministro (era, na altura, José Sócrates) e de mais uns quantos ministros. Fiquei surpreendido com o acesso, a facilidade e a transparência do processo. Dezasseis anos depois, deixou de ser possível fazê-lo.
A lei que introduziu esta prática transparente foi criada em 1983 e esteve doze anos sem ser modificada até ser alvo de alterações em 1995. Depois desse pequeno acerto só seria mexida novamente 13 anos depois, precisamente no ano em que fiz a primeira consulta: 2008. Apesar das alterações, nesses 25 anos pouca coisa mudou: os políticos (e titulares de altos cargos públicos) continuaram a ter de apresentar a sua declaração de património e rendimentos e qualquer cidadão que se deslocasse ao 111 da rua do Século — mediante o preenchimento de um simples requerimento onde colocava o número do bilhete de identidade — tinha acesso a informação que lhe permita escrutinar os eleitos.
Nesse ano de 2008 começaram a ser feitas alterações à lei. Os deputados, que legislavam nesta matéria em causa própria, foram fazendo mudanças (uns bem intencionados, outros nem tanto) para atingirem alegadas melhorias da lei que, muitas vezes, foram trapalhonas. Na alteração de 2010 (foram seis até à revogação), os titulares de cargos políticos deixaram de ter de atualizar a declaração anualmente e passaram a ter de fazê-lo apenas quando havia uma alteração patrimonial superior a 50 salários mínimos. Com esta alteração, o legislador abria uma lacuna na lei: por exemplo, passava a ser possível existirem entradas e saídas das........
© Observador
visit website