Breve anatomia da luz |
Há um momento em que a expectativa – gasosa, imponderável, subtil – se precipita, condensa, e começa a ganhar forma. Antes dele, o desejo vagueia como aragem sem rumo; depois dele, tudo parece reorganizar-se em silêncio, como se o mundo tivesse sido tocado por uma pergunta irrenunciável. O nascimento de Cristo parece pertencer a essa rara ordem de acontecimentos que pressionam o tempo antes de nele entrar. É um acontecimento que caminha na nossa direção, projectando uma sombra através dos séculos.
A essa sombra, os hebreus chamavam הַמָּשִׁיחַ (ha-mashiach, o messias, o ungido, o esperado). Os gregos traduziram-na por Χριστός (christos, cristo). No entanto, muito antes de estas sílabas serem pronunciadas, há muito que a humanidade aprendera já a habitar o tenso espaço entre a ausência e a manifestação, entre o que se deseja e o que nunca chega inteiro.
A expectativa – ex-spectare, olhar para fora, permanecer exposto ao que não se vê – talvez seja o gesto mais antigo do humano. Esperar implica inclinar-se para um horizonte que parece retrair-se. Não é repouso, mas tensão; não é sonho, mas vigilância. O próprio mundo parece parar, como se estivesse à espera de algo sem nome. A respiração fica mais pesada. O silêncio adensa-se. O nascimento de Cristo daria um nome a esta pressão sem nome. E a esse nome ofereceu um rosto.
Mas nenhum nascimento é puro início. Todo o nascimento é também um regresso – de algo enterrado, esquecido, prometido. Nas narrativas evangélicas da infância, o tempo dobra-se sobre si como um pano que se segurou durante muito tempo no regaço. A criança nasce, mas sempre existiu: o menino deitado na palha – in principio erat verbum – é mais velho do que as constelações suspensas sobre a telha-vã do estábulo. A primeira música do mundo não foi harmonia, mas grito, e cada nascimento repete esse som primordial. Os hinos antigos também o sabiam: falavam de sementes a flutuar em águas informes, de vidas à espera de serem pronunciadas. O nascimento cristão não apaga estas intuições antigas; reúne-as, concentra-as e prende-as a uma noite concreta,........