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Portugal Europeu: 40 Anos – Balanço crítico

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20.06.2025

Desde a adesão à Comunidade Económica Europeia em 1985, Portugal transformou-se economicamente e socialmente. Este artigo de opinião pretende explorar, de forma crítica e distendida, os principais impactos dessa integração europeia, desde os avanços no desenvolvimento e na coesão até às desigualdades persistentes, passando pelas perceções públicas, identidade nacional e cidadania europeia.

Mário Soares assinou o Tratado de Adesão à CEE no Mosteiro dos Jerónimos, a 12 de junho de 1985, um momento histórico que simbolizou a “chegada” de Portugal ao projeto europeu. Passadas quatro décadas, Portugal é indubitavelmente um país diferente. A entrada na então Comunidade Económica Europeia (CEE) foi um marco que catalisou mudanças profundas no tecido económico, social e político do país. A adesão europeia cumpriu em grande medida a promessa de modernizar e desenvolver o país, basta olhar para as infraestruturas modernizadas, a estabilidade democrática e a melhoria geral da qualidade de vida. No entanto, nem tudo é um sucesso inequívoco: persistem desafios, desde as desigualdades regionais até ao debate sobre a soberania e identidade num contexto supranacional. É fundamental, ao refletir sobre este percurso desde 1985, reconhecer tanto os ganhos palpáveis como os aspetos em que a integração não alcançou plenamente as expectativas, numa análise crítica mas construtiva sobre o nosso futuro europeu comum.

Desenvolvimento Económico e Social: Um Salto Quântico

A adesão à CEE em 1985 abriu as portas de Portugal a um novo mundo de oportunidades económicas. Do ponto de vista económico, o país registou um crescimento notável e uma modernização acelerada, em grande parte impulsionados pelos fundos estruturais europeus e pelo acesso ao vasto mercado comunitário. De facto, a integração europeia é frequentemente apontada como “o mais poderoso vetor de modernização de toda a história económica portuguesa” (Sousa, 2001). Entre 1986 e 2023, Portugal recebeu mais de 130 mil milhões de euros em fundos europeus (Cunha, 2024), investimento que se traduziu em milhares de projetos: autoestradas e vias férreas que aproximaram o litoral do interior, modernização de escolas e hospitais, saneamento básico em regiões antes esquecidas, apoio à indústria e agricultura, entre muitos outros. Esses recursos funcionaram como uma “alavanca do desenvolvimento económico”, permitindo reduzir a inflação para níveis históricos, aumentar a produtividade e melhorar significativamente as condições de vida dos portugueses (Sousa, 2001).

Como resultado, ao longo dos anos 90 observou-se uma convergência gradual da economia portuguesa para a média europeia, traduzida num crescimento do PIB per capita e na expansão do comércio externo apoiada pelo mercado único. Indicadores sociais também acompanharam esta evolução positiva: a esperança média de vida aumentou, o acesso à educação universalizou-se e diversos indicadores de bem-estar melhoraram. Há mesmo quem destaque que, após a adesão, houve uma diminuição da desigualdade de rendimentos e um aumento do acesso da população a serviços essenciais como a saúde. Em suma, o Portugal de hoje, comparado ao de meados dos anos 80, é um país mais próspero, mais desenvolvido e mais aberto.

No campo político e institucional, a integração europeia ajudou a consolidar a jovem democracia portuguesa saída da Revolução de 1974. Nos anos que precederam a adesão, Portugal enfrentou instabilidade governativa e incertezas económicas; a partir de 1986, porém, assistiu-se a uma crescente estabilidade política e a um consenso alargado em torno do rumo europeu do país. A pertença à CEE (mais tarde União Europeia) implicou a adoção de exigentes critérios de governação económica – por exemplo, o controlo do défice e da inflação para entrada na União Económica e Monetária – os quais impuseram disciplina e rigor nas políticas públicas. Essa disciplina, embora desafiante, contribuiu para sanear as finanças e integrar Portugal no euro em 1999, consolidando uma década de estabilidade económica.

Por outro lado, a participação nas instituições europeias trouxe prestígio e influência internacional: Portugal assumiu por quatro vezes a Presidência do Conselho da UE, foi anfitrião de cimeiras históricas (como a de Lisboa em 2000, que lançou a Estratégia de Lisboa) e chegou a ter portugueses em cargos de destaque europeu, por exemplo, José Manuel Durão Barroso presidiu à Comissão Europeia (2004-2014). Estes marcos reforçaram a autoestima nacional e provaram que mesmo um país de menor dimensão podia ter voz ativa na construção europeia. Importa notar ainda que a integração europeia foi decisiva para ancorar Portugal no campo das democracias liberais ocidentais, funcionando como um “seguro” contra retrocessos autoritários. Conforme observou o jurista e eurodeputado Vital Moreira, a democracia portuguesa, após a adesão, deixou de ser “problemática”, tornando-se uma realidade sólida e sem ter de enfrentar os fenómenos de extremismo político de direita, nacionalista e xenófobo que afetam outras democracias europeias mais antigas (citado em Sousa, 2001).

Em suma, no balanço destes 40 anos, os ganhos económicos, sociais e políticos da adesão são tangíveis e numerosos: Portugal modernizou-se, internacionalizou-se e estabilizou-se de uma forma que dificilmente teria sido tão rápida sem o enquadramento da UE.

Desigualdades Regionais e Coesão: Promessas e Paradoxos

Apesar dos inegáveis avanços, a integração europeia não foi uma panaceia para todos os........

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